Gabriel Molnar
No franchising de alimentação, um dos maiores temores de franqueadores é ver o próprio produto se transformar em concorrência. O risco é real: quando um franqueado decide deixar a rede, pode tentar reproduzir receitas, processos ou até mesmo experiências que, originalmente, pertencem à marca. Para evitar essa evasão e proteger a identidade do negócio, redes vêm adotando estratégias que combinam segredo industrial, proteção do know-how e contratos jurídicos robustos.
A Suburbanos Pizza, que nasceu em 2018 e já soma mais de 40 unidades no Brasil, é um exemplo de rede que estruturou sua blindagem desde o início da operação. Amauri Jr., head de expansão da marca, explica que a chave está em restringir o acesso do franqueado a elementos centrais da receita: a massa e o molho.
“A nossa massa é uma receita exclusiva que só a gente tem. Ela chega pronta para o franqueado, dentro de uma mistura que vai na nossa própria farinha, marca Suburbanos. Não se encontra no mercado”, detalha. No caso do molho, a solução foi importar da Itália com rotulagem exclusiva da rede. “Ninguém consegue copiar. É assim que conseguimos garantir o segredo e a qualidade do produto”, completa Amauri.
Franqueado no centro da estratégia
A proteção, no entanto, não se limita ao campo do segredo industrial. A Suburbanos também investiu em contratos claros e específicos, que blindam a marca de possíveis tentativas de réplica do modelo de negócio. “Temos um contrato muito bem amarrado para não permitir evasões em que um franqueado queira levar nosso modelo de negócio para outro lugar apenas retirando a marca”, afirma Amauri.
Ao mesmo tempo, a rede procura manter vantagens competitivas que tornam a operação dentro do sistema mais atrativa do que qualquer tentativa de independência. Um exemplo é a parceria exclusiva com o iFood, que garante taxas significativamente menores aos franqueados. Cerca de um terço do valor praticado no mercado. Caso um franqueado decida sair, perde automaticamente esse benefício, o que compromete a rentabilidade da operação.
Esse ponto toca em um ponto importante do franchising: a permanência do franqueado está diretamente ligada ao resultado financeiro. André Ribeiro Marques, especialista em franchising e varejo, reforça que não basta proteger juridicamente; é preciso colocar o franqueado no centro da estratégia. “O franqueado feliz é o franqueado com rentabilidade, com dinheiro no bolso, com lucratividade. Se o franqueado tampar o nariz, quem morre é o franqueador”, avalia.
Segundo ele, manter o investidor no centro significa pensar em operações, marketing e expansão sempre com foco na lucratividade de quem está à frente da unidade. “A franqueadora tem que ter o franqueado no centro das suas ações, das suas operações, do seu investimento de crescimento”, completa.
Segredo industrial como diferencial competitivo no franchising
A adoção do segredo industrial para blindagem de produtos também é vista em outras redes de alimentação. A L’Entrecôte de Paris, conhecida pelo prato principal acompanhado de um molho exclusivo, mantém a receita sob sigilo absoluto. De acordo com a diretora-executiva Gláucia Fernandes, o preparo é centralizado em uma cozinha própria e poucas pessoas conhecem os 21 ingredientes que compõem o molho.
Nos restaurantes, os franqueados recebem o produto pronto, limitando-se à etapa de finalização. “O franqueado não tem acesso aos 21 ingredientes e muito menos ao modo de preparo”, destaca Gláucia. O sigilo chega ao ponto de a rede não informar sequer a composição em casos de restrição alimentar. “Se a pessoa tem alguma alergia, a gente recomenda que não coma o nosso molho”, afirma.
A decisão pode soar rígida, mas é parte da estratégia de manter a identidade do prato intacta e inimitável. Dessa forma, a L’Entrecôte de Paris assegura que a experiência seja igual em qualquer unidade e reduz a margem de risco de que ex-franqueados ou concorrentes tentem replicar seu produto.
Lições para manter franqueados e evitar evasão
O conjunto de práticas adotadas por redes como Suburbanos Pizza e L’Entrecôte de Paris ilustra como a proteção do know-how se tornou uma prioridade no franchising. Não se trata apenas de preservar segredos de cozinha, mas de garantir que a vantagem competitiva da marca permaneça exclusiva, mesmo em cenários de saída de franqueados.
A mensagem é clara: no franchising, a segurança de um modelo de negócio passa tanto pela proteção legal e industrial quanto pela satisfação econômica do franqueado. É esse equilíbrio que define a solidez de uma rede a longo prazo.