Em entrevista ao Café com Política, do canal O TEMPO, a deputada federal Duda Salabert (PDT) criticou a postura do governador Romeu Zema (Novo) de ‘brigar’ com o presidente Lula (PT) durante visita a Minas Gerais neste mês de março. A deputada também falou sobre preconceito, polarização ideológica e eleições 2026.

Confira a seguir os principais trechos.

A senhora diz que a população brasileira está cansada do debate ideológico. O que a população quer ver nas eleições de 2026?

Infelizmente, nos últimos anos, no Brasil, a política tem caminhado, fazendo uma analogia, para torcida de futebol. Você tem duas torcidas organizadas, cada uma defende o seu ídolo. Mas a política, os problemas reais, têm sido deixados de lado. Queremos um debate de ideias, não um debate estritamente ideológico. É o debate de projetos. Para que serve a política? Para reduzir preço de alimento, gerar emprego e melhorar a qualidade de vida. É isso que a população está pedindo. 

O governo Lula nomeou Gleisi Hoffmann ministra das Relações Institucionais para fazer a articulação com o Congresso. É um bom nome?

A Gleisi tem uma experiência grande, foi senadora, deputada, ministra e presidenta do PT, dialoga com os parlamentares. Torço para dar certo, porque o diálogo do governo com o Parlamento estava muito ruim, com muitas arestas e exigia uma articulação melhor - para o bem da democracia e das políticas públicas. Torço para que Gleisi seja esse nome, mas já vi resistências, sobretudo de setores da direita. 

Falando de Congresso Nacional e de 2026, o Senado é o que a senhora almeja na próxima eleição?

Meu objetivo hoje é concluir o mandato. Tenho participado de várias campanhas. Senado 2018, vereadora 2020, deputada federal 2022, prefeita em 2024. O meu foco é cumprir o mandato e daqui a dois anos o meu nome estar à disposição, do partido e de Minas Gerais, para o cargo que acharem melhor. Ainda é cedo para discutir qual cargo vou disputar daqui a dois anos. Vou disputar as eleições, mas não sei qual cargo.

Temos alguns nomes colocados para o governo de Minas em 2026. Se fala do senador Rodrigo Pacheco, do ministro Alexandre Silveira, com apoio do campo progressista. Como a senhora enxerga esses nomes?

Algumas pessoas falam da prefeita de Contagem, Marília Campos (PT). Se você acha que esses nomes são representativos para disputar com os nomes da direita colocados, como o do senador Cleitinho, do vice-governador Mateus Simões (Novo). Para mim, hoje o maior quadro da política mineira para disputar o governo é Marília Campos. Morei em Contagem, foi minha prefeita. Por onde ela passa, é acolhida, aplaudida. Tenho uma relação muito boa com ela, e ela tem conhecimento. Foi deputada, prefeita, tem sensibilidade grande e diálogo fácil. Infelizmente, a polarização se mantém, e Marília consegue dialogar, mesmo estando em um dos polos. É o momento de ter uma mulher governando Minas. Marília Campos é para quem estou fazendo campanha previamente. Nem conversei com ela sobre isso. Mas fica aqui, Marília, se estiver me ouvindo, coloque seu nome à disposição, porque Minas só tem a ganhar com a sua experiência e sensibilidade.
 
Em 2024, a senhora disputou a prefeitura. Como avalia a gestão de Álvaro Damião, prefeito em exercício?

Primeiro, eu torço para que o prefeito Fuad Noman (PSD) se recupere e possa voltar à vida pública. Sempre fui muito crítica à gestão do Fuad. Inclusive, saí candidata por essas críticas. O apoiei no segundo turno porque foi redução de danos. Entre Bruno Engler e Fuad Noman, a gente tem que tomar partido. O Álvaro Damião é quem tem dado continuidade à política do Fuad. O que a gente não quer que aconteça é uma ruptura de programa. O programa eleito nas urnas tem que ser materializado, e eu acho que o Álvaro Damião tem esse pensamento também.

Qual a avaliação do seu desempenho na eleição? Tinha a torcida para que se formasse uma chapa de esquerda, com o deputado federal Rogério Correia. Ficou alguma mágoa do PT?

Não. Política é o diálogo. Tentamos desde o início a construção de uma frente progressista em Belo Horizonte. Em todas as capitais que tinham partidos da base governista que estavam na frente nas pesquisas, o PT apoiou esse candidato. Só não aconteceu em Belo Horizonte, que, sintomaticamente, tinha uma candidatura trans. Nossa candidatura foi importante. Primeiro, no campo de trazer ideias e discutir a cidade. Segundo, porque era o anseio de Belo Horizonte. A cidade pedia para a gente se candidatar. Ficar em terceiro é para descortinar o preconceito e a transfobia que perpassa todos os campos ideológicos. O racismo, o machismo, a LGBTfobia, a transfobia, não são exclusivos de um grupo ideológico. Formatou a nossa sociedade, e a nossa candidatura expôs, descortinou isso, porque foi a única candidatura em capital do campo progressista que estava na frente do PT, que o PT não apoiou. Não há nenhuma mágoa. Pelo contrário, cumprimos um dever histórico de mostrar por que viemos. Para vocês, isso talvez não signifique muito, mas para o grupo que eu faço parte significa demais. Faço parte de um grupo que 90% das travestis estão na prostituição, 41% com HIV, 91% não concluiu ensino médio. É o país que mais mata travestis.

Se sente desrespeitada no Congresso?

Esses desrespeitos acontecem, mas digo sempre: que briguem as ideias e não as pessoas. O debate tem que ser de ideias e não sobre quem eu sou. Existe uma minoria de bolsonaristas que quer barrar nossas ideias por eu ser uma travesti. Mas a maioria do Congresso não é assim. 

Do campo de vista político, o que precisa para influenciar o fim desses preconceitos?

Não tem outra forma de combater o preconceito que não seja por meio da educação. Sou professora de literatura, dei aula por 20 anos, e digo sempre: toda vez que a palavra falha, a violência entra em cena. Uma pessoa bate quando não consegue mais conversar. A violência se manifesta na ausência de diálogo, e o diálogo acontece na escola. Mas como não se discute por medo político, porque grupos da ultra direita perseguem professores, está se criando um ambiente fértil para fossilizar o preconceito. Tabu se constrói com ausência de diálogo. Combate à LGBTfobia, ao racismo, a todos os preconceitos, isso se dá na escola, que é para formar cidadão, para formar a sociedade que a gente quer.

Para finalizar, qual a sua avaliação do governo de Romeu Zema?

A avaliação positiva que dão ao governo Zema não é devido ao governo, mas à gestão anterior do Fernando Pimentel (PT), que foi um fracasso. Mas a gestão de Romeu Zema é muito ruim e pior agora, no final, ficar brigando com presidente. Não é papel de governador brigar com o presidente. Temos que ter uma relação republicana de trazer recurso para Minas. Estou vendo o Zema antecipar o debate eleitoral, porque quer ser vice. Ele não tem capital político para ser candidato nem partido com fôlego para uma candidatura de peso. Isso fica muito ruim para Minas, porque recebeu o presidente. Nós, de Minas Gerais, temos a alma de receber bem as pessoas. Também tenho críticas ao governo Lula, como tenho ao governo Zema. Mas ali não era momento para discutir.

(Com Salma Freua)