A transferência dos dividendos da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig) ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para abater a dívida de cerca de R$ 165 bilhões ganhou corpo como uma alternativa. Citada pelo presidente da Assembleia Legislativa, Tadeu Leite (MDB), o Tadeuzinho, a operação seria uma hipótese caso o Ministério da Fazenda rejeite a federalização da Codemig, autorizada nessa quarta-feira (2 de julho)

Os dividendos são os recursos recebidos pela Codemig a partir da sociedade com a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) constituída para explorar nióbio em Araxá, Alto Paranaíba. Em vigor desde 1973, o acordo dá à CBMM o direito à lavra das jazidas até 2032 e, como contrapartida, devolve à companhia anualmente 25% do lucro líquido da mineradora do grupo Moreira Salles, que, em 2024, foi de R$ 1,7 bilhão.       

Logo após a Assembleia autorizar o governador Romeu Zema (Novo) a oferecer a Codemig à União, Tadeuzinho avaliou a transferência dos dividendos como o “melhor caminho” se assim quiserem os governos estadual e federal. “Mantém o ativo no Estado e entrega os recebíveis. Inclusive, eu vejo que o Estado já está negociando uma postergação do contrato (com a CBMM). Talvez seja um caminho”, argumentou o presidente. 

No último dia 12, o vice-governador Mateus Simões (Novo) autorizou o presidente do Conselho de Administração do grupo Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge), Bruno dei Falci, a iniciar as discussões com a CBMM para renovar o contrato. De acordo com Simões, uma eventual prorrogação por 30 anos iria valorizar a Codemig. “Eu já estou a menos de dez anos do final deste contrato, então o valor da companhia cai”, alegou o vice.

A transferência dos dividendos já foi referendada pela Assembleia ao autorizar o Estado de Minas Gerais a ceder à União a carteira de créditos tributários ou não tributários para abater a dívida. Aprovada no último dia 24, a proposta deu aval a empresas públicas, como é o caso da Codemig, para ceder “direitos creditórios de sua titularidade ao Estado” ou “a pessoa jurídica de direito privado ou a fundo privado de investimento”. 

O texto dá margem para a transferência dos dividendos, em moeda, por dois caminhos: a antecipação ou o empréstimo. O primeiro envolveria a securitização, ou seja, a venda dos recebíveis a bancos ou a fundos privados de investimento em busca de adiantar o que a Codemig tem a receber até o final do contrato com a CBMM para entregar à União. O segundo, por outro lado, seria o empréstimo direto dos dividendos à União.        

Sem considerar uma eventual renovação, a sociedade entre a Codemig e a CBMM pode render R$ 13,6 bilhões até 2032, cálculo feito projetando os dividendos gerados em 2024. Caso o contrato seja prorrogado por 30 anos, como já ocorreu em 2003, a sociedade pode render mais R$ 51 bilhões. Quando questionada por O TEMPO se teria interesse em prorrogar a parceria, a CBMM informou que não iria se manifestar.

As dificuldades do governo Lula em alcançar a meta de déficit zero provocaram nos bastidores da Assembleia a percepção de que o Ministério da Fazenda teria uma preferência em receber valores em moeda para abater a dívida dos Estados. A federalização, que iria transferir ainda os passivos das empresas, poderia impactar diretamente o resultado primário da União, que tenta encontrar alternativas para cumprir a meta após a Câmara derrubar o aumento do IOF.

A presidente do grupo Codemge, Luísa Barreto, observou que o Programa de Pleno Pagamento da Dívida (Propag) não prevê a transferência do fluxo de recebíveis de uma empresa no tempo. “Podemos, sim, conversar com a União sobre isso. A gente sabe que o fluxo tende a ter um valor menor do que o valor em si de uma empresa. O recebimento que uma empresa vai ter no tempo não pode valer mais do que a empresa em si”, ponderou Luísa, em entrevista ao Café com Política há 15 dias. 

Articuladores da Assembleia temem que a transferência apenas dos dividendos da Codemig, caso se concretize, abra caminho para a tramitação das privatizações de Cemig e Copasa. A antecipação dos recebíveis até 2032 seria insuficiente para alcançar o patamar de 20% de amortização da dívida do Estado, porta de entrada do Propag para derrubar a taxa de juros atrelada à dívida pela metade, de 4% para 2%. 

Desde que chegaram à Assembleia, em novembro de 2024, as privatizações estão engavetadas, ou seja, sequer foram recebidas por Tadeuzinho. Quando anunciou o início da tramitação da proposta de Emenda à Constituição (PEC) para quebrar o referendo popular exigido para desestatizações, o presidente afirmou que, “se porventura, a Casa deliberar que vai permanecer o referendo, não tem necessidade de discutir Cemig e Copasa neste momento”.