Três meses depois do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) começar a negociar com os partidos do chamado centrão — PSD, Republicanos, Progressistas, Avante, PL entre outros — o apoio deles às pautas do governo no Congresso, a avaliação de deputados mineiros é que, na prática, a atuação desse grupo de partidos é seletiva, conforme os temas que estão em discussão.

O debate sobre o apoio do centrão ressurgiu após a aprovação, na Câmara dos Deputados, da renovação do Fundeb, fundo que financia a educação básica no Brasil. O governo apresentou nos bastidores uma proposta alternativa ao relatório da deputada Professora Dorinha (DEM-TO) para o fundo, tentando desidratar o texto e destinar parte do valor repassado pela União ao Fundeb para o programa Renda Brasil.

A proposta não foi adiante e o governo federal teve que ceder e fechou um acordo em que cedeu neste ponto e também na proposta de que o novo Fundeb só começasse a vigorar em 2022. Em compensação, o governo aumentou o repasse de recursos da União dos 20% previstos pela relatora para 23%. Cinco pontos percentuais serão destinados para a educação pública infantil.

No dia da votação, o deputado Arthur Lira (PP-AL), articulador informal do governo na Casa, tentou adiar a votação duas vezes.

Após a aprovação, deu-se uma disputa de narrativas: enquanto a oposição disse que a aprovação do Fundeb foi uma derrota da articulação do governo, que abriu mão de pontos importantes e não conseguiu esvaziar o projeto, o presidente Jair Bolsonaro e aliados tentaram transformar a aprovação em uma vitória e exaltam o aumento da participação da União no financiamento da educação básica no país.

Sete deputados bolsonaristas votaram contra o Fundeb, entre eles a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), que foi retirada pelo presidente do cargo de vice-líder do governo. “Os que votaram contra devem ter seus motivos. Tem que perguntar para eles porque votaram contra. Agora, alguns dizem que a minha bancada votou contra. A minha bancada não tem seis ou sete (deputados) não. A minha bancada é bem maior que essa daí”, disse o presidente Jair Bolsonaro, um dia depois da aprovação do Fundeb.

“Historicamente, nessas relações fisiológicas desse presidencialismo de coalizão que ainda impera no Brasil, você tinha os deputados da base na mão do governo. O governo pedia e os deputados da base atendiam sem muita cerimônia. O que a gente vê agora é o contrário: o governo nas mãos dos deputados da base e das lideranças dos partidos do centrão”, disse o deputado federal Tiago Mitraud (Novo-MG).

“Isso fica evidente quando você tem adesão dessa base em pontos que são menos problemáticos, mas em pontos mais polêmicos os deputados da base não seguem a orientação do governo e muitas vezes até contrariam no sentido de não só votar contra mas induzir uma reação de todo o plenário contra o governo, como foi o caso na votação do Fundeb”, completou.

Para o deputado federal Júlio Delgado (PSB), houve uma pressão enorme da sociedade pela aprovação do Fundeb — ele afirma nunca ter recebido tantas mensagens de eleitores —, o que, na avaliação dele, forçou o centrão a fechar o acordo em torno do relatório da deputada Professora Dorinha, acertando mudanças menores do que as desejadas inicialmente pelo governo.

No entanto, a votação de um destaque proposto pelo Novo, que queria retirar do texto um trecho que versava sobre o Custo Aluno-Qualidade (CAQ), dispositivo que estabelece parâmetros básicos e metas de qualidade para a educação pública, apontaria a divisão do Centrão na avaliação do deputado. O líder do governo, Major Vitor Hugo, orientou que os deputados votassem a favor da retirada do CAQ.

“Alguns partidos do centrão quiseram acompanhar o líder, outros partidos honraram o acordo, mas muito mais com medo do desgaste do que propriamente concordando com a tese que estava sendo celebrada. O Centrão se dividiu mostrando aí a dubiedade que existe (em relação ao apoio ao governo)”, disse Júlio Delgado.

“A verdade é que ninguém vota contra a educação”, resumiu o deputado Fábio Ramalho (MDB-MG), para quem não existe mais centrão, já que, segundo ele, DEM e MDB não fazem mais parte do grupo. “Os partidos que estão ali mais concentrados são o Republicanos, o PSD e o PP”, disse. Pouco depois de Ramalho falar com O TEMPO, DEM e MDB anunciaram que estavam deixando formalmente o bloco.

O deputado bolsonarista Cabo Junio Amaral (PSL-MG), que votou contra o Fundeb, afirma que o apoio da base do governo é “relativo”. “Não vai abraçar tudo que o governo quer, infelizmente. Nesse caso busca-se um equilíbrio entre o desejo das partes”, disse.

Ele diz ter votado contra a PEC que renovou o Fundeb porque não foi discutido o que fazer para melhorar de fato os índices educacionais brasileiros e porque, na opinião dele, era possível criar um conjunto de leis para a educação básica no lugar de constitucionalizar o modelo. “Até porque a educação está mudando e mudará num curto prazo e estaremos "travados", declarou.

Líder do PSD afirma que partido é independente

O líder do PSD na Câmara dos Deputados e também líder da bancada mineira no Congresso, o deputado federal Diego Andrade (PSD-MG) defende que o partido sempre foi alinhado ao governo, principalmente nas pautas econômicas.

“O PSD desde o começo tem tido uma posição independente, apoiando as boas causas do governo. A pauta econômica tem muita sinergia”, disse, lembrando que um dos fundadores do PSD, Guilherme Afif Domingos, hoje é assessor especial do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Segundo ele, nas conversas com o governo, outra linha adotada é de trazer “pessoas sérias, que conhecem Minas Gerais”, para ocupar postos importantes no governo federal. O exemplo citado por ele é o ex-comandante da Polícia Militar mineira, o coronel Giovanne Gomes da Silva para a Fundação Nacional da Saúde.

“O objetivo, é claro, é levar benefícios para o Brasil, mas também para Minas Gerais. Nosso Estado ficou esquecido nessa briga de décadas e décadas com o governo federal”, afirma Diego Andrade, para quem a esquerda tenta tirar vitórias do presidente Jair Bolsonaro.

“O que conta muito é a posição do presidente, que é quem toma a decisão. E a decisão do Bolsonaro de colocar 23% (de complementação da União) para o Fundeb é histórica”, concluiu.