BRASÍLIA — Uma reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), após a instalação das comissões permanentes, definirá o futuro da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a implementação de um regime Semipresidencialista no Brasil.
O autor da PEC, deputado Luiz Carlos Hauly (Podemos-RS), e o deputado cotado para ser relator, Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), aguardam uma posição de Motta para articular a tramitação da proposta. O avanço dela depende de um despacho do presidente da Câmara remetendo o texto à análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) — ainda não instalada.
A perspectiva é que o encontro aconteça em março, e os parlamentares acreditam que Motta dará aval à tramitação, principalmente diante de uma declaração recente dada por ele em apoio à discussão sobre o regime parlamentarista no Congresso Nacional.
A fala do presidente da Câmara foi interpretada como um aceno à PEC, que alcançou, no início do mês, o número mínimo de assinaturas para ser protocolada. A proposição angariou o apoio de deputados de 15 partidos da Câmara, principalmente do centrão e da oposição — apenas PT, Psol, Novo, PRD e Rede não aderiram à PEC.
Originalmente, a proposta também prevê uma mudança no regime eleitoral com a implementação do voto distrital misto ao invés dos sistemas majoritário e proporcional definidos pela Constituição e em vigor até hoje. Entretanto, Lafayette de Andrada avalia que, avançando a discussão da PEC, é possível derrubar esse trecho da proposta.
“Existem outras propostas [sobre mudanças no sistema eleitoral] mais avançadas no Congresso. Penso que, quando for formada a comissão especial para debater a PEC, deveríamos tirar essa temática. Acho que uma coisa não deve interferir na outra”, declarou.
O que é o voto distrital misto e o que a PEC prevê?
Hoje as eleições brasileiras são decididas pelos sistemas majoritário e proporcional, definidos pela Constituição de 1988. O majoritário é usado para os eleitores decidirem senadores, presidente, governadores e prefeitos. Nele, vence a eleição o candidato que receber mais votos.
O sistema proporcional é usado para eleger deputados federais, estaduais e distritais. O Brasil aplica às eleições o sistema de lista aberta, em que os eleitores escolhem diretamente seus candidatos; mas, a representação ocorre na proporção da preferência dos eleitores pelos partidos políticos.
Na prática, significa que os eleitores votam no nome do candidato — que consta em uma lista de candidatos de cada partido. A quantidade de votos que a lista receber define o número de cadeiras que o partido ocupará.
O modelo distrital misto proposto pela PEC prevê que os Estados da Federação sejam divididos em distritos para a eleição de membros da Câmara dos Deputados. Os eleitores, então, votariam em um candidato do próprio distrito e em um partido. A distribuição das cadeiras ocorreria da seguinte maneira:
- Dois terços das cadeiras seriam distribuídas para os candidatos mais votados de cada distrito;
- Um terço seria definido pela lista indicada por cada partido.
O princípio da proporcionalidade, usado para definir quantas cadeiras cada Estado tem direito, continuaria a ser aplicado. Entretanto, os distritos seriam definidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Como começou?
As críticas ao presidencialismo ressurgem no Brasil com intervalos frequentes desde que a Constituição Federal de 1988 garantiu a implementação do modelo — defendido pela população em um plebiscito em 1993, que perguntou aos brasileiros se eles preferiam parlamentarismo ou presidencialismo e ainda república ou monarquia.
Lafayette argumenta que a PEC não confronta o resultado da consulta popular, mas, propõe um meio-termo para corrigir eventuais distorções no regime atual.
“Estamos propondo o semipresidencialismo porque o parlamentarismo foi derrotado”, explicou. “Qual é a grande vantagem? A criação da figura do primeiro-ministro sem mandato fixo. Se ele é bom, continua no cargo. Começou a desagradar? Tira, mas você tira de maneira natural e sem os rompimentos traumáticos do presidencialismo”, acrescentou.
A proposição é fruto de outra PEC, que tramitou em comissão especial em 2001 e recebeu parecer favorável — de autoria, inclusive, do pai do deputado Lafayette de Andrada, o então deputado Bonifácio de Andrada.
O que mudaria?
O presidencialismo implementado pela Constituição impõe a concentração dos poderes de chefe de Estado e chefe de Governo nas mãos do presidente da República.
Ele reúne, portanto, todas as competências que cabem ao Poder Executivo — enquanto as outras funções são distribuídas entre o Poder Legislativo e o Poder Judiciário, representados pelo Congresso Nacional e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O presidente é eleito pelo sistema majoritário e em votação popular para cumprir um mandato de quatro anos, podendo concorrer a uma reeleição.
A PEC propõe a divisão dos poderes do Executivo entre o presidente eleito pelo voto popular e o primeiro-ministro — designado pelo próprio presidente.
Ao premiê caberia a função de elaborar um plano de governo e controlar o orçamento. Ele responderia a um comitê de ministros, indicado por sugestão dele próprio ao presidente, e ao Congresso Nacional.
Outras funções caberiam ao presidente, como a possibilidade de dissolver a Câmara dos Deputados em ocasiões extraordinárias. Outro encargo dele seriam as indicações para cargos nas grandes instituições do país — STF, Procuradoria-Geral da República (PGR) e Advocacia-Geral da União (AGU), por exemplo.
O presidente também poderia decidir sobre vetos e sanções às propostas aprovadas pelo Legislativo — como ocorre hoje.