BRASÍLIA - A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que se debruça sobre as fraudes no INSS não descarta uma acareação entre Carlos Lupi, ex-ministro da Previdência, e figuras citadas por ele em depoimento nesta segunda-feira (8/9). O presidente da CPI mista, senador Carlos Viana (Podemos-MG), admitiu a possibilidade e revelou que pode obrigar Lupi a retornar à comissão se encontrar contradições em suas declarações.
“As falas dele serão confrontadas com os dados investigados que constam no inquérito da Polícia Federal. Naturalmente, quando compararmos, ele poderá ser chamado novamente para esclarecer pontos”, declarou em intervalo após cerca de quatro horas de sessão. “Se as informações forem desencontradas com as informações do inquérito, ele [Carlos Lupi] poderá ser convocado para uma acareação, inclusive com outras pessoas citadas durante a fala”, completou Viana.
Lupi é o primeiro ex-ministro da Previdência a depôr à CPMI destinada a investigar descontos ilegais em pensões e aposentadorias pagos pelo INSS. Quem depõe na quinta-feira (11/9) é José Carlos Oliveira, que presidiu o INSS e foi ministro do Trabalho e Previdência da gestão Jair Bolsonaro (PL). O calendário de sessões ainda prevê depoimentos de Antonio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS, na segunda-feira (15/9), e de Maurício Camisotti na quinta-feira (18/9). Eles são apontados pela Polícia Federal como os principais operadores das fraudes nas aposentadorias e pensões.
Lupi nega ter acobertado crimes e se diz vítima de injustiças
Carlos Lupi pediu demissão da Previdência há quatro meses diante do escândalo dos descontos irregulares. Em depoimento à CPMI que investiga as fraudes, ele negou ter acobertado crimes e se dedicou a explicar que não sabia a enormidade das fraudes até que aconteceu a operação da PF e da Controladoria-Geral da União (CGU). Ele também criticou os descontos dos empréstimos consignados nas aposentadorias e pensões e afirmou sofrer injustiças.
“Sei que tenho falhas e defeitos, mas, saibam que jamais serão por má-fé”, disse. “Já senti a dor da injustiça, mas gosto muito de trechos da Bíblia que marcam minha vida e lá está escrito: os injustiçados serão enaltecidos. Tenho uma vida pela frente para aguardar o tempo de ver quem cometeu crime ser preso”, completou.
Lupi elogiou a iniciativa do Congresso Nacional em proibir os descontos de associações nos pagamentos de aposentados e pensionistas do INSS. “Acabaram com os descontos associativos. Por que não acabar com os descontos dos consignados também? É uma iniciativa muito salutar”, sugeriu.
O relator, deputado Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), também pôs em xeque se Lupi, enquanto ministro, sabia ou não das irregularidades e se ele informou as suspeitas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Lupi negou. “Eu não tinha o quê informar ao presidente. Como eu ia comunicar? Tínhamos denúncias de coisas específicas e bem menores, mas não das milhões que apareceram na operação [da Polícia Federal]”, declarou.
Ele também disse que não conhecia o Careca do INSS ou Maurício Camisotti. “Em relação ao Careca do INSS, pedi, inclusive, para verificar se em algum momento tive agenda com ele. Nunca tive”, acrescentou.
Pedido de demissão
Nomeado para a Previdência pelo presidente Lula após a eleição, Carlos Lupi pediu demissão em maio após estourar um escândalo de descontos irregulares nos pagamentos do INSS. Sobre ele recaíram acusações de omissão diante da suspeita de retiradas bilionárias das aposentadorias e pensões pagos pelo instituto.
A PF e a CGU revelaram que associações realizavam descontos nos benefícios sem autorização legal ou a partir de fraudes documentais. As investigações identificaram uma retirada ilegal de R$ 6,3 bilhões entre 2013 e 2024. A operação levou à demissão do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, afastado do cargo por determinação da Justiça e retirado do cargo por determinação do presidente Lula.
A principal acusação contra Lupi é de omissão grave. Ele teria ignorado alertar de auditorias internas e externas que apontavam irregularidades crescentes no modelo de convênios com entidades de aposentados.
O TCU identificou que, entre 2021 e 2024, a arrecadação dessas entidades por meio de descontos diretos saltou de R$ 544 milhões para R$ 2,1 bilhões. Esse crescimento acelerado aconteceu sob os governos de Jair Bolsonaro e Lula, ambos agora sob escrutínio por facilitarem ou não conterem a proliferação desses convênios.