BRASÍLIA - Um bate-boca interrompeu o depoimento de Carlos Lupi nesta segunda-feira (8/9) na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga descontos irregulares em pensões e aposentadorias do INSS. Ele era ministro da Previdência quando estourou o escândalo das fraudes nos benefícios e respondia às perguntas da comissão pela quinta hora seguida quando uma briga paralisou a sessão.
O bate-boca começou com as perguntas do deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS), que pôs em xeque respostas apresentadas por Carlos Lupi e atribuiu a ele responsabilidade pelos descontos ilegais. Com as perguntas em série de Van Hattem, Lupi disse que só responderia ao final. O relator, deputado Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), interviu e afirmou que o ex-ministro poderia gozar do direito ao silêncio para se poupar da culpa.
A situação escalou, e começou uma briga geral. Enquanto o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) discutia com o presidente da comissão, senador Carlos Viana (Podemos-MG), o deputado Rogério Correia (PT-MG) e o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), gritavam em outra parte do plenário. Rogério lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nesta terça-feira (9/9) e provocou o adversário: "sexta-feira é Bolsonaro na cadeia! Vá amanhã ver o 'Xandão', Sóstenes", disparou.
O cenário caótico perdurou por mais de 10 minutos, e a tranquilidade só foi restabelecida depois de todos os microfones serem cortados. A sessão recomeçou com Marcel Van Hattem repetindo as perguntas diante do silêncio de Lupi, que desistiu de responder. "Seu silêncio diz mais alto que qualquer palavra. O senhor tem responsabilidade", afirmou o deputado do Novo.
Após o fim da declaração de Van Hattem, Lupi pediu suspensão da sessão por 10 minutos, e, na retomada, decidiu responder às questões do deputado. Ele tornou a negar responsabilidades pelas fraudes e disse que não acobertou crimes.
Lupi se diz vítima de injustiças
Carlos Lupi pediu demissão da Previdência há quatro meses diante do escândalo dos descontos irregulares. Em depoimento à CPMI que investiga as fraudes, ele negou ter acobertado crimes e se dedicou a explicar que não sabia a enormidade das fraudes até que aconteceu a operação da PF e da Controladoria-Geral da União (CGU). Ele também criticou os descontos dos empréstimos consignados nas aposentadorias e pensões e afirmou sofrer injustiças.
"Sei que tenho falhas e defeitos, mas, saibam que jamais serão por má-fé", disse. "Já senti a dor da injustiça, mas gosto muito de trechos da Bíblia que marcam minha vida e lá está escrito: os injustiçados serão enaltecidos. Tenho uma vida pela frente para aguardar o tempo de ver quem cometeu crime ser preso", completou.
Lupi elogiou a iniciativa do Congresso Nacional em proibir os descontos de associações nos pagamentos de aposentados e pensionistas do INSS. "Acabaram com os descontos associativos. Por que não acabar com os descontos dos consignados também? É uma iniciativa muito salutar", sugeriu.
O relator, deputado Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), também pôs em xeque se Lupi, enquanto ministro, sabia ou não das irregularidades e se ele informou as suspeitas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Lupi negou. "Eu não tinha o quê informar ao presidente. Como eu ia comunicar? Nós tínhamos denúncias de coisas específicas e bem menores, mas não das milhões que apareceram na operação [da Polícia Federal]", declarou.
Ele também disse que não conhecia o Careca do INSS ou Maurício Camisotti. "Em relação ao Careca do INSS, pedi, inclusive, para verificar se em algum momento tive agenda com ele. Nunca tive", acrescentou.
Pedido de demissão
Nomeado para a Previdência pelo presidente Lula após a eleição, Carlos Lupi pediu demissão em maio após estourar um escândalo de descontos irregulares nos pagamentos do INSS. Sobre ele recaíram acusações de omissão diante da suspeita de retiradas bilionárias das aposentadorias e pensões pagos pelo instituto.
A PF e a CGU revelaram que associações realizavam descontos nos benefícios sem autorização legal ou a partir de fraudes documentais. As investigações identificaram uma retirada ilegal de R$ 6,3 bilhões entre 2013 e 2024. A operação levou à demissão do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, afastado do cargo por determinação da Justiça e retirado do cargo por determinação do presidente Lula.
A principal acusação contra Lupi é de omissão grave. Ele teria ignorado alertar de auditorias internas e externas que apontavam irregularidades crescentes no modelo de convênios com entidades de aposentados.
O TCU identificou que, entre 2021 e 2024, a arrecadação dessas entidades por meio de descontos diretos saltou de R$ 544 milhões para R$ 2,1 bilhões. Esse crescimento acelerado aconteceu sob os governos de Jair Bolsonaro e Lula, ambos agora sob escrutínio por facilitarem ou não conterem a proliferação desses convênios.