O Estado de Minas Gerais arrecadou cerca de R$ 1 bilhão com o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) em 2020. Embora represente uma parcela pequena da arrecadação, uma decisão judicial pode piorar ainda mais a já delicada situação das contas públicas estaduais ao impedir a cobrança de parte do imposto.

O ITCMD é cobrado quando há a transmissão de bens em decorrência de morte – um pai que deixa uma casa para um filho, por exemplo – ou quando há uma doação de bens. Em Minas Gerais, a alíquota é de 5% do valor do bem a ser transferido.

Em muitos casos, quando a doação acontece entre pessoas que estão vivas, opta-se por transferir apenas o título de propriedade, e não o usufruto. Esse instrumento é muito usado em casos de planejamento sucessório, quando se organiza de forma antecipada a distribuição do patrimônio de uma família.

Na prática, isso significa que o pai, que ainda vivo transfere a propriedade da casa para o filho, continuará tendo o direito de uso, ou usufruto, sobre o imóvel, tendo direito a tomar as decisões relativas à casa – como, por exemplo, colocá-la para alugar. Nessas situações, a legislação mineira também tributa o usufruto, e não apenas a doação: uma nova cobrança de 5% é realizada, mas desta vez sobre o valor de um terço do bem.

No entanto, uma decisão recente da Vara de Fazenda Pública de Juiz de Fora considerou que a cobrança do ITCMD sobre o usufruto no momento da doação é ilegal. A decisão foi tomada em um caso concreto, em que um pai doou um apartamento para o filho, mas manteve o direito de usufruto. 

Como o próprio nome do imposto indica, o ITCMD é cobrado sobre a transmissão de um bem ou direito. No caso, o pai não transferiu o usufruto: o manteve e transferiu o título de propriedade. 

Como não houve transmissão do usufruto, o juiz Marcelo Cavalcanti Piragibe Magalhães entendeu que não havia razão para haver a tributação sobre o usufruto. Havia base apenas para a cobrança dos 5% sobre a doação do imóvel, em que, de fato, houve a transferência do bem e que não é questionada na Justiça. 

É o que explica o advogado Tancredo Aguiar, sócio do Binato Junqueira Pestana Aguiar e Frattini Advocacia, escritório que defendeu a causa.

“Quando reservo o usufruto enquanto proprietário, ao doar meu bem para você, que é, por exemplo, meu filho, não está havendo uma transmissão desse direito. Ele já é meu, sou dono pleno e usufrutuário. Eu doo para você o domínio do bem, mas eu continuo sendo usufrutuário. Ou seja, o usufruto permaneceu no mesmo lugar. Não teve transmissão. Logo, não pode ter cobrança de imposto. E a Fazenda cobra, porque a lei dá margem para ela cobrar. E foi justamente em cima disso que fizemos a ação”, explicou.

A legislação de Minas, segundo ele, prevê a cobrança do ITCMD sobre o usufruto em dois momentos: na doação do bem ou na extinção do usufruto — na maioria dos casos isso ocorre quando a pessoa que é usufrutuária do bem morre.

Estado tentará reverter decisão 

A reportagem pediu ao governo de Minas uma posição sobre decisões judiciais envolvendo a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação a respeito do usufruto.

Por meio de nota, a Advocacia Geral do Estado (AGE) informou que tentará reverter as decisões. O governo estadual, no entanto, não deu detalhes sobre a arrecadação correspondente ao usufruto. 

“A Advocacia Geral do Estado de Minas Gerais apresentou recurso contra a decisão da comarca de Juiz de Fora e só irá se manifestar nos autos do processo”, diz a nota.

De acordo com o Portal da Transparência de Minas Gerais, a arrecadação do governo estadual com ITCMD em 2019 e 2020 foi de R$ 947 milhões e R$ 996 milhões, respectivamente. Nos dois anos esses valores representaram 1,5% do total da receita do Estado.

A reportagem pediu ainda um levantamento de quanto do valor arrecadado com o imposto corresponde à tributação do usufruto, mas não teve resposta. Vale ressaltar que, independentemente das ações judiciais, a cobrança de 5% sobre a doação do bem continua sendo feita e não foi objeto das ações na Justiça.