Os governos de Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, dois dos Estados que aderiram ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), estão negociando com o governo federal mudanças nos termos de adesão porque ambos tiveram queda na receita e estão com dificuldades em manter compromissos em dia. Minas Gerais planeja sua adesão ao RRF nos próximos meses, mas o debate gerado em torno do tema está sendo amplo e dividindo entidades e políticos. 

As questões dos governos fluminense e gaúcho foram levantadas na semana passada pela oposição ao governador Romeu Zema (Novo) e sindicatos. Segundo eles, quem aderiu ao regime se arrependeu. 

O RRF exige dos Estados que aderem a ele uma série de compromissos, como não judicializar questões envolvendo valores devidos ou a receber com o governo federal. 

Para o deputado estadual Cristiano Silveira (PT-MG), os Estados ficam de mãos atadas e reféns da União, de acordo com a Lei do RRF de 2017. O petista alerta para as dificuldades que Minas pode passar se assinar o RRF da maneira que está hoje e faz um comparativo com as gestões carioca e gaúcha. 

“O Rio de Janeiro, pela segunda vez, pede readequação nos parâmetros. E agora também o Rio Grande do Sul. A questão foi aquela redução dos impostos que o Bolsonaro forçou. Impactou combustíveis e energia elétrica e tudo mais. Esses dois Estados tiveram perda de arrecadação de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões e, dessa maneira, houve um desequilíbrio”, diz o parlamentar. 

Ele alerta que Minas está passando pela mesma situação. “Minas Gerais também tem frustração de receita nesse sentido. O pano de fundo disso tudo é que, com a adesão ao RRF, os Estados abrem mão de judicializar ou questionar qualquer coisa na Justiça em termos de perdas. Então, veja bem, com estas perdas, se não houver compensação a contento, os Estados nada poderiam fazer. É um pouco isso que motivou esse pedido de readequação. Minas Gerais está aceitando tudo do jeito que está, quer seguir essa cartilha”, aponta.

“O governo federal deveria rever os termos de imposição a condicionantes impostas aos Estados. Até porque há algo que precede, que é o debate deste encontro de contas. O que se deve, se deve de fato, e o que o Estado tem a receber, para haver daí o equilíbrio”, afirma o deputado.

Aviso

O presidente do Sindicato dos Servidores da Tributação, Fiscalização e Arrecadação de Minas (Sinfazfisco-MG), Hugo Rene de Souza, faz um aviso parecido. 

“O Sinfazfisco-MG há muito tempo alerta sobre os prejuízos que o povo mineiro irá se sujeitar caso seja aprovada a adesão ao RRF”, observa Souza.

“Tal qual acontece com Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, que pediram a revisão do plano de recuperação, tendo em vista a dose cavalar dos remédios propostos”, afirma.

“(Dose) que poderá matar os Estados aderentes, cuja situação ficou agravada após a redução das alíquotas de energia, comunicação e combustíveis”, pontua o dirigente sindical. 

Temor de ficar sem reajuste salarial

O Regime de Recuperação Fiscal proposto pelo governo Zema vem enfrentando críticas. Alguns dos principais pontos focados pela oposição são o congelamento de salários dos servidores públicos por dez anos e a proibição de realizar concursos pelo mesmo período. O deputado estadual Ulysses Gomes (PT) falou sobre o tema na reunião da última quarta-feira na Assembleia de Minas. 

“O nome pode parecer até bonito, mas na prática não é nada mais do que um regime de falência do serviço público. Serão dez anos sem nada acontecer em Minas Gerais, dez anos de vigência desse programa, e os prejuízos para a população serão e são incontáveis. Um dos mais devastadores será o congelamento do salário de servidores públicos e a proibição dos concursos públicos”, criticou Gomes. 

Para o deputado estadual Cristiano Silveira (PT), além da questão envolvendo o funcionalismo, há também o lado técnico. Segundo ele, Minas Gerais não atenderia os critérios exigidos pela União para aderir ao RRF. 

“São dois debates, de dois pontos de vistas. O primeiro é que Minas Gerais não estaria atendendo as exigências técnicas para se adequar ao RRF. O outro ponto é de ordem política, sobre qual impacto o congelamento dos salários dos servidores e a ausência de concurso públicos teriam. Isto prejudicaria todo o funcionamento da máquina do Estado, já que o serviço público é feito pelo servidor”, afirmou Silveira. 

Governo de Minas defende adesão ao regime

Em nota divulgada na semana passada, o governo do Estado desvincula o congelamento de salários à adesão ao RRF. 

“A capacidade de o Estado ter ou não condições de conceder reajustes salariais não está diretamente ligada à adesão ao Regime de Recuperação Fiscal. Na verdade, o que define essa capacidade é o fato de haver ou não recursos disponíveis no caixa do Tesouro Estadual. É importante destacar que, em 2022, após dez anos sem conceder recomposição, o Estado autorizou a atualização de 10,06% nos vencimentos de todos os servidores do Poder Executivo. Isso só foi possível porque, à época, houve condição econômico-financeira”, afirma a nota. 

Já Luísa Barreto, secretária de Planejamento e Gestão, afirma que é necessária a privatização da Codemig. “Quando a gente fala do RRF, nos referimos a uma conta de receitas e despesas que precisam fechar em dez anos. Tem que avaliar o ingresso de receitas e avaliar quais as despesas. Sem a privatização da Codemig, é difícil conseguir o equilíbrio que o regime precisa”, diz. 

Governadores vão a Brasília

Na última terça-feira, o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), foi a Brasília para reunião no Ministério da Fazenda, em busca de revisão do RRF. Segundo ele, em 2022, com a lei que alterou a cobrança do ICMS dos combustíveis, o Estado deixou de arrecadar R$ 3,6 bilhões. “Demos um passo fundamental para garantir a saúde financeira do Rio de Janeiro com esta reunião com o ministro Fernando Haddad”, disse. 

Na última quarta-feira, o governador Eduardo Leite (PSDB) disse que pretende pleitear uma repactuação dos termos do RRF do Estado neste ano. “A União terá que abrir espaço para a repactuação do RRF. Aderimos porque este era o melhor caminho, e o único proposto sempre foi o de pagar. E até porque nenhum governo vai abrir mão de mais de R$ 700 bilhões, que é o montante da dívida dos Estados”, afirmou.