Na avaliação da pesquisadora Marlise Matos, a ampliação da participação feminina acaba por aumentar a violência contra a mulher na política, e essa escalada tem pelo menos duas possíveis consequências: ao mesmo tempo que tem um poder de inibir a participação das mulheres nos espaços de poder, gera também um efeito contrário, de reação delas à violência sofrida, aos ataques constantes e à falta de representatividade.
Ela destaca, por exemplo, como o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL), que completa três anos no próximo dia 14 sem que tenham sido apontados e presos os mandantes do crime, impulsionou uma série de candidaturas femininas, especialmente de mulheres negras, em todo o país.
"A gente teve um aumento bem significativo do número de candidaturas de mulheres negras no Brasil inteiro, e acho que isso é efeito da luta da Marielle e da mobilização do feminismo negro. Então, as feministas negras tomaram uma posição importante de ocupar os espaços de poder”, diz.
Adeputada federal Áurea Carolina reforça também o entendimento da professora, de que ao mesmo tempo que a violência tende a afastar as mulheres da política, ela também impulsiona. “A necessidade de ter mais mulheres nos espaços de poder provoca essa maior disposição das mulheres. É por uma questão de sobrevivência até que nós nos colocamos para essa tarefa. Não é porque é maravilhoso”, afirma.
Ela conta ainda que, por algumas vezes, já pensou em abrir mão da vida pública. “Às vezes, a gente coloca na balança: minha vida particular ou continuar? Eu penso nisso. A violência, por ter essa intenção de nos cercear e nos expulsar dos espaços, vira para nós mais um motivo para lutar”, pondera Áurea.
Entre as vítimas de violência política, esse pensamento de desistir da vida pública é comum. “Sem dúvida, a gente pensa sempre (em desistir), mas para nós, pessoas transexuais, a política não é uma opção, ela é destino. Então, não há como fugir da política, porque nossos próprios corpos são políticos, e a nossa existência já é política por tensionar uma estrutura binária de sociedade que busca excluir a diversidade”, diz a vereadora Duda Salabert.
Ao lembrar das ameaças já sofridas, a presidente da Câmara de Belo Horizonte, Nely Aquino, também admite já ter pensado em deixar a vida pública. “No meu caso, as ameaças foram tão pesadas que chegaram a perseguir o meu filho, momento em que pensei até em desistir da minha missão política”, disse.
E, para mudar essa realidade, segundo Marlise Matos, a solução passa por duas vertentes. Uma delas é uma mudança jurídica, a partir, por exemplo, da paridade de gênero nas instâncias de poder e formas de punição à violência política contra a mulher. E a outra dimensão é a da conscientização da sociedade, por meio de uma mudança de cultura que, conforme a especialista, leva mais tempo.