BRASÍLIA – A Polícia Federal deflagrou na manhã desta quarta-feira (16) uma megaoperação contra um grupo criminoso que fazia encenações em locais públicos para espalhar fake news durante campanhas eleitorais no Estado do Rio de Janeiro. Esquema teria envolvido R$ 3,5 bilhões, destinado a oito empresas encarregadas de contratar atores para encenar diálogos em locais de grande circulação a fim de influenciar o eleitorado.
As investigações revelaram que a quadrilha atua ao menos desde 2016, tendo influenciado no mínimo em três eleições municipais de 13 cidades do Rio de Janeiro. O grupo, segundo as investigações, montou um esquema de contratação de pessoas que recebiam instruções de coordenadores para propagar fake news sobre um determinado candidato.
Os contratados, que recebiam cerca de R$ 2 mil mensais cada, se infiltravam em locais como pontos de ônibus, padarias, filas de bancos, bares e mercados, para difundir mentiras sobre os adversários políticos de seus contratantes. Os coordenadores do esquema tinham um salário de R$ 5 mil.
Na eleições de 2024, os “teatros de rua” teriam sido encenados para beneficiar, entre outros outros, o prefeito de Cabo Frio, Dr. Serginho (PL), e dois candidatos a prefeito derrotados: o deputado estadual Valdecy da Saúde (PL), que concorreu em São João de Meriti, e Aarão (PP), postulante em Mangaratiba. Os três são alvos de busca e apreensão nesta quarta-feira, assim como Rubem Vieira de Souza, o Rubão (Podemos).
Rubão disputou a eleição de 2024 em Itaguaí sub judice, vencendo o pleito, mas foi impedido de tomar posse. Para a Justiça Eleitoral, ele concorreu a um terceiro mandato. Rubão presidia a Câmara de Itaguaí em 2020, quando o prefeito Carlo Busatto Junior e seu vice, Abelardinho, foram cassados. Rubão assumiu a prefeitura interinamente em julho e se elegeu prefeito nas eleições de outubro. Em 2024, concorreu a novo mandato, ficando em primeiro lugar nas urnas.
Nesta quarta, agentes cumpriram 10 mandados de busca e apreensão na cidade do Rio de Janeiro, em Cabo Frio, Itaguaí, Mangaratiba e Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira. A Justiça ainda determinou o bloqueio nas contas dos investigados de valores que somam R$ 3,5 bilhões – para ressarcir os cofres públicos – e a suspensão das atividades econômicas de oito empresas. São apurados os crimes de obstrução da Justiça, caixa dois, lavagem de dinheiro e fraude de licitações.
Grupo criminoso destruiu provas
A Operação Teatro Invisível II é um desdobramento da Operação Teatro Invisível, deflagrada em setembro do ano passado e que prendeu quatro integrantes de um esquema que propagava informações e notícias falsas sobre candidatos durante as campanhas eleitorais. Essas pessoas detidas na primeira fase teriam contratado atores para participarem de teatros de rua para influenciar o voto dos eleitores e desmoralizar candidatos rivais.
Após apreender documentos, investigadores descobriram que o grupo era formado por sócios de empresas que teriam fraudado processos licitatórios. Parte dos investigados seria proprietária de empresas envolvidas em fraudes licitatórias nos municípios de Cabo Frio, Itaguaí, Mangaratiba e São João de Meriti, todos no Rio de Janeiro, além de usar recursos não declarados à Justiça Eleitoral.
A investigação apontou que o grupo criminoso montou esquema de difusão de fake news nas cidades de Araruama, Belford Roxo, Cabo Frio, Carapebus, Guapimirim, Itaguaí, Itatiaia, Mangaratiba, Miguel Pereira, Paracambi, Paraty, São João de Meriti e Saquarema. O bando também é acusado de produzir notícias falsas usando a marca do portal G1 e um vídeo adulterado usando a imagem do apresentador William Bonner.
A investigação revelou ainda novas provas de lavagem de dinheiro, com transações ilegais por meio de contas de passagem, uso de dinheiro em espécie, empresas com intensa movimentação financeira e aquisição de bens de alto valor. Também foram encontrados indícios de que o grupo criminoso destruiu provas, principalmente em meios digitais.
Reportagem de TV revelou esquema
Os atores improvisados que eram pagos para difamar candidatos pelas ruas de 13 cidades do RJ tinham aulas e ensaiavam falas que deviam usar. O caso foi revelado pelo Fantástico, da TV Globo, em setembro de 2024, quando o programa mostrou imagens de treinamentos feitos em galpões para que os contratados conseguissem aprender a influenciar as eleições. Eles eram orientados a dizer coisas como “Gastaram milhões naquela ponte. Para quê? E nossas crianças?”.
Em outros momentos, os atores eram orientados a elogiar o candidato que contratava o esquema. Então, eles ensaiavam frases como “Eu tô (sic) com coração alegre com as propostas dele. Eu, como mãe, como filha”. A investigação, em seguida, buscou identificar os atores e descobrir quem contratou a organização criminosa.
Um dos possíveis beneficiados teria sido o deputado estadual Valdecy da Saúde (PL), candidato à prefeitura de São João de Meriti. Ele aparece num vídeo dizendo que dois dos presos fizeram dele “um dos mais votados do estado do Rio de Janeiro”. A polícia ainda achou um arquivo do grupo chamado “Valdecy campanha teatro”. Ao Fantástico, ele afirmou que não tem relação com os fatos e que não é investigado no inquérito.