À medida que a tecnologia avança, a disseminação de notícias falsas, que se popularizaram com a expressão “fake news”, tornou-se um fenômeno mundial, o que afetou de maneira significativa o processo eleitoral em diversos países. Neste ano, o Brasil enfrenta esse desafio com uma complexidade a mais: a crescente e desordenada utilização de Inteligência Artificial (IA) para a criação e propagação de informações inverídicas na internet.

No âmbito eleitoral, as fake news são informações fabricadas com a intenção de enganar, com vistas a influenciar a opinião pública e decisões eleitorais acerca deste ou daquele candidato ou até mesmo desta ou daquela sigla partidária. Por conseguinte, as plataformas digitais amplificam o alcance dessas notícias, permitindo sua rápida disseminação. Dentro do contexto eleitoral, as fake news podem distorcer a percepção dos eleitores, influenciando resultados e comprometendo a integridade do processo democrático.

Tecnologias como deep fakes, que utilizam inteligência artificial para criar vídeos falsos extremamente realistas, e bots, que automatizam a disseminação de informações, são exemplos de como a IA pode ser instrumentalizada para fins maliciosos. Essas ferramentas permitem a criação de conteúdos convincentes e a sua distribuição em larga escala, aumentando, assim, a dificuldade de identificação e responsabilização dos autores das fake news.

As eleições de 2024 no Brasil serão um teste crucial para a Justiça Eleitoral no seu papel de fiscalização e de zelo pelo processo. Entre os desafios está a identificação e combate às fake news. O desenvolvimento e a implementação de tecnologias capazes de identificar fake news em tempo real são essenciais para a responsabilização dos autores. Isso pode incluir a criação de algoritmos que detectem padrões de disseminação e verifiquem a veracidade das informações.

É fundamental educar os eleitores sobre os malefícios das fake news e como identificá-las. Campanhas de conscientização podem ajudar a criar um eleitorado mais informado e crítico. Outro grande desafio é a regulamentação e a fiscalização desse crescente e preocupante quadro. Portanto, estabelecer um marco regulatório robusto que responsabilize as plataformas digitais e indivíduos pela criação e disseminação de fake news é fundamental no combate desse ilícito.

Recentemente, no Brasil, vimos o esforço da Justiça Eleitoral, munida de sua competência legisladora, de editar e publicar a resolução TSE 23.732/2024, que alterou a resolução TSE 23.610/2019, que dispõe sobre propaganda eleitoral. Anota-se que foi incluído o artigo 9º-C, §1º e 2º, estabelecendo a vedação da utilização, na propaganda eleitoral, de conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral.

E ainda proibiu expressamente o uso, para prejudicar ou para favorecer candidatura, de conteúdo sintético em formato de áudio, vídeo ou combinação de ambos, que tenha sido gerado ou manipulado digitalmente, ainda que mediante autorização, para criar, substituir ou alterar imagem ou voz de pessoa viva, falecida ou fictícia.

A Justiça Eleitoral mostra-se atenta e proativa na defesa da democracia, buscando adaptar-se às novas ameaças digitais. No entanto, a eficácia dessas medidas dependerá de uma aplicação rigorosa e da conscientização do eleitorado sobre os perigos das fake news. É fundamental que todos os atores envolvidos no processo, incluindo candidatos, eleitores e instituições, trabalhem juntos para garantir a integridade e a lisura das eleições de 2024.

(*) Lucio de Medeiros é advogado associado do escritório Diego Leonel, doutorando e mestre em direito pela UFMG e presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-MG, subseção Barro Preto