Ou “cada um no seu quadrado”. Ou “cada macaco no seu galho”

Montesquieu, em seu “O Espírito das Leis”, previu como elemento central para o funcionamento das sociedades democráticas a separação dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que deveriam ser independentes e harmônicos entre si. Essa dinâmica é fundamental para que o sistema de freios e contrapesos aja contra qualquer tentativa de exercício absoluto do poder.

A Constituição brasileira adotou essa configuração. Mas, do papel para a realidade, o que vemos atualmente no país é que os conflitos institucionais entre os diversos Poderes e instituições têm sido um perigoso elemento de instabilidade política. E a retomada do desenvolvimento depende visceralmente da estabilidade institucional.

Muitas vezes, o Judiciário interfere em relações contratuais estabelecidas e na órbita do Legislativo, quando ameaça legislar. O Congresso Nacional, por vezes, tenta engessar o Executivo e limitar as ações do Judiciário.

O presidencialismo brasileiro sempre foi forte, e o Executivo era o grande protagonista, comandando a agenda legislativa e exercendo fortes pressões sobre o Judiciário.

A opção do atual governo de abandonar o “presidencialismo de coalizão” abriu a brecha para que o Legislativo crescesse em suas prerrogativas e desenvolvesse um inédito protagonismo. Tensões institucionais periféricas são naturais e parte do processo democrático, mas sempre dentro de determinados limites.

A temperatura subiu além do razoável nas últimas semanas com a convocação de uma manifestação contra o Congresso e o Supremo, com estímulos visíveis de importantes figuras do Planalto. E o conflito entre governo e Congresso se materializou na discussão sobre o Orçamento impositivo.

A democracia moderna nasceu na Inglaterra para limitar o poder absoluto do rei. Duas leis são centrais na institucionalização da democracia: a Constituição e o Orçamento.

A Constituição é a bússola maior. Ela é o porto seguro da democracia e a vacina contra qualquer aventura totalitária. Em relação ao Orçamento, que ordena as despesas públicas a partir das receitas de impostos recolhidos junto à sociedade, cabe, sim, às Casas parlamentares discutir e votar, e ao Executivo, executar.

No parlamentarismo, a formação de um governo pressupõe a articulação de uma maioria parlamentar e a aprovação de um programa de governo, que encontra expressão nas peças orçamentárias a cada ano. 

Mesmo no presidencialismo norte-americano, no qual se inspirou o Brasil, o Congresso é que constrói a lei orçamentária. Vejam a luta do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para construir seu tão sonhado muro na fronteira com o México. O Congresso norte-americano não priorizou esse investimento.

A polêmica instalada na última semana sobre o assunto está muito mal discutida e obtendo grande repercussão na opinião pública e nas redes sociais, nem sempre com um enfoque correto e consistente. O Orçamento por muito tempo no Brasil foi obra de ficção, e o Executivo reinava absoluto. A execução de emendas parlamentares era discricionária. 

Fui parlamentar de oposição e sei que tinha muito menos recursos de emendas executados do que os “amigos do rei”. Era um mecanismo de chantagem e pressão sobre o Congresso, como admitiu o próprio Bolsonaro, atual presidente, em entrevista em 2016.

Voltarei a esse tema na próxima semana!