O ex-ministro da Justiça e da Segurança Pública Sergio Moro apresentou, ao "Jornal Nacional", da Rede Globo, o que seriam provas das acusações feitas por ele contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Os fatos foram apontados durante pronunciamento realizado nesta sexta-feira (24), em que o ex-juiz da Lava Jato apresentou ao país as principais motivações para o seu pedido de demissão.
Em uma troca de mensagens na quinta-feira (23), Bolsonaro envia o link de uma reportagem do portal O Antagonista que diz "PF na cola de dez a 12 deputados bolsonaristas". O presidente escreve: "Mais um motivo para troca", se referindo a possível exoneração de Maurício Valeixo, diretor-geral da Polícia Federal (PF).
Moro respondeu que a investigação não foi pedida por Valeixo, mas pelo ministro Alexandre de Morais, do Supremo Tribunal Federal (STF). E disse que poderiam conversar sobre o assunto pessoalmente. A publicação citada na mensagem aponta que o inquérito das Fake News deve alimentar um outro, sobre as manifestações contra a democracia, realizadas no domingo (19). Os dois são conduzido por Moraes.
Em outra imagem entregue por Moro ao "Jornal Nacional", a deputada Carla Zambelli (PSL), aliada de Bolsonaro, pede que Moro "aceite Ramagem" (em referência a Alexandre Ramagem, diretor da Agência Brasileira de Inteligência, cotado para assumir o cargo de diretor geral da Polícia Federal) e, em setembro, vá para o STF. Moro rejeita a oferta e diz não estar à venda.
Ao expor a troca de mensagens com a parlamentar, Moro parece indicar que não teria condicionado a troca de diretores da PF à indicação de vaga no Supremo, ao contrário do que disse Bolsonaro em pronunciamento realizado também nesta sexta.
Entenda
A decisão de afastamento do diretor-geral da PF foi publicada na manhã desta sexta, no Diário Oficial da União (DOU). No documento, a informação era que o desligamento se dava a pedido do agente e continha assinatura digital do então ministro. Moro, todavia, nega que Valeixo tenha pedido demissão e diz não ter assinado o decreto. Posteriormente, o documento foi editado e voltou a ser publicado no DOU, desta vez, sem que o nome do ex-magistrado aparecesse como signatário.
Durante a coletiva de imprensa realizada pela manhã, Moro havia acusado o presidente de tentativa de interferência política na Polícia Federal (PF), razão pelo qual o mandatário insistiria na exoneração de Valeixo. Segundo o agora ex-ministro, Bolsonaro queria alguém a quem "pudesse ligar para colher informações", pois tinha "preocupações com investigações" no Supremo feitas pelo órgão.
A apuração da organização das manifestações contra a democracia e referentes ao inquérito da fake news, sobre a disseminação de notícias falsas na internet coordenada pelo chamado "Gabinete do Ódio", estão entre as investigações no Supremo que estão sob cuidados da PF. O órgão também investiga o terceiro filho do presidente, o senador Flávio (Republicanos-RJ), no caso das rachadinhas, em que é acusado de desviar recursos de antigos assessores na Assembleia Legislativa fluminense.
Ainda nesta sexta, o presidente rebateu as acusações e negou que tivesse tentado interferir em investigações. Disse que apenas gostaria de "interagir" com o órgão. Também havia dito que não tem nada pessoalmente contra o ex-diretor-geral, que, segundo Bolsonaro, teria pedido demissão - e não sido demitido. Ele negou que tenha querido saber sobre inquéritos em andamento, mas confirmou ter solicitado informações sobre apurações relacionadas a si prórpio e a seus filhos.
Bolsonaro disse ter pedido informações, "quase como uma súplica, sobre aquelas do Adélio (Bispo), o porteiro e o 04". O capitão reformado se refere a investigação do atentado, sofrido durante a campanha eleitoral, em 2018, em que foi esfaqueado; do porteiro do condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca (RJ), que disse que "seu Jair" teria autorizado a entrada de um dos suspeitos de envolvimento no assassinato de Marielle Franco, em 2018, no dia em que o crime ocorreu; por fim, cita a menção de que seu filho, Renan Bolsonaro, teria namorado a filha de um dos acusados pela execução da parlamentar.
No pronunciamento, Moro ainda citou haver interesse em trocar superintendentes da PF no Rio de Janeiro e em Pernambuco, "sem que me fosse apresentada uma causa, uma razão para que essas trocas fossem aceitáveis", disse. “Eu falei para o presidente que isso seria uma interferência política e ele disse que seria mesmo", acusou.
O ex-juiz lembrou que, em governos anteriores, o órgão teve autonomia preservada. "Imagina se durante a própria Lava Jato o ministro, a então presidente Dilma e o ex-presidente (Lula) ficassem ligando para as autoridades para obter informações?", questionou.
Em reação ao pronunciamento de Moro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitou ao STF abertura de inquérito a fim de apurar acusações do ex-juiz contra Bolsonaro. A Procuradoria pediu investigação por supostos crimes de falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administrativa, prevaricação, obstrução de Justiça, corrupção passiva privilegiada, denunciação caluniosa e crime contra a honra.
O ministro Alexandre de Moraes, em um outro desdobramento sobre o caso, determinou à PF que, nas apurações da propagação de notícias falsas contra a corte e das carreatas a favor da ditadura militar, sejam mantidos os delegados que já estão à frente dos casos.