Após se reunir com líderes no último sábado, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), avisou: “Acho que o resultado do primeiro turno vai ser um resultado, do meu ponto de vista, que vai surpreender a todos”. Ontem, quando o placar de votação da reforma da Previdência foi aceso, a profecia se confirmou. Com um apoio bem superior ao esperado, o texto-base da proposta foi aprovado em primeiro turno entre os deputados federais. Destaques ainda podem modificar diversos pontos na sequência do debate, que deve continuar pelos próximos dias.

Foram 379 votos a favor – 71 a mais do que o mínimo necessário para que o texto avançasse. Por outro lado, 131 parlamentares se posicionaram contra a proposta, enviada pelo governo e bastante modificada na Casa. Entre os mineiros, foram 39 votos a favor e 14 contra. 

Mais suave ou desidratada – dependendo do ponto de vista de quem analisa –, a proposta ganhou adeptos e quebrou resistências nas bancadas. Pesaram também as pesquisas de opinião, mostrando que o texto não era mais tão impopular quanto nas outras vezes em que o assunto foi colocado, e a redução das manifestações contrárias, que praticamente sumiram das ruas na reta final do debate sobre a votação.

Mesmo entre os opositores ao governo, houve traições em série. As ameaças de expulsão em partidos como PDT e PSB não foram suficientes para fazer com que alguns parlamentares dessas legendas deixassem de apoiar as mudanças na aposentadoria, o que contribuiu para o resultado mais elástico do que o esperado.

Logo após a aprovação da proposta, os parlamentares começaram a analisar uma extensa lista de destaques. Quando estes forem concluídos, estará aberto o caminho para a votação em segundo turno. Posteriormente, a reforma avança para o Senado, no qual também precisa ser analisada e votada duas vezes.

O texto

Na proposta aprovada ontem na Câmara, ficaram estabelecidas idades mínimas para que os trabalhadores se aposentem. Para os homens, essa idade será de 65 anos. Para as mulheres, de 62. Além disso, também será necessário um tempo mínimo de contribuição de 15 anos para as mulheres e de 25 anos para os homens. Para receber o benefício integral, porém, o tempo de contribuição pode ter que chegar a 40 anos.

A reforma também traz mudanças para o setor público, no qual o tempo de contribuição passa a ser de 25 anos. Regras distintas para professores e policiais – estas ainda temas de destaques que podem modificá-las também – foram aprovadas.

População fora

Durante a votação da reforma, as arquibancadas da Câmara dos Deputados foram esvaziadas para impedir manifestações. Pessoas que iniciaram um protesto na entrada do anexo 2 da Câmara chegaram a ser contidas pela Polícia Legislativa. Após a confusão, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, determinou que sindicalistas fossem admitidos nas galerias da Casa para acompanhar as discussões e votações da reforma da Previdência. Com isso, alguns poucos deles, principalmente professores, foram autorizados a entrar.

Vitória de Maia

Ao longo de toda a discussão, deputados fizeram questão de entregar principalmente a Rodrigo Maia os louros da vitória. Muitos ignoraram o presidente Jair Bolsonaro, cujo governo foi autor do texto. Na Câmara, é consenso que, após o envio da reforma, articuladores do Planalto, incluindo o próprio presidente, mais atrapalharam do que ajudaram a aprovar o texto. Assim, sem a articulação de Rodrigo Maia junto ao centrão, a vitória era improvável. Na reta final, porém, o governo também entrou em cena, liberando as tradicionais emendas, como tantos presidentes anteriores fizeram em momentos de votação importante. Tática comum da velha política, adotada também pela gestão atual para garantir o sucesso da reforma.

Em meio a aplausos, saudações efusivas até mesmo de Delegado Waldir, líder do PSL, partido de Bolsonaro, Maia chorou e discursou antes do resultado, em cena incomum para presidentes da Câmara. Anunciou a vitória e deu um recado ao governo: a partir de agora a relação será outra. É como se quisesse ali mostrar que ele, tão criticado por movimentos bolsonaristas nas ruas e na internet, demonstrava ser força indispensável para o sucesso do governo.

Com a reforma da Previdência aprovada, a briga agora é pelo protagonismo em torno da reforma tributária, que tende a ter aprovação mais fácil.