Remédio brasileiro sucesso no mundo todo, com a promessa de aumentar o apetite das crianças, o Biotônico Fontoura fez parte da cultura e da infância de centenas de pessoas no país. Criado em 1910, pelo farmacêutico Cândido Fontoura, o medicamento foi batizado pelo escritor Monteiro Lobato e chegou a ser barrado pela Anvisa por conter um teor alcoólico alto, que poderia deixar crianças confusas e com tendência de desenvolver alcoolismo na fase adulta.
Apesar de tradicional por muitas décadas e de ter passado por reformulações, atualmente o remédio é pouco usado entre as famílias. Crianças dessa nova geração raramente sabem da história do medicamento, que chegou a ser vendido até nos Estados Unidos.
Entenda motivo e relembre curiosidades:
Quando começou a ser comercializado, há 114 anos, o Biotônico Fontoura era divulgado como um fortificante, a base de ferro, para adultos e crianças. Para as mulheres prometia beleza, para os homens vigor, e para crianças uma solução para aumentar o apetite.
"Ele é um produto rico em ferro. Quando as crianças, ou qualquer adulto inclusive, tem baixa de ferro, um dos sintomas é perder o apetite. Então se a criança tivesse com baixa de ferro, colocando o Biotônico, o apetite voltava, e a criança conseguia se alimentar", explica Ana Duarte, nutricionista, em entrevista ao portal O TEMPO.
Criado pelo farmacêutico Cândido Fontoura, o nome do medicamento foi dado pelo escritor Monteiro Lobato, o mesmo criador do Sítio do Pica Pau Amarelo. Os amigos, na época, trabalhavam juntos no jornal Estado de São Paulo.
Lobato também ajudou com a publicidade do medicamento e chegou a criar até personagem infantil que tomava o suplemento. O 'Jeca Tatuzinho' foi apresentado ao público brasileiro como uma criança desanimada e fraca que, após ser medicada com o remédio, se tornou bonita, forte e corada.
Foto: Divulgação monteirolobato.com
O Álcool no remédio
A grande questão do Biotônico Fontoura, que foi problematizada por especialistas, era o teor alcoólico do remédio. A fórmula tinha 9,5% de álcool - percentual maior que o da cerveja e vinho - e indicava risco de embriaguez dependendo da quantidade que a criança tomava.
O remédio, inclusive, chegou a ser vendido nos Estados Unidos, durante a Lei Seca, como um refúgio para norte-americanos consumirem produtos alcoólicos.
Em 2001, a Anvisa ( Agência Nacional de Vigilância Sanitária), exigiu a reformulação do remédio e pediu que o álcool fosse retirado de medicamentos usados como suplementos alimentares. A medida tinha o intuito de acabar com a exposição de crianças ao álcool.
Além disso, estudos também alertavam que crianças poderiam ter dores de cabeça, náuseas, aceleração dos batimentos cardíacos, além de apresentarem uma tendência maior ao alcoolismo na vida adulta.
Tempos Mudaram
Mesmo com o sucesso, a fórmula considerada 'milagrosa' na década de 90 hoje é pouco usada por pais e mães. A nutricionista Ana Duarte explica que os hábitos e costumes mudaram, e que o maior problema da infância nos dias de hoje é outro:
"Quando o Biotônico Fontoura estava no auge do mercado, a grande preocupação que a gente tinha nessa época era relacionada a baixo peso das crianças, o risco de desnutrição e também de morte por falta de alimentação. O problema que a gente tem hoje, é a obesidade. O que a gente vê mais como preocupação é o excesso de peso nas crianças.", explica a especialista.
Ana também orienta que a melhor opção para pais que estejam preocupados com o desenvolvimento dos filhos é buscar oferecer uma alimentação saudável e variada:
"Frutas, verduras, o famoso arroz com feijão todos os dias, carnes, preferência carnes mais magras, como carnes assadas, grelhadas, cozidas, refogadas, a gente consegue oferecer sim o que a criança precisa, não necessariamente precisa de colocar algum complemento", explica.
Outra recomendação da especialista é de usar suplementos apenas em casos de indicação médica:
"Antigamente as pessoas davam o Biotônico sem ter certeza da necessidade. Na cabeça das mães, as crianças comem pouco muitas vezes. Nem sempre é o que acontece. Eu falo que a preocupação do pai e da mãe é de oferecer a melhor nutrição. Mas não é relacionado, por exemplo, à quantidade e nem precisa dar tudo que tem no mercado. A gente ainda tem uma cultura de consumir esses produtos suplementares de venda livre de forma aleatória, imaginando que não tem prejuízo e, sim, pode ter prejuízo porque o excesso de nutriente também faz mal. A orientação é suplementar só quando necessário com recomendação do pediatra ou do nutricionista", finaliza.
O Biotônico Fontoura ainda é comercializado nos dias de hoje como fonte de ferro para crianças. Com uma nova fórmula, a marca, desde 2017, tem produtos nos sabores de morango e uva além de serem zero açúcares. Um multivitamínico nos sabores de chocolate e baunilha também foi lançado em 2022.