O episódio da recém-nascida levada por uma médica na noite de terça-feira (23) do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU), no Triângulo Mineiro, e encontrada na manhã desta quarta (24), em Itumbiara (GO), a 134km, tem semelhanças com o rapto de Pedrinho, o mais famoso caso de bebê sequestrado em uma maternidade brasileira. Ele foi roubado em Brasília e também levado para uma cidade goiana. Mas demorou 16 anos para ser encontrado. 

O crime de Uberlândia foi supostamente cometido pela médica-neurologista Claudia Soares Alves, 42 anos, segundo a Polícia Civil de Minas Gerais. A suspeita entrou no hospital com roupa de profissional de saúde, luvas e o rosto coberto por máscara. Portando crachá da UFU, se apresentou na portaria como uma funcionária de nome Amanda, foi à ala da maternidade e, dizendo ser pediatra, pegou a bebê dos pais alegando que a levaria para se alimentar. Fugiu com a criança escondida em uma mochila.

Câmeras de segurança filmaram a entrada e a saída dela da unidade de saúde, além de sua fuga em um carro. Desconfiado da demora no retorno da médica, o pai da bebê procurou os seguranças do hospital, que já haviam sido alertados por uma funcionária, que havia desconfiado do comportamento da suposta médica e descoberto que não havia mudanças na escala nem profissional chamada Amanda.

Logo as polícias Civil e Militar foram acionadas. Com a ajuda da tecnologia e acionando a Polícia Civil de Goiás, os investigadores chegaram à identidade da suspeita e aos seus endereços residencial e profissional. Encontraram a bebê sem nenhum ferimento e prenderam a mulher em flagrante. Os pais de Pedrinho não contaram com a mesma sorte e eficiência das polícias, nem recursos tecnológicos.

Sequestradora de Pedrinho disse ser enfermeira para entrar em hospital

Pedro Júnior Rosalino Braule Pinto nasceu em 20 de janeiro de 1986, e horas depois foi levado dos braços da mãe, Maria Auxiliadora Rosalino, por uma mulher que se apresentou como assistente social do Hospital Santa Lúcia, na Asa Sul, em Brasília. Na época, o hospital não tinha câmeras de vigilância nem qualquer controle automatizado de quem entrava e saía do prédio.

Pedrinho seria localizado apenas em 2002, em Goiânia, com a sequestradora, Vilma Martins Costa, que se passava pela verdadeira mãe dele. Apenas após a descoberta do paradeiro de Pedrinho é que se soube que Vilma saiu do hospital brasiliense com o bebê dentro de uma sacola e fugiu para a capital goiana em um carro que a esperava do lado de fora.

De Vilma, Pedrinho recebeu o nome de Osvaldo Borges Júnior, em homenagem ao homem que ela dizia ser o pai dele, Osvaldo Borges, um fiscal da Receita de Goiás, de quem era amante. Ele abandonou o casamento e a primeira família após Vilma aparecer com o bebê roubado dizendo ser dele. 

A Polícia Civil do Distrito Federal descobriu o paradeiro do menino em agosto de 2002, quando, por meio de e-mail, um anônimo contou a história de um garoto nascido em Brasília e adotado por uma família goiana. Agentes receberam provas apontadas pela pessoa de que se tratava de Pedrinho, como fotografias e descrições do garoto. A denúncia e as provas foram enviadas pouco mais de um mês após a morte do fiscal Osvaldo Borges, vítima de um câncer.

Em 7 de novembro, o jornal Correio Braziliense tornou pública a investigação sobre o adolescente morador de Goiânia. Faltava o DNA. O menino só doou material genético para o teste após uma troca de telefonemas com seu pai verdadeiro, Jayro Tapajós, e a promessa da polícia que nada aconteceria com Vilma.

O resultado do exame foi divulgado na manhã de 8 de novembro, comprovando que Osvaldo Martins Borges era, na verdade, Pedro Rosalino Braule Pinto. O desfecho do caso virou notícia em todo o país e no exterior. Mas não significou o reencontro imediato do menino com os pais biológicos.

Em fevereiro de 2003, a Polícia Civil goiana confirmou, também por meio de DNA, que outro bebê levado de uma maternidade em Goiânia, 24 anos antes, havia sido criado por Vilma como filho verdadeiro dela. A menina que ela registrou como Roberta Jamilly era Aparecida Fernanda Ribeiro da Silva, roubada em 1979.

A Justiça de Goiás decretou a prisão de Vilma em abril de 2003. Ela fugiu por 15 dias, até ser encontrada escondida na casa de uma amiga. No mesmo ano, Vilma recebeu a primeira sentença: oito anos e oito meses, em regime semiaberto por subtração de incapaz e registro falso de Pedrinho. Logo depois, foi condenada pelo rapto e registro de Aparecida.

No fim de 2003, Pedro se mudou para Brasília, onde, no ano seguinte, concluiu o ensino médio. Ele se formou em direito no Centro Universitário de Brasília (UniCeub) e, em 2012, se casou com a baiana Nábyla Gabriela Queiroz Galvão, com quem teve João Pedro e Isadora.

A família ainda mora na capital federal, onde Pedro faz uma bem sucedida carreira como advogado, atuando em casos de repercussão nacional.

Vilma continua morando em Goiânia, com Roberta Jamilly, que, diferentemente de Pedro, não quis adotar o nome original nem viver com a mãe biológica (o pai morreu antes da filha ser encontrada).

Caso Pedrinho inspirou novela e é contado com detalhes em livro

O drama da família biológica de Pedrinho serviu como uma das inspirações para a novela “Senhora do Destino”, de Aguinaldo Silva, exibida na Globo em 2004. Na trama, Maria do Carmo (Susana Vieira) busca por anos a filha Maria Lindalva (Carolina Dieckmann), roubada quando criança. Já adulta, ela é encontrada como Isabel, criada pela vilã Nazaré Tedesco (Renata Sorrah).

Já o jornalista Renato Alves, que cobriu o “Caso Pedrinho” pelo Correio Braziliense e hoje trabalha na redação de O TEMPO em Brasília, escreveu um livro-reportagem sobre essa trama. Lançado pela Geração Editorial e disponível nas principais livrarias físicas e online do país, “O Caso Pedrinho” revela tudo sobre essa história real que parece ficção.