"Viver e não ter a vergonha de ser drag queen", canta Silvetty Montilla, a apresentadora da Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ de São Paulo.

O gracejo marcou os discursos iniciais do maior evento LGBTQIAPN+ do calendário nacional, que começou neste domingo (22/06) sob o mote "Envelhecer LGBT+: Memória, Resistência e Futuro".

Professora Bebel (PT), deputada estadual, animou a plateia pedindo uma vaia para o presidente dos EUA, Donald Trump, que "começou a Terceira Guerra Mundial". A Casa Branca entrou diretamente no conflito contra o Irã na véspera.

A vereadora Amanda Paschoal (PSOL) destacou a importância do tema da parada deste ano. "Envelhecer nesse país é um desafio para todos, mas para a nossa população, que sofre desde a infância, envelhecer é ainda mais desafiador. Mas a gente vai batalhar para que cada um de nós possa ter uma velhice saudável e cheia de brilho."

Guilherme Cortez (PSOL), deputado estadual, subiu ao trio e pediu para que as pessoas batessem o leque para "afastar os homofóbicos, os preconceituosos, bolsonaristas e agressores". Como em outras edições da parada, o leque esta em todos os lados.

A fundadora da ONG Crianças Trans Existem, Thamirys Nunes, também falou. Posicionou-se contra "essa direita que quer falar que os nossos filhos, filhas e filhos não existem".

Pela manhã, já era numeroso o público montado com muito glitter e leques coloridos, mais uma ou outra lingerie. Havia também muitas famílias com seus filhos.

O pastor Filipe Scarcella, 37, celebrava sua primeira Parada LGBTQIAPN+ abraçado com o namorado, após tantos anos indo à Marcha para Jesus.

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Pais e filhos transformam Parada LGBTQIAPN+ em evento de família

Desde 2024, o engenheiro Felipe Dias, 41, e o psiquiatra Fábio Carrara, 44, vão à Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ de São Paulo no pacote família. Nascidos da barriga solidária de uma amiga deles, os gêmeos Miguel e Helena, 2, correm pela avenida Paulista. Perto deles está um homem fantasiado de Ronald McDonald, o palhaço do McDonald's, enquanto uma turma de corredores atravessa a via, um deles com uma caixa de som tocando "I Will Survive".

Este domingo é dia de "honrar o legado de quem veio antes da gente", diz Carrara. "Se eu tava ano passado em família com meu marido, meus filhos aqui, é porque um bocado de gente veio antes de nós e deu a cara a tapa. Muitos morreram, lutaram, foram para o Congresso e adquiriram esse direito por nós".

O tema da Parada em 2025 é "Envelhecer LGBT+: Memória, Resistência e Futuro", o que mexeu com o casal que se conheceu 13 anos atrás, num forró em Belo Horizonte - são o primeiro namorado um do outro.

"O direito de envelhecer veio muito com esse sentimento que tive depois da minha família", afirma Carrara, que acompanha de perto, como psiquiatra, a crise de pacientes LGBTQIAPN+ com idade avançada.

"A gente tem pouquíssimos serviços para a saúde mental voltados à comunidade, que tem alto índice de suicídio, violência, abandono, solidão".

O medo de envelhecer, diz, é comum entre essa parcela da sociedade. "Já tive pacientes na terceira idade com inúmeras tentativas de suicídio." Muitos conseguiram. "A gente não conseguiu conter esse sofrimento para ajudar, sabe?".

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A professora Renata Barbosa, 31, e a coordenadora de logística Daiara Costa, 29, levaram sua bebê Antônia, 11 meses, com uma camiseta onde se lê "forte como a minha mãe".

Estão há 11 anos juntas, depois de se conhecerem "nas baladas da vida". Há três anos, pintou o desejo de serem mães.
Barbosa gestou a criança, que veio por meio de uma fertilização in vitro.

O processo em si foi tranquilo, até rápido. O mesmo não se pode dizer da reação das pessoas à dupla maternidade, inclusive no hospital onde Antônia nasceu. "Como mãe não gestante, preciso me validar o tempo inteiro", afirma Costa.

Sentiu isso já na maternidade: quando tentou entrar, perguntaram quem era ela. A equipe hospitalar havia colocado o pai de Barbosa como pai da neném que viria à luz. O avô de Antônia.

O empresário Roberto Castro, 57, adotou sua filha Maria em 2019, quando ela tinha quatro anos. Em frente ao trio que acolhe famílias LGBTQIAPN+, ele conta que a primeira escola onde pensou em colocar a criança não foi muito receptiva com a ideia de um pai homossexual e solo.

Ele diz que envelhecer na pele paterna o fez ressignificar várias coisas. Antes era "mais desleixado", inclusive arriscando sexo sem proteção. Hoje jamais repetiria algo assim.

"Só por ser gay, as estatísticas já mostram que o sistema de saúde vai ser mais relapso comigo. Ainda tem muito preconceito. Então preciso me cuidar porque eu sou tudo o que Maria tem".

A filha se diverte ao lado com um leque, item que virou símbolo de resistência da comunidade. "São os novos ares", ele brinca sobre o ventinho que Maria produz com o coloridíssimo artefato.