A rentabilidade do crime organizado é maior com a extração e a produção de ouro ilegal do que com o tráfico de cocaína, revelou estudo recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Enquanto polícias Militar, Civil e Federal atuam no dia a dia contra o tráfico internacional de drogas, quem tem atribuição legal para combater garimpeiros é somente a PF.

O combate ao tráfico internacional de drogas na fronteira amazônica do país ocorre diariamente, mesmo que com poucos policiais militares para uma área tão grande. O Amazonas tem 3.870 km de fronteira com Colômbia, Peru e Venezuela. O 8º BPM (Batalhão da Polícia Militar), em Tabatinga, na tríplice fronteira e porta de entrada para drogas no Brasil, conta com 100 PMs para atuar em oito municípios.

Já a extração ilegal de ouro ocorre, principalmente, nas regiões de Japurá e Humaitá. Desde 2014, o governo federal faz ações pontuais contra o garimpo ilegal, por meio da "Operação Ágata". Com apoio de parte da população, que avalia que os garimpeiros ilegais são trabalhadores, ação é contínua na região amazônica.

Ações têm sido feitas para descapitalizar quem atua ilegalmente, segundo a Polícia Federal. Por meio de inteligência artificial, a PF consegue monitorar a movimentação dos garimpeiros. Para além do mercado do ouro, a ação atinge diretamente a população local. O avanço do garimpo aumenta casos de malária e a contaminação dos rios por mercúrio, que eleva a desnutrição. Os garimpeiros também afastam a fauna, que dificultam a caça e a pesca das comunidades. Ainda aumentam casos de crimes como exploração física e sexual de jovens e adolescentes.

Há muitas denúncias de envolvimento de funcionários, seja estadual, seja federal, no garimpo. O combate à exploração do ouro é de atribuição do governo federal. Mas já fizemos algumas fiscalizações. Nossa atribuição vai até o município de Japurá.Major da PM Diego Magalhães, subsecretário de operações do Sistema de Segurança

Corrupção como meio

Uma ação necessária para que o crime organizado tenha sucesso, em todo o mundo, é a corrupção de agentes do Estado. Na região do Japurá, a cada mês dos últimos três anos, a equipe da PM que atua na região é trocada pelo governo, para que se evite cooptação e corrupção.

Nas regiões de garimpo, piratas ligados ao PCC (Primeiro Comando da Capital), a grupos paramilitares colombianos e a agentes do Estado brasileiro também atacam. Os piratas roubam de garimpeiros ouro já extraído, além de combustível e outros itens de valor.

"Quando há alguém do nosso próprio sistema corrompido, não temos problema nenhum de cortar a própria carne", diz secretário. Marcus Vinicius de Almeida confirmou suspeitas sobre agentes públicos, mas atribuiu as dificuldades na segurança do local ao tamanho da região.

Sentimos que o Brasil está de costas para nós. A gente precisa, realmente, de apoio, com mais efetivos da Polícia Federal. Não nos eximimos, mas o fardo é muito pesado para carregarmos sozinhos.Marcus Vinícius de Almeida, secretário de Segurança.

Crimes e liberdade de um conhecido garimpeiro 

Aldaildo Fongher, conhecido como Gringo, é apontado por autoridades da segurança pública federal como um dos maiores garimpeiros ilegais da região Norte. Ele foi investigado por envolvimento em uma extensa rede de exploração ilegal de garimpo na região de Japurá e na região de Jutaí. A polícia chegou até ele após a prisão de um empresário e um PM do Paraná em outubro de 2020, em Ji-Paraná (RO). Pedrinho Marcondes, o empresário, levava consigo 60g de ouro sem documentação, enquanto o policial o acompanhava como segurança.

Dois dias depois da detenção, ambos foram soltos em audiência de custódia. Mas seus aparelhos celulares ficaram resguardados para investigação. Pedrinho e o policial voltaram para o Paraná. Passados mais dois dias, Pedrinho foi assassinado em frente a sua loja de revenda de carros em Curitiba.

Mensagens que estavam no WhatsApp de Pedrinho foram cruciais para a investigação. Por mensagens, ele revelou a pessoas próximas seus passos no Amazonas, incluindo investimentos em dragas e uma sociedade com o Gringo.

As mensagens também indicaram fortes indícios de corrupção, a mando de Gringo. O garimpeiro pagaría propina a policiais e militares, incluindo um coronel do Exército, que passariam informações privilegiadas sobre fiscalizações ambientais. Também foi captado que o grupo garimpeiro apoiou financeiramente um candidato a uma prefeitura do interior do Paraná, que acabou sendo eleito.

As investigações mostraram que Gringo movimentou quantias significativas envolvendo empresas ligadas ao comércio de ouro entre 2019 e 2022. Ele declarou ter recebido valores de atividade extrativista: mineração e lucros/dividendos de uma distribuidora de títulos e valores mobiliários que atua no mercado de ouro, apesar de não possuir autorização legal para a extração.

Ele nega os crimes. Chegou a ser preso, mas recebeu alvará de soltura assinado por um desembargador do Amazonas em julho de 2023. "Não se apontou, contudo, qual o comportamento ou conduta do paciente que autoriza dita suposição. Não se indicou qual o fato concreto que permita semelhante conclusão", escreveu o magistrado.