Pernambuco

Mãe de Miguel pede punição: 'antes disso, perdoar seria matar Miguel novamente'

Menino de cinco anos morreu ao cair de edifício em Recife, quando estava sob os cuidados da patroa da mãe

Por Estadão Conteúdo
Publicado em 10 de junho de 2020 | 17:20
 
 
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A empregada doméstica Mirtes Renata Santana de Souza, mãe de Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, que morreu na semana passada ao cair do nono andar de um prédio do Condomínio do Edifício Pier Maurício de Nassau, no centro do Recife, escreveu uma carta para a então patroa, Sarí Corte Real, indiciada na morte do menino por homicídio culposo. A carta, que também foi enviada à imprensa na manhã desta quarta-feira, 10, é uma resposta a um pedido de desculpas feito por Sarí anteriormente e enviado à imprensa na última sexta-feira, 5.

"Eu não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição", afirmou Mirtes Renata no início do texto, fazendo referência à prefeitura de Tamandaré, município do litoral sul pernambucano cujo prefeito é o marido de Sarí Corte Real, Sérgio Hacker (PSB)

O texto, que foi escrito com ajuda do advogado Rodrigo Almendra, afirma ainda considerar desumano o pedido de desculpas feito por Sarí: "sabemos que ela não trataria assim o filho de uma amiga. Ela agiu assim com o meu filho, como se ele tivesse menos valor, como se ele pudesse sofrer qualquer tipo de violência por ser filho da empregada".

De acordo com o advogado Rodrigo Almendra, a carta foi entregue na manhã desta quarta-feira aos advogados de Sarí Corte Real e, em seguida, enviada à imprensa para informar o posicionamento de Mirtes Renata.

Ainda nesta quarta-feira, 10, o zelador do condomínio do Edifício Pier Maurício de Nassau, conhecido como Torres Gêmeas, que teria informado à empregada doméstica que alguém havia caído do nono andar, prestou depoimento ao delegado responsável pelo caso, Ramon Teixeira. Nenhum dos dois falou com a imprensa. Segundo a assessoria de comunicação da Polícia Civil de Pernambuco, a instituição só vai se pronunciar ao fim do inquérito policial.

Pedido de desculpas

Na última sexta-feira, 5, a primeira-dama de Tamandaré e ex-patroa de Mirtes Renata, Sarí Corte Real, escreveu uma carta na qual pedia perdão à Mirtes pela morte do seu filho, Miguel Santana, de apenas 5 anos. A carta foi divulgada pelo advogado de Sarí e enviada à imprensa pela assessoria de comunicação de Tamandaré, que fica a cerca de 109 km do Recife. "Sou absolutamente solidária ao seu sofrimento. (...) Te peço perdão"

Na terça-feira, 2, Miguel Santana ficou sob os cuidados de Sarí Corte Real enquanto sua mãe, Mirtes Renata, passeava com a cadela da patroa. O menino, porém, pegou o elevador sozinho e caiu do nono andar do edifício. Imagens mostram que Sarí deixou o garoto no equipamento e apertou o botão de um andar superior. A Polícia Civil investiga a primeira-dama por homicídio culposo

Leia a carta de Mirtes Renata na íntegra:

SOBRE O PERDÃO PEDIDO POR SARI

Eu não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição.

Eu não tenho rancor. Tenho saudade do meu filho. O sentido da vida de quem e´ mãe passa pelo cheiro do cabelo do filho ao acordar, pelo sorriso nas suas brincadeiras, pelo "mamãe" quando precisa do colo e do abrigo de quem o trouxe ao mundo. Uma mãe, sem seu filho, sofre uma crise, não apenas de identidade, como também de existência. Quem sou eu sem Miguel? Ela tirou de mim o meu neguinho, minha vida, por quem eu trabalhava e acordava todos os dias.

Quando eu grito que quero justiça, isso significa que eu preciso que alguém assuma a minha dor, lute minha luta, seja o destilado da cólera que eu não quero e nem posso ser. Eu não tenho forças neste momento, não tenho chão. Não tenho vida!

Após poucos dias é desumano cobrar perdão de uma mãe que perdeu o filho dessa forma tão desprezível. Afinal, sabemos que ela não trataria assim o filho de uma amiga. Ela agiu assim com o meu filho, como se ele tivesse menos valor, como se ele pudesse sofrer qualquer tipo de violência por ser "filho da empregada".

Perdoar pressupõe punição; do contrário, não há perdão, senão condescendência. A aplicação de uma pena será libertadora, abrandará o meu sofrimento, permitirá o meu recomeço e abrirá espaço para o que foi pedido: perdão. Antes disso, perdoar seria matar o Miguel novamente.

Mirtes, mãe de Miguel

(carta escrita com auxílio do advogado constituído)

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