Roupas, enxoval de bebês, produtos de telecomunicação, brinquedos, material esportivo, bibelôs, produtos de limpeza, encanamento, eletrônicos, EPIs, malas, calçados. Produtos variados, resultados do esforço de cerca de 18 mil detentos de Minas Gerais e que foram destaque em uma mostra de produtos nesta sexta-feira (14), na Cidade Administrativa, em Belo Horizonte. O material representa a luta dos apenados pela ressocialização com dignidade, por meio do programa Polícia Penal Além dos Muros.

O projeto busca parcerias com empresas que têm interesse em investir na mão de obra de pessoas que cumprem pena em Minas. Firmado o acordo, o empresário pode montar uma fábrica de produtos dentro do presídio ou convocar presos do regime semiaberto a atuar fora da unidade prisional. Vantagens tanto para o detento quanto para o administrador da empresa.

“O empresário tem uma redução de custos, não paga aluguel, pois já temos nosso galpão de trabalho, não paga água e luz, tem desconto de ICMS. Sem contar que não tem vínculo CLT, pois o preso é regido pela Lei de Execução Penal”, detalha o diretor de trabalho e produção do Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen-MG), Paulo Duarte.

Os detentos que integram o projeto ganham por mês três quartos de um salário mínimo. Desse montante, 50% vai para a família do detento, outros 25% vão para o estado como ressarcimento e os 25% restantes se tornam uma poupança para o apenado sacar quando deixar a cadeia. Porém, muito além da renda, o projeto colabora para mudar vidas e trazer dignidade a quem busca uma chance de recomeçar.

“Tem internos hoje que entram sem nem saber uma profissão. Então ele é qualificado, profissionalizado e já sai até com currículo nas próprias empresas. Aqueles que querem já saem empregados. O trabalho e o ensino fazem a pessoa sair diferente”, argumenta.

 

Brinquedos estão entre os produtos fabricados por detentos de MG no programa Polícia Penal Além dos Muros. Créditos: Videopress Produtora

 

Minas Gerais se destaca no trabalho prisional

A exposição de produtos desta sexta-feira (14) veio em comemoração à conquista do Selo Nacional de Responsabilidade Social pelo Trabalho no Sistema Prisional - Selo Destaca. O prêmio, promovido pela Secretaria Nacional de Políticas Penais, (Senappen), busca reconhecer o bom trabalho de empresários que investem na mão de obra de detentos no Brasil.

Das 433 empresas do país aptas a receber a certificação nesta edição, 233- mais da metade (57%) - são de Minas Gerais. 
“É muito gratificante, a gente vê que estamos fazendo um trabalho de sucesso. Não só nós como policiais penais, mas também o preso. São 18 mil pessoas que têm oportunidade de sair e exercer uma atividade lá fora”, comemora Paulo Duarte.

Antes da exposição de produtos, houve uma cerimônia na qual 99 dos 233 empresários parceiros premiados receberam do Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen-MG) o Selo Nacional de Responsabilidade Social pelo Trabalho no Sistema Penal – o Selo Resgata. Eles atenderam aos critérios para conquistarem o 5º Ciclo de Concessão do Selo Resgata. Entre eles, estava a empresária Ismênia Alves, de 42 anos.

Ela é sócia da empresa Ivitech, que faz o intermédio para que outras possam investir nos detentos como mão de obra. Uma delas emprega cerca de 25 apenados na penitenciária Nelson Hungria, em Contagem, na Grande BH, para produzir caixas de emendas, usadas em postes de telecomunicação. São cerca de sete mil unidades produzidas por mês, que são distribuídas em todo o Brasil.

A empreendedora começou a investir nas unidades prisionais em 2016, com o desejo de ajudar a mudar vidas. “Essas pessoas um dia vão retornar para sociedade. Se a gente não olhar para isso, o que a gente vai ter? Quem está ali com você trabalhando amanhã vai encontrar com você na rua, e reencontrar essa pessoa transformada faz muita diferença”, argumenta a empresária, que garante: uma oportunidade pode se decisiva na mudança de vidas, principalmente para jovens.

“Muitos chegam com escolaridade só até a 8ª série, com 13 anos já fazem a evasão escolar e são abraçados pela criminalidade. Quando eles encontram essas oficinas, muitos dizem que nunca tiveram trabalho. O trabalho no sistema serve para ensinar essas pessoas a terem rotina, respeitarem regras, vai muito além da produção”, pontua.

Sócia da empresa Grão de Gente, que produz bolsas e enxovais de bebê, a administradora de empresas Suellen Carvalho, de 38 anos, começou a atuação no sistema prisional mineiro em janeiro de 2022, após a sede da empresa se mudar de São Paulo para Minas. Com o desejo de abrir uma fábrica no estado, ela recebeu a sugestão de investir nas unidades prisionais. Após um estudo de viabilidade, ela decidiu apostar na mão de obra dos apenados e não se arrependeu.

“Nos apaixonamos por esse projeto, os detentos trabalham com qualidade, apreço, vontade, a produtividade é boa, eles são superinteressados em aprender”, diz a empresária, que já planeja aumentar a atuação em Minas Gerais. Atualmente, a fábrica dela atua na unidade prisional de Itajubá, no Sul de Minas, e produz 10 mil unidades por mês, que vão para todo o Brasil e até para o exterior, via e-commerce.

Suellen recomenda muito que outros empresários invistam nos detentos como trabalhadores. “Parece um pouco difícil, porque não tem muita divulgação, mas é possível e é supergratificante”, elogia.