Em horários de congestionamentos, o belo-horizontino demora uma média de 57 minutos para percorrer 10 quilômetros. Para se ter uma ideia, essa é a distância que separa o início da avenida Cristiano Machado (perto do Túnel Presidente Tancredo Neves, o Túnel da Lagoinha) da estação Floramar. O tempo gasto em BH é o segundo maior em horários de pico (manhã e início da noite) na comparação entre os congestionamentos das principais capitais do país — só perde para Recife, onde o período para percorrer 10 km, nos horários de pico, é de 58 minutos.
Os minutos “perdidos” em congestionamentos na capital mineira são os mesmos daqueles despendidos por motoristas de São Paulo. É isso mesmo: para dirigir 10 quilômetros às 18h, o condutor demora uma média de 57 minutos em BH ou em SP. Os dados são da pesquisa TOMTOM Brazil Traffic e foram disponibilizados e analisados na Pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana 2024, divulgada nesta quarta-feira (7 de agosto).
O estudo mostra que, nos momentos de mais movimento nas vias, o tempo gasto para percorrer 10 quilômetros é 90% superior aos períodos despendidos em horários de trânsito com maior fluidez nas capitais do país. Em Belo Horizonte, o cenário é ainda pior. O tempo “perdido” para percorrer 10 quilômetros em horários de pico chega a ser 103,57% maior do que aquele registrado em momentos mais tranquilos — o tempo para percorrer a mesma distância passa de 28 minutos para 57 minutos.
Especialista em trânsito, Silvestre Andrade explica que o motivo tem relação com o grande número de veículos e a “pobreza” do sistema viário. De fato, o número de carros na capital supera o número de habitantes. Conforme dados do censo do IBGE e da BHTrans, em 2022, BH tinha 2.315.560 pessoas para 2.472.606 veículos.
“Temos uma frota muito grande. Além disso, Belo Horizonte é uma cidade relativamente pequena, quando comparada com o Rio de Janeiro e São Paulo. Já o sistema viário é bastante restrito: a única via expressa é o Anel Rodoviário, que nem é avenida e sim uma rodovia. Em São Paulo há marginais e a Washington Luís, de trânsito rápido. Em BH, não há vias equivalentes e qualquer corredor é chamado de via expressa (mesmo tendo semáforos e restrições que impedem o fluxo mais contínuo). É difícil equilibrar alta demanda com uma oferta limitada, o que acaba gerando congestionamentos. Há ainda problemas do dia a dia, como acidentes e incidentes, que contribuem para mais congestionamentos”, analisou o especialista.
Congestionamentos “sufocam” motoristas
A motorista de aplicativo Graice Viviane Souza, de 47 anos, é prova de que os congestionamentos da capital mineira são testes para a paciência e até para a saúde dos motoristas. Na última terça-feira (6), ela atestou a demora de mais de 100% do tempo para percorrer um trajeto. Por volta das 19h, ela demorou 57 minutos para realizar uma corrida de 14 quilômetros entre o Belvedere, na região Centro-Sul, e o Glória, na região Noroeste. De acordo com estimativa de um aplicativo de mobilidade, o mesmo trajeto poderia ser feito em 23 minutos em um horário no qual o trânsito tem mais fluidez (às 21h30, por exemplo). “É muito trânsito. Os passageiros mesmo reclamam”, conta.
Graice explica que, para driblar o trânsito, ela evita, quando pode, vias de grande fluxo, como as avenidas Amazonas, Cristiano Machado, Antônio Carlos e Raja Gabáglia. “O ideal seria que as grandes vias fossem de melhor acesso, de trânsito mais rápido. Mas em Belo Horizonte é o contrário. Eu preciso fugir delas”, analisa a mulher, que trabalha como motorista de aplicativo há três anos. Ela cita o grande fluxo de veículos nas ruas da capital mineira e despreparo dos condutores para lidar com esse volume.
“Aumentou muito a frota de veículos, mas os próprios motoristas não estão preparados para isso. Eles agem com desrespeito, com imprudência. Os motoristas estão intolerantes, justamente por isso, porque aumentou a frota e os próprios motoristas não estão sabendo lidar com esse fluxo. Eu acho que tinha que ter uma educação preventiva em relação ao trânsito para evitar acidentes, evitar brigas de trânsito, evitar essa intolerância”, analisa.
Investimento em transporte público é alternativa
Silvestre Andrade considera que o investimento em um transporte público de qualidade é a melhor saída para reduzir o tempo e o estresse perdidos nos congestionamentos. “Precisamos de um transporte público de qualidade. Atualmente, temos apenas uma linha de metrô, mas deveríamos ter mais. Outros meios, como o BRT Move, que tem prioridade no trânsito e não entra nos congestionamentos, são necessários. É necessário investir no transporte público para torná-lo atrativo para o usuário” considera.
Outras alternativas como o rodízio, adotado em São Paulo, e os pedágios urbanos, que existem em Londres, Singapura e Estocolmo, podem ser saídas, conforme Silvestre, para reduzir o tráfego. O especialista não vê como saída viável para Belo Horizonte a construção de vias, já que essa alternativa esbarra em dificuldades como desapropriações, entre outras.