O Hospital da Baleia, localizado na região Centro-Sul de Belo Horizonte, tem mantido a taxa de ocupação de leitos praticamente no limite desde que a demanda por cirurgias ortopédicas de urgência triplicou na capital, sobrecarregando o Sistema Único de Saúde (SUS-BH) e causando superlotação nos prontos-socorros – como no Risoleta Neves, que ficou mais de 24 horas com atendimentos interrompidos. A unidade é considerada estratégica para o Plano de Contingência aplicado pela prefeitura, no qual os procedimentos eletivos – que, segundo avaliação médica, podem ser agendados – foram suspensos até a próxima quarta-feira (5 de fevereiro). Na lista dos sete hospitais de apoio que estão ampliando os atendimentos de urgência, a força-tarefa da equipe assistencial do Baleia tem desafogado cerca de 20 casos graves por dia, o que representa 20% da demanda da cidade. Essa é uma responsabilidade assumida pela unidade menos de nove meses após se tornar 100% SUS, em junho do ano passado. 

O Hospital da Baleia passou por uma ampliação recente de leitos, como parte do aperfeiçoamento para integrar a rede pública. Atualmente, a unidade conta com 210 leitos de internação, dos quais cerca de 197 são ocupados diariamente por pacientes encaminhados pela regulação do SUS. Na avaliação do Superintendente Técnico, Samar Musse Dib, o hospital está dedicando toda a sua capacidade para aliviar a sobrecarga assistencial em Belo Horizonte. “Quando há um grande volume na fila da Secretaria [de Saúde], a solicitação para nós é de apoio. Pediram para avaliarmos a possibilidade de aumento de leitos para dar retaguarda a essa demanda. Hoje, trabalhamos com uma taxa de ocupação alta, na média de 94-97%. O plano é ampliar o número de leitos no médio e longo prazo, a depender de verba. No momento, chegamos no nosso limite”, afirma Musse Dib.

A expansão dos leitos, o que aumentaria o número de vagas na rede SUS-BH e ajudaria a reduzir sobrecargas – como o aumento de 233% nas vítimas de acidentes de trânsito neste início de ano –, ainda não tem previsão para acontecer. Conforme o superintendente, tudo depende do projeto de ampliação. O hospital diz que não consegue adiantar um valor médio necessário para a compra das internações. “Para trabalhar com o SUS, é preciso operar em escala. Quanto maior o hospital, maior a sustentabilidade financeira, pois ele consegue otimizar melhor o atendimento. Agora, precisamos de verba financeira para o Baleia, pois o hospital tem cinco prédios e é possível viabilizar essa expansão. Queremos oferecer atendimento de qualidade ao SUS”, acrescentou.


O Superintendente Técnico do hospital da Baleia, Samar Musse Dib / Foto: Alex de Jesus

Médicos e equipe assistencial multiplicam atendimentos para desafogar SUS

Samar Musse Dib explica que, durante o Plano de Contingência, a equipe médica e assistencial está empenhada em realizar o maior número possível de cirurgias ortopédicas de urgência por dia. Em períodos de normalidade, o Hospital da Baleia opera com uma média de 60% de urgências (como fraturas expostas e comprometimentos de nervos) e 40% de cirurgias eletivas (como prótese de joelho ou hérnia de disco). Até o dia 5 de fevereiro, no entanto, o volume de procedimentos diários de urgência salta de 12 para mais de 20 cirurgias por dia.

Com retenção de cirurgias no SUS-BH, Hospital da Baleia faz força-tarefa e mantém leitos no limite

“A gente pede uma força-tarefa da equipe para ajudar a Secretaria de Saúde a dar vazão a esses casos. De acordo com a demanda do município, em acordo com o corpo clínico e os cirurgiões, combinamos aumentar dois ou três casos a mais por dia. Pactuamos com as especialidades, como cirurgião de quadril, de joelho, etc. A rotina segue a mesma, mas com um aumento no volume cirúrgico. Se são 20 cirurgias diárias, alguns dias chegamos a 24 ou 27 casos, dependendo do porte dos procedimentos”, detalha Musse Dib.

O superintendente reforça que o Baleia consegue otimizar os casos porque tem um tempo de internação curto, de dois a sete dias. Durante o Plano de Contingência, o empenho está em aumentar a desospitalização, de forma segura. De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, a média de internações ortopédicas de urgência diárias deveria ser de 30. No entanto, nos primeiros 20 dias de janeiro, esse número chegou a 100 (alta de 233%). 

Paciente do Baleia, em urgência há 101 dias, não pode ter tratamento interrompido

A auxiliar administrativa Fernanda de Nazareth Alves Vitorino, de 25 anos, está há 101 dias em estado de saúde crítico, com uma gaiola na perna esquerda e tratando a perda de parte do osso. Vítima de um acidente de trânsito em outubro do ano passado, a mineira viaja 260 km de Cristais, na região Centro-Oeste de Minas, até o Hospital da Baleia, em Belo Horizonte, algumas vezes por mês para dar continuidade ao tratamento. Casos como o de Fernanda, apesar de se estenderem por meses, são urgentes e inadiáveis, pois ela não pode esperar para avançar nas cirurgias – principalmente agora, que está em processo de inserção de enxerto com os cirurgiões do Baleia. Ela faz parte dos pacientes que devem ser priorizados durante o Plano de Contingência.

"Eu estava na garupa da moto, quando ela foi atingida por um carro. Quebrei a tíbia e a fíbula e estou com fratura exposta. Fiquei internada no CTI por 20 dias, ainda na minha região. Depois, graças a Deus, melhorei e fui encaminhada para o Baleia", relata Fernanda sobre sua trajetória. A urgência atual da jovem é que ela não pode perder a pele do enxerto de recomposição óssea. "É uma ferida bem feiosa", brinca. "Preciso manter o cronograma médico, é uma prioridade agora. Estou sem uma parte do osso da perna", continua.


A paciente Fernanda de Nazareth, de 25 anos / Foto: Alex de Jesus

Ao lado da mãe, na ala de internação, Fernanda destaca o valor do atendimento, que tem sido totalmente prestado pelo SUS. Desde que voltou a internar, neste início de ano, tem percebido mais pacientes com problemas semelhantes ao dela. "Tem tido muito, principalmente de acidente de moto. Esses dias, troquei figurinhas sobre o tratamento com outro jovem que sofreu acidente. É difícil, o tratamento é longo. Essa cirurgia que fiz, Ilizarov, se for pesquisar, o preço é um absurdo para colocar esse equipamento para crescer o osso. Então, pelo SUS, sem cobrar nada, é uma graça de Deus", agradeceu.

Fernanda ainda precisa passar por pelo menos mais duas cirurgias. A previsão para que ela possa retirar a gaiola é para mais um ano.

Entenda o problema 

O bloqueio das cirurgias ortopédicas eletivas – como prótese de joelho ou tratamento de hérnia de disco – é parte do Plano de Contingência do SUS-BH para lidar com a alta de 233% no número de demandas de urgências, em maioria, de vítimas de acidentes de trânsito. De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, a média de internações ortopédicas de urgência diárias deveria ser de 30. No entanto, nos primeiros 20 dias de janeiro, esse número chegou a 100. 

Por isso, foram bloqueadas as cirurgias eletivas que, segundo indicação médica, podem ser agendadas, para ampliar a assistência de casos urgentes. A previsão é de que a suspensão dure até 5 de fevereiro em sete hospitais: Baleia, Clínicas, Evangélico, Metropolitano Doutor Célio de Castro, São Francisco de Assis (Unidade Santa Lúcia), Santa Casa de Belo Horizonte e Faculdade de Ciências Médicas.

Sobrecarga no Risoleta Neves

A alta demanda tem sobrecarregado as unidades de saúde. O Hospital Risoleta Tolentino Neves, um dos principais pronto-socorros da cidade, anunciou na quarta-feira (22) que não possuía condições estruturais para receber novos pacientes devido à superlotação. De forma emergencial, a unidade interrompeu o atendimento a novos pacientes, mesmo sendo porta-aberta 24 horas. 

Apesar da reabertura do pronto-socorro na quinta-feira (23), o atendimento no Hospital Risoleta Neves continua acima do limite assistencial. De acordo com a direção do hospital, a Central de Internação realizou várias transferências de pacientes para outras unidades de saúde da capital. Ainda assim, na sexta-feira (24), a unidade registrou 125 pacientes admitidos, enquanto a capacidade ideal é de 90.