Nas camisas, nos turbantes, nas pulseiras, nas calças, bermudas, saias e nas flores. Foi de várias formas que a cor branca tomou conta da praça Iemanjá, na Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte, na tarde deste domingo (2). E a homenageada do dia tinha o mesmo nome da praça: Iemanjá. Assista a celebração:

A Grande Mãe dos Peixes foi homenageada no o 12º Presente Ecológico de Iemanjá, evento anualmente realizado no dia 2 de fevereiro, em diversos locais do país. O evento tem diversos focos. Um deles é agradecer a Iemanjá e devolver a energia utilizada durante todos os ritos litúrgicos nos terreiros de candomblé.

"Estamos aqui para agradecer. A gente recebe muita coisa. Só de estar aqui com saúde física e mental, é uma forma de agradecimento", explica a mãe de santo da Nzo Jindanji Kuna Nkosi e diretora litúrgica do Afoxé Bandarê, Nengua Monasanje. 

O rito, basicamente, começa com uma roda de dança, conduzida por uma música ao ritmo de tambores, trompetes e agogô. A voz do público também se torna um instrumento nos cânticos. O rito termina com a colocação de um balaio com um presente ecológico na Lagoa da Pampulha, bem no meio da lagoa. 

Nengua Monasange, líder religiosa da cerimônia, reforça a importância de um presente ecológico. "Temos que presentear Iemanjá pensando nisso também. Precisamos de nossas águas limpas, ninguém vai querer águas sujas", argumenta.

Nengua também afirma que o evento também é um ato de resistência contra o preconceito que existe contra as religiões de matizes africanas. "Não temos nada a esconder, nem a temer, temos livre arbítrio. Só vem quem tem fé. E quem não tem essa mesma fé não precisa agredir o outro", ensina.

Pertencimento e fortaleza

Participando do evento, a vendedora Ana Carolina Santiago, de 19 anos, realizou um sonho de anos. Foi a primeira vez dela no 12° Presente Ecológico de Iemanjá. A jovem conta que, se não fosse o preconceito religioso que sofreu dentro da própria casa, ela teria prestigiado o evento outras vezes.

"Antes eu era católica, fiquei quatro anos como coroinha, mas ia a alguns terreiros de candomblé. Quando meu pai descobriu que eu ia a terreiros, ele disse que se eu continuasse, ia me expulsar de casa. Eu parei de ir, mas eu sempre falo que quando você vai pela primeira vez, eles nunca mais te abandonam", relata.

Apesar de ter se inserido mais no candomblé a pouco tempo, a jovem garante que esse é o seu lugar. "Meus olhos marejam só de falar. É aqui que eu me encontro, é algo que me faz muito bem. Eu anseio pela chegada das terças-feiras, que é o dia em que vou à minha casa", declara.

Quem ajudou Ana Carolina a retornar ao candomblé foi a namorada da jovem, a profissional de vendas Sophie Suzane, de 23 anos. Apesar de ter um familiar que sempre professou sua fé em Iemanjá, ela também conviveu com o preconceito dentro do lar e admite que, por um bom tempo, ela própria foi dominada por ele.

"A minha família por parte de mãe era um mais preconceituosa. Eu fui criada numa família cardecista e uma parte evangélica, então quando eu ia visitar o terreiro com o meu pai, que é de candomblé, era uma coisa absurda para mim, era uma coisa que não fazia sentido. Eu já tinha algumas sensações de carinho lá, mas eu tentava reprimir essas sensações de carinho, justamente por conta do preconceito que enfiaram na minha cabeça", revela a jovem, que, através do contato com o mar, abriu o coração e abraçou em definitivo a religião.

Hoje, diz Sophie, Iemanjá é uma fonte de alento e de força para que ela enfrente o dia a dia. "Este dia de hoje representa quem nós somos, quem nos levanta todo dia. A nossa fé representa a nossa cultura e representa uma longa luta. Iemanjá é minha mãe. Não tem hoje uma pessoa mais importante na minha vida que ela. Foi quem me tirou do fundo do pocó, quem me fez feliz, me trouxe alegria e me ensinou que viver é sofrer e ser feliz também, ao mesmo tempo", afirma.