A Polícia Civil confirmou, nesta quarta-feira (27 de agosto), que o botulismo foi a causa da morte de uma idosa e da intoxicação de outras duas da mesma família após, em abril deste ano, eles comerem uma torta de frango de uma padaria do bairro Serrano, na região da Pampulha, em Belo Horizonte. A doença grave, causada pela bactéria Clostridium botulinum, registrou em seis meses de 2025 um aumento de 50% em comparação com os registros de todo o ano passado.
De acordo com o painel de casos confirmados de botulismo da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), até 4 de julho de 2025 o Estado recebeu seis notificações para a doença. Além de superar os quatro casos de 2024, este ano já se equipara ao ano de 2022, quando Minas registrou o maior número de casos de intoxicação pela bactéria dos últimos 10 anos.
Formado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade de São Paulo (USP), o doutor em química Egon Campos dos Santos explica que a toxina botulínica, produzida pela bactéria, é altamente perigosa à saúde humana. O microrganismo pode estar presente em alimentos em conserva, como palmito, compotas e produtos de origem animal conservados de maneira irregular.
“Ela (toxina) bloqueia a liberação de acetilcolina nas terminações nervosas, causando paralisia muscular progressiva que, se atingir os músculos respiratórios e não for tratada rapidamente, pode ser fatal”, detalha o especialista. Apesar de largamente utilizada por médicos e dentistas para fins estéticos, no famoso "Botox", a substância deve ser aplicada localmente, pois, se cair na corrente sanguínea, pode causar a morte por falta de ar.
Segundo o Ministério da Saúde, o botulismo é uma doença "neuroparalítica grave, rara e não contagiosa". "O agente etiológico (bactéria) entra no organismo por meio de ferimentos ou pela ingestão de alimentos contaminados que não têm produção e/ou conservação adequada. Sua notificação é compulsória e imediata (em até 24 horas), para que as ações de vigilância sejam realizadas a tempo de prevenir outros casos. A doença pode levar à morte por paralisia da musculatura respiratória", alerta.
A conclusão do inquérito
Durante coletiva realizada nesta quarta-feira, a Polícia Civil anunciou que o inquérito terminou com o indiciamento do padeiro e do dono da padaria onde foi feita a torta de frango que causou a intoxicação das três pessoas. Eles vão responder por homicídio culposo (quando não há intenção de matar), lesão corporal grave e, ainda, pela venda de produtos impróprios para consumo.
Nas investigações, a Polícia Civil concluiu ainda que a intoxicação alimentar resultou na morte de uma senhora de 75 anos e deixou o casal de sobrinhos dela, de 23 e 24 anos, com sequelas.
Segundo a delegada Elyenni Celida da Silva, responsável pela apuração, para constatar a intoxicação bacteriana foi necessária a atuação de uma junta médica formada por profissionais que atenderam os pacientes, além de outros especialistas. Também foram considerados estudos baseados nos laudos e relatórios médicos das três vítimas, 22 oitivas e o apoio da Vigilância Epidemiológica do Estado, do Ministério da Saúde e da Secretaria de Saúde de Minas. “O principal critério decisivo para afirmar que houve intoxicação foi clínico-epidemiológico, ou seja, os sintomas apresentados pelas três vítimas”, concluiu.
De acordo com as investigações, a padaria não tinha nenhuma licença da prefeitura e alvará de funcionamento. A delegada afirmou ainda que a padaria não tinha nenhuma preocupação com as condições de higiene no armazenamento, produção e manipulação dos alimentos que eram vendidos. "Os alimentos não estavam devidamente acondicionados, alimentos crus com já fabricados, destampados, sem condições de refrigeração adequada; tinha até carne com verdura junto", concluiu.
O proprietário da padaria e o padeiro vão responder por três crimes: lesão corporal, homicídio culposo (quando não há intenção de matar) e por vender alimentos impróprios para o consumo.
O padeiro e o dono da padaria onde foi feita a torta de frango que causou a intoxicação de três pessoas foram indiciados pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) e vão responder por homicídio culposo, lesão corporal grave e por vender produtos impróprios para consumo. A Polícia… pic.twitter.com/8i4X0LBrvo
— O Tempo (@otempo) August 27, 2025
Detalhes da investigação
O caso ocorreu em uma padaria no bairro Serrano no dia 21 abril de 2025. Cleuza Maria de Jesus Dias, de 75 anos, morreu após ficar mais de um mês em coma. Além dela, também foram intoxicados o casal de sobrinhos, Fernanda Isabella de Morais Nogueira, de 23 anos e José Vitor Carrillo Reis, de 24.
O casal de 23 e 24 anos, veio de Sete Lagoas, na região Central de Minas Gerais, para visitar a tia. Eles foram no dia 21 de abril de 2025 até a padaria, onde compraram uma torta de frango e levaram para a casa da idosa.
Segundo as investigações, assim que abriram a torta para comer, eles sentiram um cheiro forte, sendo que o casal só experimentou, enquanto a idosa comeu um pedaço maior do alimento. Desconfiados, eles devolveram o produto na padaria, que jogou fora a torta e ressarciu os clientes.
Nesse mesmo dia, os sobrinhos voltaram para Sete Lagoas e começaram a passar mal. Eles foram para o hospital da cidade no dia seguinte e logo foram transferidos para Belo Horizonte. Enquanto isso, em Belo Horizonte, a idosa também passou mal em casa e teve que ir de ambulância para o Hospital, já em estado de coma.
O casal ficou com sequelas graves por causa da intoxicação. "Eles apresentam dificuldade de visão, dificuldade neurológica em relação a coordenação motora e motora fina, dificuldade para caminhar e desempenhar atividades diárias", relatou a delegada Elyenni.
Defesa do padeiro
Em nota à imprensa, o advogado de defesa do padeiro disse que recebeu com profunda surpresa e tristeza a notícia de seu indiciamento ressaltando que ele estava no local há apenas 5 dias.
"É impossível não reconhecer a dor da família que perdeu um ente querido e a difícil situação das pessoas que ainda sofrem com sequelas. Nosso cliente se solidariza sinceramente com todos. No entanto, é preciso esclarecer que o Sr. Ronaldo é um recém-contratado, sem carteira assinada, sem qualquer autonomia sobre a estrutura ou as condições de funcionamento da padaria. Sua função se limitava ao preparo dos alimentos, confiando que o ambiente oferecido por seus empregadores era adequado", concluiu dizendo que espera que no curso do processo judicial, fique provado que ele não contribuiu para o resultado trágico.