O antibiótico recomendado na Upa de São João del-Rei, no Campo das Vertentes, para tratamento de infecção de crianças – em meio ao susto de contaminação pela bactéria Streptococcus – está em falta nas farmácias do Sistema Único de Saúde (SUS) da cidade. Na Upa, está sendo receitado o medicamento amoxicilina com clavulanato para as crianças que são atendidas com dor de garganta, febre, vômitos e manchas na pele, sintomas que podem indicar Streptococcus. Mas, quando as famílias procuram a Farmácia Básica, voltam para trás, sem conseguir o antibiótico.
A informação foi confirmada pela reportagem em contato com as farmácias de dispensa do SUS em São João del-Rei, uma no Centro da cidade e outra no bairro Matosinhos. Segundo a equipe de saúde, além do antibiótico estar em falta, não há expectativa de renovação de estoque, uma vez que não foi feita compra. Na unidade do Centro, a informação é que não há amoxicilina com clavulanato há cerca de três meses.
Nas farmácias, a opção disponível é de amoxicilina simples. Mas, além do efeito ser diferente, as famílias não podem apenas retirar este medicamento: são orientadas a voltar ao médico e mudar a receita. Três mortes de crianças, uma de três e duas de 10 anos, além da internação de outras quatro, são investigadas em São João del-Rei por suposta contaminação pela bactéria Streptococcus.
Mães carentes contam com doação de rede de apoio para conseguir antibiótico
A voluntária Míriam Lúcia Nascimento, de 45 anos, motivou uma vaquinha para que uma criança de seis anos conseguisse o antibiótico recomendado. Com febre, vomitando e com marcas no corpo, a menina ficou com a mãe na Upa da cidade por cerca de oito horas nessa quarta-feira (25 de outubro). A família recebeu a receita para tratamento com o antibiótico amoxicilina com clavulanato, mas logo teve a notícia da impossibilidade de retirá-lo pelo SUS. Foi aí que surgiu a força-tarefa da comunidade para que o remédio fosse comprado.
“Essa mãe me procurou, porque sou referência na Igreja. Ela não teve nem dinheiro para pedir um carro até a Upa, já que a menina estava vomitando e com caroço no corpo, e foi a pé. Imagine comprar o remédio”, lamenta Míriam. Ela conta que, assim que a família saiu com a receita da Upa, já às 23h dessa quarta (25), ela procurou por profissionais da Farmácia Básica e soube que teria que comprar o medicamento. A comunidade se juntou e reuniu cerca de R$ 80 para que a menina iniciasse o tratamento.
“Eu sou mãe de filhos já crescidos, então estou mais tranquila. Mas sei o que essas mães estão passando, com medo dessa bactéria. Eu tenho médico na família, mas e quem não tem? Quem sofre mais são as mais carentes, que não têm como comprar o tratamento”, diz a voluntária. “O Governo diz que não tem com o que se preocupar, mas já morreram três crianças, vão esperar morrer mais quantas?”, continua.
A reportagem procurou a Prefeitura de São João del-Rei e aguarda retorno. A Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) também foi procurada, e informou, por nota, que os antibióticos são medicamentos padronizados no Componente Básico da Assistência Farmacêutica (CBAF), "cuja gestão do recurso financeiro e aquisição compete aos municípios".
"Nesse sentido, para informações sobre a possível indisponibilidade destes medicamentos a apuração deve ser feita junto ao município de interesse", completou.
Mães protestaram por pediatras
Dezenas de mães manifestaram em frente à Upa São João del-Rei na noite dessa quarta-feira (25 de outubro). Segurando placas com o escrito ‘Plantão Pediátrico’ e balões da cor preta, as mulheres gritaram por um reforço médico na Upa, que é indicada como referência caso as crianças apresentem sintomas de dor de garganta, vômitos, febre e manchas na pele – características da bactéria Streptococcus. Segundo uma das manifestantes, a contadora Ana Maria Hilário Fiche, de 45, falta médicos e equipamentos na única Upa de São João del-Rei.
Entenda os casos
Andreia Pereira Donato, de 43 anos, é uma das mães que fizeram uma manifestação nesta terça-feira (24 de outubro), em frente à Prefeitura de São João del-Rei. A mulher afirma que tudo começou há pouco mais de um mês, quando um menino, de 10, passou mal na escola com dor de garganta e vômito.
Ele foi levado a Upa da cidade, onde o médico receitou analgésicos e antibiótico. No dia seguinte, a criança piorou e foi internada na Santa Casa da Cidade, onde morreu dias depois. “Logo depois, veio o caso de uma menina de 3 anos que morreu após ter os menos sintomas, ela teve ainda febre alta e marcas arroxeadas pelo corpo”, conta.
O último caso, segundo Andreia, ocorreu nessa segunda (23 de outubro), quando uma menina de 10 anos morreu também com sintomas semelhantes. O enterro da criança aconteceu nesta terça (24 de outubro), no cemitério Nossa Senhora das Mercês.
De acordo com o município, a maioria dos pacientes passou por avaliação médica, na rede pública ou privada, e o quadro de saúde deles é estável.