Educação na pandemia

Após quase cinco meses de paralisação, Cefet-MG retoma aulas de forma remota

Balanço do primeiro dia das aulas para o ensino médio técnico é positivo, diz instituição; mais de 3.000 alunos foram identificados com dificuldades de acesso às plataformas

Por Lucas Morais
Publicado em 17 de agosto de 2020 | 17:51
 
 
 
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Lousa branca, carteiras, livros e cadernos. A tradicional estrutura das salas de aula cedeu lugar ao computador e às tecnologias de ensino em meio à pandemia do coronavírus. E esse novo desafio de manter a aprendizagem dos alunos diante das dificuldades trazidas pela doença foi iniciado nesta segunda-feira (17) para o ensino médio técnico do Centro de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet-MG). Na semana passada, as atividades já haviam sido retomadas para os estudantes da Graduação e Pós-Graduação após quase cinco meses paradas pela pandemia.

Para o coordenador-geral do Programa de Ensino Remoto Emergencial da instituição, Sérgio Gomide, o balanço do primeiro dia é positivo – ao todo, são quase 16.000 alunos das três modalidades de ensino. "As informações que recebemos até aqui é que a totalidade ou quase totalidade dos alunos participaram das aulas. Há expectativa de que as primeiras semanas sejam de familiarização e até dificuldades da plataforma interna. Ela passou pelo seu primeiro grande teste e, mesmo com o pico de acesso, não caiu", resume.

Por quase dois meses, 300 professores trabalharam no desenvolvimento do ensino remoto, que conta ainda com ferramentas para interação entre os professores e alunos, conforme o dirigente. Além da interna, estão previstas outras duas plataformas para auxiliar o ambiente virtual de aprendizagem – serão aulas online e também gravadas, com uma carga horária e técnicas de ensino especialmente adaptadas para o meio digital.

"Nesse começo, estamos evitando fazer atividades avaliativas ou aulas ao vivo com conteúdos e prevemos um primeiro semestre maior que o segundo previsto no nosso próprio calendário. Há um fato que o aprendizado em plataformas virtuais demanda um tempo maior e estratégias diferentes. Desenhamos todo o nosso processo de ensino remoto emergencial levando em consideração essas especificações", enfatiza Gomide.

O coordenador do Cefet-MG garante que foi desenvolvido um dos melhores sistemas de ensino remoto do país, com um planejamento bem definido e entendimento das especificidades da educação a distância. "Existe um cuidado grande para que não aconteça como foi com a iniciativa privada, em que num primeiro momento ocorreu uma transposição do ambiente presencial para o virtual. Isso leva fatalmente ao erro e a um desgaste. Estamos tendo essa preocupação de que as atividades sejam balanceadas e tenham um limite máximo diário", acrescentou.

O desafio da inclusão digital

Com atuação em nove municípios mineiros – Araxá, Belo Horizonte, Contagem, Curvelo, Divinópolis, Leopoldina, Nepomuceno, Timóteo e Varginha –, a instituição trabalha com as diferentes realidades socioeconômicas de cada região. Desde maio, foi realizado um levantamento com todos os alunos e identificado entre 3.000 e 4.000, conforme Sérgio Gomide, com dificuldades de acesso digital – seja por falta de internet de qualidade, computadores ou até ausência de conexão em casa.

"Esses casos são divididos por localidade e cada uma apresenta uma realidade própria. A gente sabe, por exemplo, que tem cidades, como Varginha, em que os índices são bem melhores que Nepomuceno, que tem perfil socioeconômico mais frágil e então maior demanda [por auxílio inclusão digital]", enfatizou.

Apesar de não informar se todos tiveram condições de acesso nesse primeiro momento, o dirigente declarou que no início do mês a instituição já disponibilizou auxílio internet para mais de dois mil alunos cadastrados nos programas de assistência estudantil. Ainda é realizado um levantamento pelas unidades de equipamentos próprios que possam ser disponibilizados aos alunos, através de empréstimo.

A expectativa do Cefet-MG é tornar essa política de inclusão social permanente, para além do período emergencial em meio à pandemia do coronavírus. "Hoje o Cefet tem dificuldade de orçamento e o que temos feito é priorizado tudo possível direcionado para essas iniciativas. Estamos quadruplicando o orçamento da assistência estudantil. É claro que nas primeiras semanas tenhamos algumas dificuldades de acesso e de atendimento a esses alunos, mas mesmo isso está sendo mapeado", admitiu.

E também segue em andamento um programa inclusão digital para toda a comunidade acadêmica sem internet em casa – as pré-inscrições foram iniciadas na última semana. "É um sistema prévio que não garante o acesso, porque precisa confrontar essas informações com outros dados, como renda per capita familiar, mas é um forma de tentar antecipar e consolidar esse mapeamento da totalidade de alunos que realmente demanda desse serviço para ter acesso à informação", explicou. Ao todo, devem ser beneficiados mais de 1.000 alunos até o fim do mês de agosto.

Como o ensino técnico exige programas e softwares que demandam configurações mínimas dos computadores, o Cefet-MG também fez um levantamento sobre o número de alunos que não teriam equipamentos que atendam ao ensino retomo – foram identificados entre 1.200 e 1.300. Por desta situação, será lançada um edital para a aquisição de equipamentos para esses alunos.

Apreensão para o Enem

Com previsão para o encerramento do ano letivo em maio de 2021, a preocupação dos alunos do terceiro ano do ensino médio é com o Enem, que será aplicado em janeiro. É o caso da Camila Marques, 18, que estuda no Cefet-MG e reclama da demora para o início das aulas remotas. "Ficou um pouco complicado, agora vai ser mais apertado, porque temos que estudar para o exame e ainda o curso. Temos que organizar bem os horários por conta disso", afirmou.

O coordenador-geral do Programa de Ensino Remoto Emergencial da instituição, Sérgio Gomide, declarou que os professores estão empenhados em recuperar "o tempo perdido". Para isso, devem ser antecipados ao máximo os conteúdos e habilidades exigidas para o Enem até a data de realização das provas. "O período nosso [de paralisação das aulas] foi muito maior que o adiamento do exame", argumenta.

Mini-entrevista com o coordenador-geral do Cefet-MG

Na semana passada, as aulas da graduação já foram retomadas de forma retoma. Qual é o balanço até aqui?

As ações da semana passada previam sobretudo informações iniciais, de acolhimento, estratégias didáticas, aquele primeiro contato. O retorno efetivo, tanto da graduação quanto do ensino médio, será mesmo nesta semana. Mas o que temos é um cenário de muita ansiedade, claro, por parte dos alunos, dos professores também. Essa nova situação inclui um novo espaço e uma nova forma de se relacionar com o tempo. Uma das nossas principais preocupações é que essas ações de ensino nesse primeiro momento não sejam se transmissão de conteúdo, vamos dizer assim, mas de tentar desenvolver novas estratégias didáticas, novas formas didáticas de integraliza os conteúdos, trabalhar a aprendizagem.

Como vai funcionar o programa de inclusão social para os alunos sem acesso à internet ou computador em casa?

Essa chamada que foi feita é para ampliar o programa de inclusão que já temos. Acontece que a pandemia deu visibilidade a problemas sociais com os quais já convivemos anteriormente, mas que são inaceitáveis sob qualquer ponto de vista. Um desses problemas é a falta de acesso, como poderia ter no nosso corpo discente alunos sem acesso regular à internet? É uma situação inadmissível e que ficou exposta agora. É importante lembrar que do ponto de vista da instituição estamos fazendo o máximo possível para que todos os alunos que tenham dificuldade sejam assistidos, seja com pacote de internet rural, pacote de dados, seja com equipamentos. Essa pré-inscrição é um sistema prévio que não garante o acesso à inclusão digital, porque precisa confrontar essas informações com outros dados, como renda per capita familiar, mas é um forma de tentar antecipar e consolidar esse mapeamento da totalidade de alunos que realmente demanda desse serviço para ter acesso à informação. Então a previsão é de que a gente possa, com recursos próprios e federais, em um primeiro momento, neste mês de agosto, definirmos formas de auxílio para mais 1.000 alunos. 

Quais são as dificuldades com o orçamento da instituição?

Ainda que tenhamos dificuldades menores, mais atenuadas que da rede estadual, a gente lida sim com escassez de orçamento. Eu até conversei isso com os alunos do grêmio, o ensino remoto do Cefet-MG foi planejado para ser o melhor do país. Precisamos muito de união. Por exemplo, agora o governo acabou de anunciar o corte de R$ 1 bilhão no orçamento das instituições federais de ensino e eu acredito que era para isso que deveríamos estar nos posicionando. Hoje o Cefet tem dificuldade de orçamento e o que temos feito é priorizado tudo possível direcionado para essas iniciativas.

Alunos do ensino médio em BH reclamam que ainda não receberam os livros didáticos. Eles serão entregues?

Em Belo Horizonte não foram entregues porque o banco do livro aqui funciona de uma maneira muito complexa, é muito grande, trabalhamos com dois campis. Quando a entrega estava sendo implementada e desenhada, houve a pandemia e a suspensão do calendário. Estamos desenhando uma estratégia para que as famílias, sobretudo pais, mães e responsáveis, possam vir ao Cefet de uma maneira organizada buscar esse material e fazer a troca. Não é só entregar o livro didático, os alunos têm que entregar o do ano anterior. Acreditamos que até o final de agosto os alunos que puderem comparecer ao campus poderão pegar o livro didático. De todo modo, também estamos trabalhando em outras frentes, alguns professores estão digitalizando conteúdos e também em contato com as editoras para liberar o acesso aos PDFs dos livros oficiais, disponibilizar para os alunos, já que estamos em um contexto de emergência sanitária. 

 

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