Saúde

Covid: baixa vacinação, festas de fim de ano e alta de casos preocupam médicos

Especialistas alertam que redes hospitalares podem sofrer pressão nas próximas semanas e meses

Por Juliana Siqueira
Publicado em 15 de novembro de 2022 | 03:00
 
 
 
normal

Menos de 50% da população elegível vacinada com a quarta dose do imunizante contra a Covid-19, nova subvariante (BQ.1), vacinas não atualizadas e grandes aglomerações à vista, como a Copa do Mundo e as festas de fim de ano. Esses são alguns dos fatores que podem contribuir para uma nova explosão de casos de coronavírus em Minas Gerais, conforme especialistas. Só em Belo Horizonte, subiu de 3% para cerca de 6% a proporção dos testes positivos para a doença em um intervalo de cerca de 15 dias, segundo dados da Prefeitura da capital.

A preocupação não é diferente no restante do País. Na última semana, a Secretaria de Vigilância em Saúde, vinculada ao Ministério da Saúde, emitiu nota com recomendação para retorno do uso de máscara para ajudar a conter a enfermidade, sobretudo em casos como daqueles que tiveram contato com sintomáticos e os que se enquadram como grupo de risco. Ao mesmo tempo, a Grande São Paulo viu crescer em 65,1% o número de internações por Covid-19 nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) nas duas últimas semanas, conforme dados da Secretaria de Saúde do Estado, deixando em alerta a rede hospitalar dos municípios do interior.

Membro do Comitê Científico de Covid-19 da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), o infectologista e epidemiologista Carlos Starling afirma que a alta dos números da Covid-19 é muito preocupante. Ele lembra a situação de Minas Gerais atualmente em relação à vacinação: conforme dados da Secretaria de Estado de Saúde, apenas 41,56% do público-alvo tomaram a quarta dose do imunizante, um universo de 3.762.408 entre os 9.053.307 aptos para a vacina. Há, ainda, aqueles que nem sequer tomaram a primeira dose no Estado. Os números mostram que 88,22% se imunizaram com a primeira dose, 83,40% com a segunda e 63,45% com a terceira. Em Belo Horizonte, apenas 19% do total da população está vacinada com a quarta dose (por enquanto, somente pessoas com mais de 40 anos podem tomar a segunda dose de reforço), enquanto 72,4% tomaram a terceira dose, 88,6% a segunda e 96% a primeira.

“Nós temos todo um cenário desfavorável e que certamente vai gerar um aumento na incidência de casos”, diz Starling, salientando que a rede hospitalar será, sim, afetada com essa nova onda pandêmica. “Ela (a rede hospitalar) deve sofrer uma pressão nas próximas semanas e meses”, afirma ele.

A situação tem preocupado a população à medida que nem todos os cuidados dependem somente do comportamento pessoal e individual, como o uso de máscaras. Em Minas Gerais, poucas cidades, como Contagem e Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, estão aplicando a quarta dose para pessoas com menos de 40 anos sem comorbidades. 

“(O aumento de casos de Covid-19) me preocupa muito. Vivemos um momento em que a vacinação em BH está estagnada, e a população que já foi convocada demonstra certa resistência. Tenho receio de vivermos uma taxa de contágio muito alta e um aumento dos casos graves por falta de vacinação. Gostaria muito de tomar a quarta dose, penso que ela é essencial para nossa proteção”, diz a contadora  Isabela Hoffmann de Morais, de 29 anos.

Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais informou que aguarda recomendações do Ministério da Saúde para ampliação em relação à segunda dose de reforço do imunizante.

“A Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) segue as recomendações do Ministério da Saúde. O MS, por meio do Programa Nacional de Imunizações, subsidiado por discussões na câmara técnica assessora em imunizações Covid-19 e nas atuais evidências científicas, recomenda a aplicação de um segundo reforço da vacina contra para todas as pessoas em geral com 40 anos ou mais de idade. O intervalo mínimo para o segundo reforço deve ser de quatro meses após o primeiro reforço”, afirma.

Imunizante não atualizado

Enquanto grande parte das pessoas nem mesmo tomou a quarta dose da vacina, já há outro desafio que assombra o cenário atual, conforme o infectologista Carlos Starling: a falta de atualização do imunizante contra a doença. No fim de setembro, a Pfizer apresentou à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) o segundo pedido de autorização temporária de uso emergencial para uma nova versão do imunizante. A reportagem questionou a agência sobre a aprovação, mas não recebeu retorno até o fechamento desta matéria.

O Ministério da Saúde informou que as vacinas fornecidas atualmente são as últimas versões aprovadas pela Anvisa. “A pasta acompanha com atenção os estudos e inovações tecnológicas relacionados à Covid-19. Vale ressaltar que o atual contrato com os fornecedores contempla a entrega de vacinas com cepas atualizadas, desde que aprovadas pela Anvisa”, justificou.

A importância da quarta dose

Embora a quarta dose da vacina contra a Covid-19 ainda não esteja disponível para grande parte das pessoas com menos de 40 anos, especialistas afirmam que a imunização é importante para ajudar a barrar a doença, além do reforço das medidas de segurança. 

“Com as vacinas que nós temos hoje aqui disponíveis, a partir do quarto mês há uma queda significativa do nível de proteção da vacina. Isso acontece tanto com a vacina quanto com a infecção natural. Com a vacina, pelo menos a pessoa que se infecta tem uma chance menor de ter Covid longa - que é uma complicação importante que pode acometer até 25%, 30%, das pessoas que tem Covid. Não é só a internação, mas a Covid longa que gera afastamento do trabalho e muito desconforto para as pessoas”, diz o infectologista Carlos Starling. 

Ainda segundo o especialista, outra questão relevante tem a ver com o fato de que a imunização diminui os números de internação e as mortes por Covid-19.  “Outro aspecto importante é que essa quarta dose, com mais de quatro meses cai a efetividade, mas ainda assim ela evita as internações e óbito. É difícil ver uma pessoa que tomou quatro doses sendo internada em hospital”, afirma ele.

O infectologista Leandro Curi também ressalta que a imunização não deve parar no estágio em que se encontra atualmente. “Depois de um tempo, a taxa de anticorpos cai, é algo natural, por isso os reforços são dados. A vacinação é vantajosa para todo mundo, inclusive para as crianças”, afirma ele.

Em relação ao público infantil, a prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informou que, na última sexta-feira (11) a Secretaria Municipal de Saúde recebeu da Secretaria de Estado de Saúde cerca de 5,6 mil doses da Pfizer pediátrica para vacinação de crianças de 6 meses a 2 anos, 11 meses e 29 dias. A imunização completa requer três doses da vacina.

“Equipes da secretaria serão treinadas para realizar a imunização e os locais da vacinação serão definidos nesta semana. Em Belo Horizonte, há aproximadamente 61,7 mil crianças com idade de 6 meses a 2 anos (2 anos, 11 meses e 29 dias)”, afirmou. O executivo municipal não informou quais grupos de crianças serão vacinados primeiramente e nem como se dará a imunização, uma vez que há muito mais crianças nessa faixa etária do que doses disponíveis atualmente.

População cansada x medidas de proteção

Em meio a todos esses desafios, a boa e velha lição aprendida pelos habitantes do mundo todo ainda é um dos melhores “remédios” para combater a Covid-19, como usar máscaras e evitar aglomerações. No entanto, conforme o infectologista Carlos Starling, essas medidas encontram agora uma população já cansada das ações de proteção. 

“A população está cansada de medidas de barreira, está cansada de usar máscara, e voltar a usar máscara é muito mais complicado. Se não tivesse tirado a obrigatoriedade, tudo bem, mas nós tiramos essas barreiras muito precocemente”, diz ele.

Apesar da resistência de parte da população, o infectologista Leandro Curi salienta que a tão “combatida e impopular máscara” pode ser uma espécie de “vacina contra a transmissão da Covid-19”.

“Se no mundo ideal todos usassem máscara, poderíamos barrar a Covid-19. A orientação é sempre usar, sobretudo se vai pegar um ônibus, se irá a uma festa. A máscara é algo que todos já têm em casa”, lembra ele.

Além disso, Curi ainda afirma que a população deve tomar outros cuidados, como evitar aglomerações. Nas festas de fim de ano, lembra ele, também é o momento de se pensar em cuidar das pessoas amadas.

“Se a pessoa está com algum sintomas de Covid-19, que evite de ir a encontros. Tem aqueles que subestimam os sinais, acham que estão apenas com um resfriado ou rinite, mas é Covid-19”, destaca o especialista.

Outra opção, segundo Curi, é sugerir que antes dos encontros da família no fim de ano, todos façam um teste de coronavírus. “Esse é um ato de amor por si e pelos outros”, conclui.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!