Seca

Crise hídrica já leva a risco de racionamento de água em parte de Minas

Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) restringiu permissão de captação em parte do Vale do Rio Doce

Por Gabriel Rodrigues
Publicado em 22 de setembro de 2021 | 10:32
 
 
 
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A crise hídrica que afeta Minas Gerais já causa restrição de captação de água em parte do Estado. Neste mês, o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) prorrogou uma portaria em que limita a captação de água para indústrias, irrigação e consumo humano na área da Bacia do Rio Suaçuí Grande, no Vale do Rio Doce. 

Indústrias e a própria Copasa terão de manter a captação em baixa pelo menos até o dia 15 de outubro em alguns dos cursos d’água da região. O volume captado diariamente deverá ser 20% menor para consumo humano, animal e abastecimento público, 25% menor para irrigação e 30% menor para uso industrial.

A Cenibra, empresa de celulose com outorga para captação de água em pontos do rio Suaçuí, afirma que seu planejamento já conta com a estiagem na região. “No período mais seco, a empresa retira suas operações de regiões que dependem mais do uso da água, porque o mais importante é a hidratação humana e animal. Nesse período, fazemos operações em regiões onde não há escassez hídrica”, afirma Jacinto Lana, coordenador de Meio Ambiente da empresa. Segundo ele, a água é usada especialmente para irrigar as estradas por onde passam os caminhões que transportam as madeiras usadas pela empresa.

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Mesmo sob ameaça, segundo prefeitos do entorno, a distribuição de água para os cidadãos está normalizada. “Ainda não tivemos reclamação de falta de água, mas sim sobre a qualidade de água, que vinha chegando mais suja, porque a captação, com níveis baixos, tem mais sedimentos. Se não chover, já, já devemos ter racionamento”, pontua o prefeito de São Pedro do Suaçuí, Euzébio de Souza (Avante). 

O prefeito de São João Evangelista, Hércules Procópio (PP) relembra que a cidade já passou por racionamento em 2019 e, agora, teme um novo momento de falta d’água. “A cidade cresceu muito nos últimos anos e a periferia não é bem atendida pelo abastecimento. Se fosse, talvez até já estivéssemos com restrições de água”, pontua.

O Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG) tem uma unidade no município e autorização para captar água direto de um rio, por exemplo. Como a maior parte das aulas presenciais não retornou, segundo o prefeito, a situação ainda não foi agravada. 

De acordo com Flamínio Guerra, presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce, o rio Suaçuí sempre sofre muito nos períodos secos, mas a situação vem se agravando ano a ano desde 2014. “É uma bacia muito impactada no período seco, com pastagens e regiões mais áridas. Alguns locais da região estão em processo de desertificação”, afirma. Segundo ele, os comitês vêm trabalhando para recuperação de nascentes, intervenções em áreas degradadas e parceria com os municípios para aumentar a oferta de matas ciliares. “É um trabalho feito para ter resultados a médio prazo”, conclui. 

Questionada pela reportagem, a Copasa afirmou, por meio de nota, "que, na região, apesar da situação crítica de estiagem, não há ocorrência de desabastecimento nos municípios que operam nessa bacia - São João Evangelista, Paulistas, Rio Vermelho, São Pedro do Suaçuí e Materlândia. A captação das Copasa nos municípios tem como única finalidade o abastecimento público, que é priorizado pela legislação". O Igam não deu mais detalhes sobre o impacto da restrição de captação até a finalização desta matéria. 

Crise hídrica prolongada afeta agropecuária e indústria

Segundo informações publicadas no site da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), a bacia é a única que se encontra em estado de restrição, atualmente. Já estações da Bacia do São Francisco, do rio Doce e do rio Mucuri estão em estado de alerta, que antecede a restrição. A reportagem questionou o Igam sobre a chance de as regiões abastecidas pelas bacias sofrerem restrições de captação ou racionamento de água e aguarda retorno. 

“Quem é usuário dessas bacias precisa se preparar, porque o próximo passo é a restrição, então é necessário ter medidas de atenção”, pondera o engenheiro agrônomo e analista ambiental da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Guilherme Oliveira. 

Ele explica que a irrigação com água diretamente de cursos d’água não é habitual na região do Suaçuí, portanto a restrição de captação de água na área pode não ter impactos relevantes sobre a maioria dos produtores. Ainda assim, uma crise hídrica prolongada pode trazer consequências significativas para a agropecuária no Estado, lembra.

“Na medida em que a crise se prolonga, o plantio das safras atrasa, porque o agricultor espera a chuva para preparar o solo e isso pode deixar o período de safra mais curto no ano seguinte também. Com a crise hídrica, os custos com a energia sobem muito, e os insumos, na pandemia, já estão caros, com a inflação. Produziremos menos e o produtor arcará com custos maiores e produtividade menor”, completa.

O presidente do Conselho de Meio Ambiente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Mário Campos, destaca que a diminuição da captação de água impacta especialmente indústrias de alimentos e bebidas, e reforça a necessidade de estratégias alternativas para utilização de água no setor industrial. 

“É preciso pensar formas de reuso da água e realizar um balanço hídrico para saber onde pode haver processos de melhoria. A crise hídrica aumentou o preço da energia e leva a um movimento, que já vinha acontecendo, de diversificar fontes de energia, como a auto produção nas indústrias”, conclui.

 

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