Discriminação de gênero

Funcionária demitida em BH por ser mulher será indenizada em R$ 9 mil

Trabalhadora se envolveu em uma briga com um colega de serviço, mas somente ela foi dispensada. Caso foi considerado discriminação de gênero

Por O Tempo
Publicado em 27 de outubro de 2021 | 20:23
 
 
 
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A Justiça do Trabalho (TRT) em Belo Horizonte considerou como discriminação de gênero a demissão por justa causa de uma funcionária de uma distribuidora de medicamentos. A mulher foi dispensada sem direitos depois de se envolver em uma briga com um colega.

No entanto, somente ela recebeu uma punição severa. E, ao analisar o caso, a juíza Jéssica Grazielle Andrade Martins determinou a reversão da justa causa. Também determinou uma indenização de danos morais em R$ 9 mil, valor que deverá ser pago pela empresa.

Conforme o TRT, "ficou provado no processo que a empregadora agiu de forma discriminatória ao dispensar a profissional e aplicar somente uma advertência ao outro trabalhador que participou da discussão".

A confusão entre os dois empregados aconteceu durante o horário de trabalho. Testemunhas ouvidas confirmaram que a trabalhadora, durante a desavença, chegou a arremessar latas em direção ao colega, mas sem acertá-lo.

Informações colhidas no processo mostram que a trabalhadora era empregada exemplar, querida pelos demais empregados, tanto que, no contrato de mais de três anos de duração, não sofreu advertência. 

Para a juíza, ela foi “descartada”, sem qualquer direito trabalhista, “não porque cometeu uma falta grave, mas sim porque a conduta agressiva não foi tolerada pelo fato de ser mulher, uma vez que o outro empregado foi punido de forma mais branda”.

Para a magistrada, o caso merece um olhar com perspectiva de gênero. “A evidente disparidade de tratamento não pode ser admitida”, ressaltou. Na visão da juíza Jéssica Grazielle, ficou claro que houve discriminação. Ela observou, porém, que foi demonstrado que tanto a autora quanto o seu colega de trabalho tentaram praticar ofensa física. “Mas ele teve punição distinta”, frisou.

“É essa visão de estereótipos de gênero arraigada na sociedade que deve ser inibida, sendo papel do Poder Judiciário declarar nula uma punição aplicada que não atende ao requisito da não-discriminação, sobretudo quando a distinção ocorre pelo simples fato de ser mulher”, escreveu na decisão.

A juíza registrou que a prova testemunhal demonstrou que a empregada era uma pessoa querida no local de trabalho, enquanto o colega era quem tinha histórico de outros conflitos e postura agressiva. 

“A empresa, portanto, não estava preocupada com o histórico de cada empregado ou em medida pedagógica em face da empregada, mas em verdadeira punição para uma conduta, inadmissível para uma mulher, tendo em vista o estereótipo de gênero, mas que foi permanentemente tolerada no ambiente da reclamada quando praticada por empregado homem”, ressaltou.

Para a magistrada, ainda que se considere que houve agressão física de ambas as partes, a pena aplicada somente à mulher foi discriminatória e, portanto, não pode ser chancelada pelo Poder Judiciário. “Não se diga que a conduta agressiva não carece de punição. Trata-se verdadeiramente de conduta repreensível, mas não a merecer a medida extrema, quando conduta idêntica praticada por outro empregado, com histórico de comportamento agressivo e que teve como consequência a advertência verbal”.

A juíza reforçou que é dado ao empregador o direito de aplicar penalidades aos trabalhadores. Contudo, segundo ela, essas penalidades devem se orientar pelo propósito pedagógico, no sentido de propiciar o ajuste do empregado às regras do trabalho, atentando-se para a proporção entre a falta e a pena, a adequação e a proporcionalidade entre elas, além da imediatidade na punição e ausência de discriminação. 

“Todavia, no caso em análise, a empresa adotou medidas punitivas diferentes para dois empregados que estavam envolvidos no mesmo episódio, sendo evidenciado que a autora foi tratada com elemento desqualificante e injusto”.

Assim, diante das provas colhidas, a magistrada entendeu que a justa causa não foi adequadamente aplicada, revertendo a dispensa sem direitos, ocorrida em agosto de 2019, para a modalidade de dispensa sem justa causa, com o pagamento das parcelas rescisórias devidas. 

E determinou ainda o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 9 mil. Houve recurso, mas os julgadores da 10ª Turma do TRT-MG mantiveram a decisão de primeiro grau. A empresa tentou recorrer ao TST, mas não foi autorizado o seguimento do recurso, por ausência de cumprimento dos pré-requisitos legais. 

Atualmente, não cabe mais recurso da decisão e já foi iniciada a fase de execução dos créditos trabalhistas.

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