Minas

Polícia Civil monitora suspeitos de possíveis ataques a escolas

Desde o massacre em Suzano (SP), Estado registrou ao menos dez casos de ameaças a instituições

Por Rafaela Mansur
Publicado em 01 de abril de 2019 | 03:00
 
 
 
normal

Após o ataque à Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano, na Grande São Paulo, que resultou em dez mortes em 13 de março, Minas Gerais registrou pelo menos dez ameaças de violência contra instituições de ensino. A maioria delas foi feita em redes sociais, por alunos ou ex-alunos. A situação preocupa a Polícia Civil do Estado, que está “atenta”, de acordo com o chefe da corporação, delegado geral Wagner Pinto de Souza.

Em entrevista o jornal O TEMPO, ele explica que o trabalho da corporação é repressivo, por meio de investigações que buscam a responsabilização dos autores. Além disso, há um serviço de inteligência para detectar anormalidades nas escolas e prevenir atentados. É possível, inclusive, apurar os crimes no ambiente da “deep web”, parte da internet oculta ao grande público e que não é listada por mecanismos de busca, onde grupos de ódio costumam atuar.

Wagner Pinto afirma que uma ação criminosa, como a que ocorreu na cidade paulista, pode estimular uma “onda de crimes” do mesmo tipo. Para enfrentar o problema, existe um desafio: o déficit de pessoal da Polícia Civil, de mais de 40%. O ideal seriam 17 mil policiais civis em Minas e, atualmente, há pouco mais da metade, cerca de 9.000.

Segundo a corporação, um concurso público para os cargos de escrivão de polícia, com 119 vagas, e de delegado, com 76, está em andamento, e a designação dos profissionais vai ocorrer por meio de planejamento e critérios técnicos, conforme a demanda da instituição.

A Polícia Civil informou ainda que um concurso de investigador está válido, com prazo para vencimento em agosto deste ano. Uma turma de 66 investigadores está sendo preparada na Academia de Polícia, e a previsão é que ela passe a atuar em delegacias em maio.

Minientrevista

Wagner Pinto de Souza
Chefe da Polícia Civil em Minas Gerais


A questão dos ataques a escolas é uma preocupação da Polícia Civil?

Os ataques às escolas são uma preocupação latente. A Polícia Civil é repressiva, atua após o fato criminoso, e, nesse viés, temos preocupação quando há ameaças, lesões corporais, tentativas de homicídio e até tráfico e uso de drogas nas escolas. A Polícia Civil busca priorizar as investigações de casos concretos, verificar se existe trama criminosa por trás, que possa causar uma situação mais grave, como em Suzano. A polícia está atenta.

A polícia faz um monitoramento constante para prevenir e não só responder aos ataques?

O trabalho preventivo passa pela Polícia Militar (PM), que tem preocupação constante de inibir o fato criminoso. Nossa atividade específica é a repressiva, apontando o autor do crime à Justiça. Entretanto, buscamos fazer um trabalho de inteligência, com o cruzamento de ocorrências em determinada escola. Hoje, a rede social é utilizada sobremaneira pelos adolescentes, então, temos preocupação de filtrar essas informações para verificar se há alguma anormalidade para inibir o fato.

Como o serviço de inteligência consegue monitorar a situação?

Vamos catalogar as ocorrências, fazer um estudo delas, verificar as pessoas envolvidas, se é o mesmo grupo ou uma única pessoa, e esse estudo faz com que ajamos de forma rápida. Concluímos esses procedimentos para, de forma repressiva, inibir novas ações.

A polícia consegue ter acesso à “deep web” e identificar as pessoas?

A técnica da polícia para alcançar as informações não pode ser revelada porque é contraproducente ao nosso trabalho.

Mas é possível entrar nesse ambiente?

De certa forma, sim, há essa possibilidade.

Minas teve vários casos de ameaças a escolas após o ataque em Suzano. A polícia identificou se essas pessoas agiram individualmente ou com apoio de grupos online?

Às vezes, uma ação criminosa estimula uma onda de crimes da mesma modalidade. Teve uma época em que ocorreram vários homicídios de mulheres, e virou uma avalanche desses crimes. Às vezes, a veiculação midiática do fato criminoso estimula. As pessoas estão com comportamento mais ofensivo, não têm tanto respeito aos demais, estão impacientes, e há conflitos dentro e fora das escolas.

Qual a motivação das pessoas? Elas recebem incentivos na internet?

A ação criminal é de caráter personalístico. É lógico que as redes sociais hoje são estímulos à prática de determinadas ações, porque aquilo ali vai adentrando na mente do ser humano de forma motivacional a praticar determinado tipo de situação. Mas elencar os motivos que levam a pessoa a praticar determinado crime é de caráter personalíssimo. A polícia busca, sim, fazer esse estudo criminológico desde que ocorra em cadeia, em série. Quando são fatos isolados, tratamos cada caso de forma isolada.

Quando ocorre um caso, como é o trabalho de investigação?

A Polícia Civil instaura inquérito para apurar a causa do evento e individualizar a conduta.

A ação da polícia e a responsabilização dos autores inibem outros casos?

Sem dúvida. Quando a polícia dá resposta rápida, aponta a autoria e prende os indivíduos, há um impacto positivo, inibindo outras ações. Ao passo que, quando a investigação vai se arrastando por muito tempo ou não se chega a um resultado satisfatório, as pessoas verificam que não existe punição, e agem com mais tranquilidade e são estimuladas à prática de crimes.

Em Minas, foi identificado algum grupo que planeja ataques a escolas?

Não.

Que outras medidas de segurança o senhor acredita que podem ajudar a inibir ataques a escolas?

Todo mecanismo inibitório é útil. A segurança pública é dever do Estado e responsabilidade de todos, passa pelos próprios familiares, ao detectar alguma anormalidade no comportamento dos adolescentes. Ter vigilante nas escolas, patrulhamento ostensivo, detectores de metais para evitar a entrada de alunos com materiais cortantes ou arma de fogo, câmeras são instrumentos que inibem o crime.

A polícia está bem equipada quanto à estrutura e pessoal para investigar esses casos?

Nós temos um setor de inteligência muito bem estruturado para atender as demandas da Polícia Civil.

Há algo que precisa ser incrementado?

Com certeza. O nosso recurso humano está aquém do ideal, o quadro está defasado em torno de 40%. Há, sim, uma necessidade urgente de reestruturação da Polícia Civil, novos concursos públicos e nomeação de policiais, como investigadores, delegados, escrivães, peritos e médicos legistas, para compormos o quadro de forma ideal para os 853 municípios do Estado, buscando atendimento efetivo à população. São responsabilidade nossa não só esses casos (de ataque a escolas), mas todos os crimes. Qualificar a investigação é o nosso passo principal.

Como os casos devem ser tratados para não incentivar outras pessoas?

Às vezes, a pessoa, em vez de se preocupar com a prestação de socorro à vítima de um crime, quer filmar, fotografar, porque aquele tipo de situação vai viralizar de forma irresponsável, proporcionando esse tipo de situação. Então, depende de uma responsabilidade das pessoas que detêm a informação.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!