Histórias

Preconceito resiste ao tempo

Aposentado convive com o vírus há quase 30 anos e conta como foi difícil a aceitação

Por Letícia Fontes
Publicado em 11 de novembro de 2019 | 09:49
 
 
 
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“Eu falo, mas sem aparecer meu rosto e meu nome. Tenho medo”, combinou o estudante João*, 25, que vive há pouco mais de um ano com HIV. Ele se enquadra na faixa etária que mais tem contraído Aids: de 20 a 34 anos. Foram 1.692 casos entre as pessoas com essas idades, seguido de 1.009 registros entre pessoas de 35 a 49 anos.

“Transei com uma pessoa sem camisinha porque ela insistiu muito, e acabei aceitando. Vivia com dúvida, mas, quando vi o resultado positivo, foi aquele choque. Pensei que ia morrer no outro dia. Minha primeira vontade foi subir no prédio de uma amiga e me jogar”, conta João.

No primeiro ano de convívio com o vírus, o estudante diz que pensou em se matar cinco vezes. O medo do preconceito e os estereótipos sobre a doença ainda o atormentam, a ponto de decidir não falar que é soropositivo para ninguém, nem para a família. “Na minha cabeça, a pessoa vivendo com HIV tinha que ser magra e ter cara de doente. Pensava que só gay pegava, só magro que tinha”, relata o jovem, que não sabe se um dia terá coragem de contar para família. 

O aposentado Francisco Aleixo, 66, também omitiu que tinha HIV. Foram 17 anos convivendo em silêncio com a doença, até que um dia, bêbado, resolveu colocar para fora a angústia e contou para uma cunhada.

Ele contraiu o vírus quando tinha 38 anos e descobriu durante um exame de rotina. Apesar de entender o avanço da medicina e que seria possível viver com a sorologia positiva, Aleixo disse que só conseguia lembrar de seus ídolos, como Cazuza e Renato Russo, que morreram nas décadas 80 e 90, respectivamente, em decorrência de complicações relacionadas à Aids. “Como qualquer jovem que recebe esse resultado, achei que estava recebendo um atestado de morte”, completou o aposentado.

Ele conta que hoje tem uma vida normal. “Desde que iniciei o tratamento, estou bem. Mas as pessoas acham que o coquetel é a cura, e não é. É só uma sobrevida, mas as pessoas banalizam”, concluiu Aleixo. 

* Nome fictício

Alerta vale também para os idosos

Apesar da preocupação com a população mais jovem, 78 pessoas entre 65 a 79 anos foram infectadas pelo vírus HIV neste ano em Minas. A dona de casa Maria*, 67, descobriu há quatro anos que tinha a doença. “Fiquei desesperada. Nunca pensei em passar por isso”, relatou. 

Ela conta que recebeu o diagnóstico após a morte do marido, com quem viveu por mais de 20 anos. “Quando pensei que estava chegando à fase mais tranquila da minha vida, descobri que deveria ter me prevenido mais. A gente nunca acha que vai acontecer com a gente” acrescentou. (LF)

* Nome fictício

Teste de HIV

Onde fazer. Nos 152 postos de BH, de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, e nos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTAs): rua Carijós, 528, e rua Joaquim Felício, 141.

 

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