Alerta

Tipos de remédios podem pôr vida e saúde de idosos em risco

Pesquisadora concluiu que medicações para dormir, antipsicóticos e antialérgicos são maléficos

Por Joana Suarez
Publicado em 27 de fevereiro de 2017 | 03:00
 
 
 
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Quando envelhecemos, não são só as rugas que aparecem, todo nosso organismo envelhece junto. Órgãos como rins e fígado, os mais atingidos quando tomam-se medicamentos, já não funcionam muito bem depois dos 60 anos. Com isso, alguns tipos de remédios, como os usados para dormir, os antialérgicos e os antipsicóticos, ao invés de trazerem benefícios, oferecem risco à vida quando usados por idosos. O perigo foi comprovado por um estudo desenvolvido pela farmacêutica Mariana Gonzaga, no Centro de Pesquisas René Rachou, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a partir de uma pesquisa feita com 1.371 moradores de Bambuí, na região Centro-Oeste de Minas.

Entre os idosos voluntários do estudo – que foram acompanhados durante 14 anos pelo laboratório de Antropologia e Envelhecimento da Fiocruz –, 56% utilizavam pelo menos um dos chamados Medicamentos Potencialmente Inadequados (MPI), que provocam maior mortalidade.

Os antipsicóticos como haloperidol (Haldol) e clorpromazina (Amplictil) estavam na lista de apenas 3% dos idosos, mas fazem parte do grupo de remédios que mais representou risco de morrer para pessoas acima de 60 anos. Na sequência, aparecem os antialérgicos, como desclorfeniramina (Polaramine) e dimenidrato (Dramin), usados por 18% do grupo e, por fim, os remédios para dormir (benzodiazepínicos), como diazepam (Valium) e clonazepam (Rivotril) – tomados por 15% dos idosos.

O uso dessas drogas aumentou em 44% o risco de morrer, conforme a pesquisa. Para os idosos, os remédios citados causam reações adversas, como sonolência profunda, predisposição a queda e fraturas, que reduzem a qualidade e o tempo de vida.

“Já existiam estudos internacionais que mostravam isso, mas não com brasileiros. E o processo de envelhecimento da população no Brasil é um dos mais acelerados do mundo”, defendeu ela sua tese, acrescentando que os “profissionais de saúde prescrevem muito esses medicamentos por desconhecimento, porque os pacientes pedem”.

Para ela, sempre que possível, o médico deve buscar uma alternativa terapêutica mais segura. “Um exemplo são as medidas de higiene do sono para quem não consegue dormir, com redução da dose e retirada lenta dos diazepínicos”, esclareceu.

Efeitos. O engenheiro civil aposentado Levi Inácio Martins, 85, tomava o antipsicótico haloperidol, mas o remédio o deixava mais nervoso e dopado durante o dia. “Estou muito chateado, pois minha esposa morreu, e eu parei de trabalhar. Não estou entregando os pontos, mas esse remédio não tinha um efeito legal”, contou.

Segundo a farmacêutica, muitas vezes essas drogas são usadas para controlar a agitação do idoso, sendo que uma saída seria o acompanhamento comportamental e psicológico.


Polimedicados

Excesso de drogas entre mais velhos é comum

O idoso chega com muitas queixas ao consultório, tem uma série de patologias e trata-se com vários profissionais, que muitas vezes não têm cuidado nas prescrições. Em cada médico que vai, ele recebe uma receita diferente. “Quatro em cada dez idosos são polimedicados, usam dois ou mais remédios por mais de 240 dias consecutivos. Toda vez que se acrescenta um, corre-se o risco de uma reação adversa à droga”, afirmou o geriatra José Milton Cardoso, da Sociedade Brasileira de Geriatria.

Segundo ele, muitos desses medicamentos são desnecessários. “Eu peço para eles trazerem a bolsinha de remédios para discutirmos qual tomar, porque tem um tanto de analgésico”, disse Cardoso. “A quantidade de gente que usa o clonazepam (Rivotril) é absurda, e ele fica no corpo por 44 horas”, acrescentou.

A farmacêutica Mariana Gonzaga apresenta outro motivo para a preocupação. Segundo ela, atualmente, a expectativa de vida do brasileiro é de 76 anos, mas o uso prolongado das medicações inadequadas, em qualquer idade, pode levar ao aparecimento de demência. “Será que os pacientes estão lembrando que vão viver mais de 60 anos?”, indagou. (JS)

Lista

Critério. A Sociedade Americana de Geriatria atualiza constantemente uma lista de MPI, conhecida como lista de Beers, com mais de cem tipos de remédios que devem ser evitados por idosos.


Dicas para regular o sono

Veja quais são as medidas sugeridas pela farmacêutica Mariana Gonzaga que podem ser adotadas por qualquer pessoa que queira ter um sono mais tranquilo, dispensando o uso de medicamentos para dormir, ou, pelo menos, diminuindo a dosagem deles

Não ficar muito tempo na cama;
Manter horários rígidos para dormir e acordar;
Levantar da cama se não conseguir dormir;
Restringir cochilos a 30 minutos pela tarde ;
Ficar mais tempo fora de casa sem óculos de sol, principalmente durante o dia;
Evitar exposição à luz na hora de dormir;
Evitar cafeína, tabaco ou álcool após o almoço;
Limitar líquidos à noite.


Lista de medicamentos perigosos

O uso de pelo menos um dos medicamentos abaixo aumentam a mortalidade entre idosos (mais de 60 anos). A conclusão está na tese de doutorado da farmacêutica Mariana Gonzaga após estudar população que utilizava os medicamentos e que tiveram maior risco de morrer. Eles foram entrevistados anualmente por 14 anos, numa coorte (pesquisas populacionais a longo prazo feitas para gerar diferentes estudos) realizada em Bambuí, Oeste de Minas. Os resultados apontaram para a necessidade da seleção de alternativas terapêuticas mais seguras para os idosos.

ANTI-HISTAMÍNICOS (Antialérgicos) DE PRIMEIRA GERAÇÃO:
Bronfeniramina
Carbinoxamina
Clorfeniramina
Clemastina
Ciproeptadina
Dexbronfeniramina
Dexclorfeniramina
Dimenidrato
Difenidramina
Doxilamina
Hidroxizina
Meclizina
Prometazina
Triprolidina

BENZODIAZEPÍNICOS (remédios para dormir)
Alprazolam
Estazolam
Lorazepam
Oxazepam
Temazepam
Triazolam
Clorazepato
Clordiazepóxido
Clonazepam
Diazepam
Flurazepam

ANTIPSICÓTICOS

Clorpromazina
Flufenazina
Haloperidol
Loxapina
Pimozida
Promazina
Tioridazina
Trifluoperazina
Aripiprazol
Asenapina
Clozapina
Olanzapina
Paliperidona
Quetiapina
Risperidona
Ziprasidona

Em Bambuí, 20% dos idosos pesquisados faziam uso de anti-inflamatórios (diclofenaco, ibuprofeno), medicações que expõem idosos ao risco de hemorragia.

Além dessa pesquisa, em uma outra parte do seu doutorado, Mariana identificou os principais medicamentos potencialmente inadequados usados por 1.158 idosos da região metropolitana de Belo Horizonte:

1o lugar: benzodiazepínicos, com destaque para o Clonazepam (Rivotril) e Diazepam (Valium) – 13% dos idosos
2º lugar: nifedipino de liberação imediata (Adalat) – 12% dos idosos
3º lugar: glibenclamida (Daonil) – 10% dos idosos

“A população precisa saber que há um grupo de remédios que deve ser evitado por idosos, por oferecer perigo à vida. Os profissionais de saúde, não só os geriatras, devem conhecer melhor essa lista antes de prescrever.” Mariana Gonzaga, farmacêutica responsável pelo estudo realizado na Fiocruz

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