A oposição a Romeu Zema (Novo) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) voltou a impor uma derrota à base do governador durante a análise da proposta de Emenda à Constituição (PEC) para pôr fim à exigência de um referendo para as privatizações da Cemig e da Copasa. Pela terceira vez, a votação foi adiada, nesta segunda-feira (30 de junho), na Comissão de Constituição e Justiça.

A PEC é obstruída pela oposição na Comissão de Constituição e Justiça desde o último dia 13, quando o relator Thiago Cota (PDT) apresentou o parecer pela constitucionalidade, legalidade e juridicidade da proposta. Desta vez, na terceira tentativa de votação, os ânimos se acirraram entre os deputados estaduais Beatriz Cerqueira (PT) e Professor Cleiton (PV) e o presidente da comissão, Doorgal Andrada (PRD).

Quando Doorgal deixou de receber um requerimento proposto por Beatriz, um dos instrumentos utilizados para obstrução, a deputada acusou o presidente de tirar 20 minutos do bloco. “Na outra reunião, eu já tinha te pedido declaração de voto e a consultoria te orientou a não me dar direito à fala”, questionou. Cada parlamentar tem direito a dez minutos de fala quando um requerimento é proposto.

Doorgal rebateu Beatriz, justificando que o requerimento, que propunha que a discussão fosse adiada, foi rejeitado na reunião da última quarta (25 de junho). “A minha consulta (à assessoria da comissão) agora foi: ‘nós podemos discutir o adiamento?’, e a resposta foi ‘não, porque ele já foi superado na última reunião, quando foi rejeitado’”, alegou o presidente.

Mais tarde, Cleiton apresentou uma emenda com 333 páginas, que listava todos os 853 municípios do Estado ao vincular 5% dos recursos de uma eventual privatização da Cemig e da Copasa à distribuição igualitária entre eles. O deputado Dr. Jean Freire (PT), então, solicitou a Doorgal que a emenda apresentada pelo colega fosse lida na íntegra.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça iria recorrer à uma decisão do presidente da ALMG, Tadeu Leite (MDB), o Tadeuzinho, em plenário, que limitou o número de emendas consideradas “protelatórias” por propostas, para dispensar a leitura. Questionado por Cleiton quem define o que é protelatório, Doorgal afirmou que é ele mesmo, “a partir de uma decisão do presidente”.

O deputado do PV apontou que o instrumento de obstrução não poderia ser tirado da minoria na ALMG - a oposição tem 20 dos 77 deputados. “Esse direito não será tirado de nós. Nós temos a plena convicção de que nós seremos derrotados. É por isso que a gente obstrui enquanto isso não acontecesse”, argumentou Cleiton.

Doorgal pontuou que o bloco tem direito regimental à obstrução, mas afirmou que “o que não cabe é uma obstrução a fim de limitar o trabalho da comissão”. “Só gostaria de deixar claro que essa presidência tem a obrigação de conduzir da melhor forma possível essa comissão”, apontou o presidente. No final das contas, ele e outros três deputados dividiram a leitura da emenda.

Logo depois de a oposição reivindicar a leitura das outras emendas, o governo e o bloco chegaram a um acordo para que os destaques fossem publicados no site da ALMG para que não houvesse a leitura na íntegra durante a reunião. Em seguida, a sessão foi encerrada por Doorgal a pedido da deputada Bella Gonçalves (PSOL) por falta de quórum.  

Enviada à ALMG ainda em outubro de 2023, a PEC foi incluída por Zema no pacote do Propag protocolado no último mês de maio. O governo argumenta que precisará privatizar Cemig e Copasa para reverter os recursos para atender contrapartidas do novo programa de socorro financeiro dos Estados caso a União não aceite as companhias para abater parte da dívida de cerca de R$ 165 bilhões.

Desde 2001, a Constituição exige a realização de um referendo para avalizar a privatização de empresas públicas “prestadoras de serviços de distribuição de gás canalizado, de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica ou de saneamento básico”. A desestatização foi amarrada a uma consulta popular por iniciativa do então governador Itamar Franco (1999-2002).

À época, Itamar vivia conflitos com o então presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), cujos planos eram privatizar a extinta Furnas Centrais Elétricas. O antecessor do governador, Eduardo Azeredo (1995-1998), já havia vendido 33% das ações ordinárias da Cemig, operação revertida pelo ex-presidente posteriormente.

Além de quebrar o referendo, a PEC quer pôr fim à exigência de quórum qualificado para aprovar privatizações. A mesma Constituição exige que as desestatizações sejam aprovadas com o voto favorável de 48 deputados. Caso o texto encaminhado por Zema avance, seria necessária apenas maioria simples, ou seja, 50% mais um entre 39 parlamentares.