O Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, em Confins, é um frequente destaque em premiações — como reconhecimentos pela pontualidade e sustentabilidade. Por trás das vitórias, porém, funcionários que trabalham no aeroporto são privados de direitos e sequer têm locais adequados para usar o banheiro, beber água ou descansar nos intervalos. Há relatos de funcionários que urinaram nas calças devido à pressão do trabalho e à distância dos sanitários.  Estas são algumas das observações de uma fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Minas Gerais (SRTE/MG), divulgadas nesta sexta-feira (12/07).

A Operação Voo Seguro fiscalizou 19 empresas que atuam no aeroporto, inclusive sua operadora, a BH Airport, e lavrou 241 autos de infração contra elas. A conclusão dos auditores que conduziram a ação é que a gestão do aeroporto comete assédio moral coletivo contra seus trabalhadores.

“Conseguimos confirmar um assédio moral coletivo, organizacional, em relação aos trabalhadores que estão ali. Eles estão com sobrecarga física e diante de muito estresse psicológico. Isso está muito relacionado ao descumprimento de normas de saúde e segurança”, resume o auditor-fiscal do Trabalho Lucas Oliveira.

A aviação civil exige um alto nível de precisão e velocidade dos serviços, reconhecem os auditores-fiscais. Mas o Aeroporto de Confins não disponibiliza condições mínimas de saúde e segurança para os funcionários cumprirem a jornada adequadamente, expõem. “No lado onde os passageiros descem das aeronaves pelas escadas, temos instalações sanitárias que não funcionam como tal, só um bebedouro de galão com água quente e banheiro nenhum”, descreve o auditor-fiscal do Trabalho Marcos Botelho.

De acordo com a inspeção, o aeroporto tem cerca de 7.000 trabalhadores, entre próprios e terceirizados, a maior parte deles empregada na área “de ar”, como se chamam as operações de pista. É neste setor que estão os maiores problemas, segundo os auditores. Os trabalhadores são expostos a trabalhos braçais extenuantes, algumas vezes sem equipamentos de segurança, afirmam os fiscais.

“Uma situação que me deixou perplexo foi a carga e descarga dos pneus das aeronaves. Junto com o pneu, são 180kg. Na força física, dois trabalhadores empurram esse pneu do fundo da aeronave até a saída sem nenhum tipo de equipamento. Em algumas aeronaves sem esteira, a pessoa pega uma mala de 15, 20 kg e a eleva acima dos ombros”, diz o auditor Marco Botelho.

São situações que podem ser suavizadas com mais revezamento de trabalho e locais adequados de pausa e descanso, defendem os auditores. Mas este é mais um problema apurado pela superintendência: há poucos bancos adequados para os funcionários descansarem e, quando eles precisam recorrer a sentar no chão, são repreendidos pelos superiores.

A automedicação e o uso de medicamentos psiquiátricos tornou-se rotina para os trabalhadores, pontua o médico do trabalho Luiz Antônio Rabelo Rocha. “Os trabalhadores tomam anti-inflamatórios, analgésicos e relaxantes musculares por conta própria, além de muitos remédios ansiolíticos e antidepressivos”.

O cenário caótico descrito por eles é uma potencial ameaça à segurança dos próprios passageiros, avalia a auditora-fiscal do Trabalho Julie Santos Teixeira. “Um trabalhador que não descansa, que não tem suas folgas, que não tem hora extra [paga], que não se alimenta, que não toma água, não vai ao banheiro com a frequência adequada naturalmente não está em sua condição 100% de trabalho. E  aí pode ocorrer, como ocorreria com qualquer um de nós, uma desconcentração, um desmaio. E a depender do tipo de operação que ele está fazendo, como conduzindo um trator, pode ocorrer um acidente”. 

Acordo em vista

Todas as 19 empresas inspecionadas, inclusive a BH Airport e as principais companhias aéreas, estão sendo notificadas sobre os autos de infração. Agora, elas se reunirão com a SRTE-MG em agosto para apresentar soluções. Os autos de infração podem ser convertidos em multas de centenas de milhares de reais.

Procurada pela reportagem, a BH Airport afirmou que a concessionária "que ainda não foi notificada sobre o resultado da auditoria conduzida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, de forma que não é possível diferenciar o que cabe a ela e o que é de responsabilidade das outras 18 empresas citadas. Com esse entendimento, prestará os devidos esclarecimentos em total cooperação com o Ministério do Trabalho e Emprego, confiante de que eventuais pontos serão devidamente equacionados".