“Necessária”, “conquista” e “urgente” são algumas palavras utilizadas por diversas entidades no Brasil para definir a Reforma Tributária, aprovada na Câmara dos Deputados, durante a madrugada desta sexta-feira (7/7). A boa recepção veio desde economistas, do Conselho Federal de Economia (Cofecon), até a Confederação Nacional das Indústrias, mas há ressalvas sobre o tema.  

Segundo Róridan Duarte, economista e conselheiro do Cofecon, a entidade defende, de forma geral, a reforma, mas acredita que a mudança ainda não é suficiente. “Ela foca nos tributos indiretos, como o ICMS e ISS, mas precisamos fazer a reforma do direto, que afeta a renda e o patrimônio”, afirma. Ele explica que, desde a década de 1990, existe a discussão sobre a simplificação da forma de tributação, para que a população possa visualizar melhor o que paga. 

“Agora, estamos com a expectativa que comece a discussão sobre impostos como o de renda, no ano que vem. O sistema atual é injusto. Quem ganha menos, de fato tem que pagar menos. Esperamos que as mudanças não se encerrem aqui”, considera.

Para Gelton Pinto Coelho, economista da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (Abed), esta é a maior reforma após o Plano Real. “Há um período de transição, mas o impacto maior é macroeconômico. Muda-se o patamar do país gerando possibilidade real de queda de juros, além de um ambiente melhor de investimentos”, considera.

Conselho de Contabilidade questiona celeridade da aprovação

À reportagem de O Tempo, Felipe Guerra, membro da Comissão de Estudos da Reforma Tributária do Conselho Federal de Contabilidade (CFC),  disse que a entidade se posiciona a favor da reforma, mas que se preocupa com as modificações de última hora no texto. “Essa pressa para aprovar o texto, sem ouvir a classe contábil, que é quem de fato conhece a realidade pratica tributária dos negócios, dá muita margem à interpretações duvidosas, questionamentos e brechas”, pondera Guerra. 

Ele explica que houve mudanças na reforma relativas às pequenas empresas, que podem acabar afetando negativamente este setor. “Quando a empresa comprar de uma optante do Simples Nacional (empresas de pequeno porte), o crédito tributário será menor. Isso nos preocupa em relação à competitividade dos pequenos negócios. Pode favorecer as compras nas maiores, porque a dedução será maior”, explica.

Outro ponto que preocupa o CFC é em relação ao período de transição. “Durante sete anos, teremos dois modelos tributários. Isso tem um custo maior de conformidade à tributação e pode encarecer os produtos. Se o empresário pagar mais para cumprir com essas exigências, pode repassar para o consumidor”, explica. 

O CFC também se preocupa com as ausências da lei complementar, que vai versar sobre diversos assuntos, e da definição da alíquota do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e do CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços. “Ainda não há um retorno de quando isso será definido”, reclama Guerra. 

Setor de indústria prevê ambiente de negócios mais favorável

O presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, acredita que a proposta da reforma tributária representa um avanço, mas ressalva que ainda serão necessários alguns ajustes para assegurar um ambiente de negócios mais favorável para o setor, como a desoneração da folha e dos investimentos produtivos por meio da redução do imposto de renda das pessoas jurídicas. “Para o setor produtivo, a desoneração da folha é um pleito antigo e de suma importância”, aponta. 

Roscoe defende ainda a reforma administrativa. “Temos de reduzir o tamanho do Estado, torná-lo mais eficiente, produtivo, que atenda a população nos seus anseios e nas suas necessidades. Com a aprovação da administrativa, teremos uma reforma tributária mais efetiva”, afirma.

A Confederação Nacional das Indústria (CNI) diz que é crucial que a reforma tributária avance com celeridade no Senado, mantendo os pontos positivos da proposta aprovada pela Câmara. “O modelo que defendemos elimina o principal obstáculo para o Brasil crescer de forma sustentada, por remover travas ao investimento e promover um ambiente de negócios que favoreça o crescimento das empresas, a geração de emprego e a melhora da renda do brasileiro”, afirma Robson Braga de Andrade, presidente da CNI. 

Marcos Bizarro, prefeito de Coronel Fabriciano e presidente da Associação Mineira de Municípios, disse à reportagem de O Tempo que a entidade sempre esteve a favor da reforma. “Trabalhamos cinco anos juntos no texto básico”, disse. Segundo ele, serão, ao menos, cinco benefícios aos municípios com as mudanças: simplificação tributária, tributo no destino e não na origem, fim da guerra fiscal, previsão de aumento de receita (mínimo de 1.2 a 4.9 %) e fim de pagamento de impostos entre ente federado ( município e estado ). 

Recentemente, a Confederação Nacional de Municípios (CNM) já havia defendido publicamente a reforma. Para a entidade, não é verdade que os municípios perderão autonomia e bilhões em arrecadação. “Ao contrário,eles terão total autonomia garantida pela Constituição na definição de alíquota própria para arrecadar o IBS, com a possibilidade de tributar todo consumo de bens e serviços no seu território. Além disso, a arrecadação municipal vai crescer acima do que cresceria sem reforma”, detalhou a entidade, em nota, no dia 5. 

Também em nota, a Febraban disse que a reforma tributária é uma das prioridades da agenda econômica do país e que defende um modelo tributário neutro, simples, equilibrado e transparente. Isaac Sidney, presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), diz que o sistema atual de tributação é um entrave para o crescimento: reduz a produtividade das empresas, impede a alocação eficiente de recursos e gera um nível de litigiosidade na sociedade sem paralelo nos demais países, tanto nos desenvolvidos como nos emergentes comparáveis ao Brasil. “O pior cenário seria ficarmos presos na falta de consenso na busca de uma reforma ideal e deixar o assunto se arrastar ainda mais por meses e anos a fio”, observa.

A ACMinas, Associação Empresarial e Comercial de Minas, foi procurada pela reportagem de O Tempo, mas disse que não vai se pronunciar sobre a Reforma Tributária, até a decisão do Senado. 

Já a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) disse, por meio de nota, que considera que houve "grandes avanços" no texto da reforma tributária e chamou de "um momento histórico esperado há décadas". “Haverá uma realidade fiscal mais transparente, mais clara e com maior segurança jurídica, o que vai afetar de forma positiva toda a economia. Estamos trazendo ao Brasil perspectivas que mundialmente deram certo para melhorar o ambiente de negócios e alavancar o desenvolvimento do País”, diz o presidente da CNC, José Roberto Tadros.

Veja nota da CNC na íntegra:

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) considera que houve grandes avanços no texto da reforma tributária aprovado pela Câmara dos Deputados em segundo turno na madrugada desta sexta-feira (7 de julho), um momento histórico esperado há décadas. “Haverá uma realidade fiscal mais transparente, mais clara e com maior segurança jurídica, o que vai afetar de forma positiva toda a economia. Estamos trazendo ao Brasil perspectivas que mundialmente deram certo para melhorar o ambiente de negócios e alavancar o desenvolvimento do País”, diz o presidente da CNC, José Roberto Tadros.

Desde o início das atividades do Grupo de Trabalho, formado na Câmara dos Deputados para discutir a pauta, a Confederação participou ativamente dos debates e audiências públicas, além de realizar estudos próprios sobre o tema. Isso culminou no atendimento de importantes demandas do setor terciário.

O principal ponto de melhoria é a garantia, pela Constituição Federal, da não cumulatividade plena: o texto deixa explícito que o imposto único “será não cumulativo, compensando-se o imposto devido pelo contribuinte com o montante cobrado sobre todas as operações nas quais seja adquirente de bem, material ou imaterial, ou serviço, excetuadas exclusivamente as consideradas de uso ou consumo pessoal, nos termos da lei complementar, e as hipóteses previstas nesta Constituição”. O princípio da não cumulatividade evita a incidência de impostos em cascata e consequente oneração do contribuinte final.

Alíquotas diferenciadas para vários segmentos dos serviços

Outro ponto defendido pela CNC e que passou a constar no texto aprovado pelos deputados é a garantia de regime tributário favorecido aos bens produzidos nas Áreas de Livre Comércio, a exemplo do que ocorre com a Zona Franca de Manaus. Em relação ao Simples Nacional, a reforma tributária aprovada prevê, acatando pleito do setor terciário, que as empresas inscritas nesse regime fiscal também gerem créditos, mantendo a competitividade de micro e pequenas empresas perante as de médio e grande portes.

Além disso, a CNC analisa como muito positivo o tratamento diferenciado disposto no texto para serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, bares, restaurantes, aviação regional e operações com bens imóveis. Outro importante destaque é a redução de 60%, podendo chegar a 100%, das alíquotas de imposto para serviços de educação, serviços de saúde, dispositivos médicos, alguns medicamentos (outros terão alíquota zero), transporte público coletivo (podendo chegar à isenção), produtos agropecuários in natura, produtos da cesta básica (insumos agropecuários, alimentos e produtos de higiene), atividades desportivas, artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais, dispositivos médicos e de acessibilidade para pessoas com deficiência e medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual.

“A reforma tributária é essencial ao desenvolvimento econômico do País, e a CNC entende que ela atende ao antigo anseio das empresas e da população”, analisa o presidente José Roberto Tadros. No entanto, o trabalho continua. “Estaremos empenhados no Senado, assim como estivemos na Câmara dos Deputados, para fazer frente aos desafios que ainda persistem para o setor de serviços”, conclui Tadros.