Aposentadoria

Se fosse capitalização, quase metade dos mineiros não teria benefícios

Regime em estudo prevê pagamentos por idade, mas não por doença ou acidente; seriam 1,4 milhão de aposentados e pensionistas em Minas sem direito

Por Tatiana Lagôa
Publicado em 12 de janeiro de 2019 | 03:00
 
 
 
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Quase metade (43%) dos 3,3 milhões de mineiros aposentados ou pensionistas não estaria recebendo o benefício se o regime de capitalização já tivesse substituído o modelo atual de previdência. São 1,452 milhão de pessoas que teriam que voltar ao mercado de trabalho para sobreviver, por terem se aposentado por invalidez (doenças e acidentes).

Seguindo os critérios estudados pela equipe do presidente Jair Bolsonaro, esses beneficiários não teriam juntado dinheiro suficiente para ficar em casa. As únicas situações resguardadas no regime de capitalização, que o governo pretende propor, são, a princípio, aposentadorias por idade ou por tempo de contribuição. Hoje, 1,855 milhão de mineiros estão aposentados por esses dois motivos.

Quando analisado todo o Regime Geral de Previdência Social, que inclui benefícios como licença-maternidade e auxílio-doença, o número de pessoas prejudicadas seria maior. Minas Gerais tem 3,978 milhões de beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Desse total, 2,122 milhões não estariam recebendo o recurso se o regime adotado não fosse o atual.

“Na capitalização, as pessoas vão juntando dinheiro e, no fim da vida, resgatam o valor mensalmente. Se alguém sofre um acidente, engravida, fica inválido ou qualquer coisa parecida, ainda não tem dinheiro suficiente para tirar. As pessoas que têm direito, hoje, de receber aposentadoria ou pensão do governo por qualquer motivo que não fosse tempo de contribuição ou idade não conseguiriam”, explica a diretora do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Jane Berwanger.

Ela destaca que no Chile, onde a capitalização foi implantada em 1983, só quem se acidenta no trabalho pode ter algum apoio financeiro, que vem da empresa contratante. Mas esse direito precisa estar especificado em lei.

Separação. Para o advogado previdenciário Rodolpho Eustáquio Rodrigues, justamente por excluir outros tipos de benefícios que não sejam por tempo de contribuição e por idade, a capitalização é inviável no Brasil. Ele acha que a melhor saída seria separar benefícios previdenciários dos acidentários e assistenciais. “Se analisarmos os dados puramente das aposentadorias, (veremos que) o sistema não é deficitário”, defende.

Rentabilidade. Outro ponto de discórdia é o risco que a capitalização envolve. O recurso do trabalhador é administrado por empresas privadas que, caso invistam errado, dividirão o prejuízo com os beneficiários.

“Se quiser garantir vantagem, precisa pagar por ela”

No regime de capitalização, o recebimento de benefícios como licença-maternidade, auxílio-doença e por acidente pode acontecer apenas se o beneficiário pagar um seguro. É como se estivesse pagando por esse risco. Mas, para que isso seja possível, é necessário que o governo inclua essa regra no texto da reforma previdenciária. Nesse caso, o segurado teria que pagar mais caro ou abrir mão de uma parcela do valor que receberia no futuro, já aposentado.

Segundo o sócio da corretora de seguros Segasp Ricardo Tarantello, isso ocorre porque não é viável para o mercado assumir esse custo. E a capitalização é gerenciada por empresas privadas. “Nesse sistema, não dá para imaginar que outros vão pagar por você. Se quiser garantir qualquer vantagem, precisa pagar por ela”, explica.

Enquanto a reforma da Previdência não sai do papel, o governo tenta reduzir o déficit com uma verdadeira caçada aos benefícios indevidos. Segundo o Ministério da Cidadania, alguns benefícios que seriam revisados pelo governo anterior devem entrar nessa nova lista. No país, são 8.779 auxílios-doença e 27.998 aposentadorias por invalidez, somando 36.777 pessoas. Em Minas Gerais, são 564 auxílios-doença e 2.842 aposentadorias por invalidez, 3.406 no total.

Déficit elevado força urgência da revisão

Em dez anos, o déficit do Regime Geral de Previdência Social quadruplicou no país, passando de R$ 44,9 bilhões para R$ 182,4 bilhões, de 2007 a 2017, segundo a Secretaria de Previdência.

Esse aumento da despesa em proporção muito superior à alta da receita é a principal justificativa usada pelo governo para defender a necessidade de mudanças nas regras de aposentadoria. O discurso tem força entre especialistas, que defendem que haja uma revisão o quanto antes. “A expectativa de vida aumentou. Se as pessoas vivem mais, elas precisam trabalhar mais tempo para essa conta fechar”, defende o diretor de economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Andrew Storfer.

Ele acredita, no entanto, que seja necessário focar. “O governo não pode penalizar quem ganha salário mínimo. Tem que buscar os benefícios mais altos, como os dos servidores da União”, disse.

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