Matheus Abreu não tinha um pingo de experiência com balé clássico. O que levou o ator mineiro a se candidatar para o papel principal do filme “Um Lobo entre os Cisnes”, que estreia hoje nos cinemas, foi a vontade de contar a história de Thiago Soares, bailarino brasileiro que enfrentou vários desafios para sair de Vila Isabel, na Zona Norte do Rio de Janeiro, e chegar ao estrelato como primeiro bailarino do Royal Ballet, em solo britânico.

“Eu conheci a história do Thiago junto com o teste. É uma lástima não conhecermos histórias tão incríveis quanto a do Thiago e de outros brasileiros. A importância do filme também está aí, ao falarmos dos nossos”, registra Abreu, que foi revelado para a telona no filme “O Segredo dos Diamantes”, de Helvécio Ratton, quando tinha 17 anos. Hoje, com 28, o filho de Ouro Branco já participou de várias novelas na TV.

Na pele de Thiago ele tem a grande chance de sua carreira, construindo um personagem que o desafiou desde o primeiro instante. “Eu percebi que o teste já seria um grande desafio, porque eu não tinha nenhuma experiência com dança, mas tinha muita vontade de viver essa trajetória que o Thiago passa. Ela combina um pouco com a minha, pois ele também veio cru do hip-hop”, conta o ator mineiro. 

“O balé chegou para ele um pouco mais tarde do que normalmente a gente espera de um bailarino com a importância tão grande quanto a dele. Thiago começou com 15 anos no balé, e a minha primeira experiência foi com Manoel Francisco no teste. O Thiago também estava no teste. Então ele me pediu para pôr a mão na barra e me deu uma miniaula de balé. Depois soltou uma música clássica e pediu para eu dançar. Isso aconteceu antes do teste de atuação”, lembra.

Abreu também teve que aprender a dançar o hip-hop, o que não foi mais fácil do que o balé, ao contrário do que se pode imaginar. “São formas de expressão do movimento muito distintas e dificílimas, mas o hip-hop é mais amplo, ao englobar a música, o grafite, a dança. A gente escolheu focar o break, que é o mais fisicamente difícil. O balé nem é preciso falar, sobre o que ele pede ao nosso corpo. Ele é totalmente antianatômico”. 

Matheus Abreu assinala que trabalhar o corpo em formas diferentes representou um esforço e tanto, mas ele descobriu “formas de trazer isso para a minha vida e de uma forma prazerosa, apesar de toda a dor”. Sim, a dor foi uma parceira constante de Abreu durante as filmagens dirigidas por Marcos Schechtman e Helena Varvaki. “Eu acordava todos os dias com dores no corpo em lugares que nem imaginava que eu acessava”, diverte-se.

A história sobre o bailarino brasileiro nasceu de um encontro entre Schechtman e Soares há cerca de dez anos. “Foi uma tarde aqui em São Paulo, em que falamos por muitas horas com o Thiago, abrindo o coração de uma maneira tão bonita, falando da relação dele com o Dino e da necessidade que ele sentia de fazer um tributo, de ter uma oportunidade de dizer ‘obrigado’ a tudo que Dino tinha feito. Aquela cumplicidade tão profunda entre dois seres humanos me impactou muito. E achei que daria uma história muito bonita no cinema”, diz o diretor.

Falecido em 2006, Dino Garcia Carrera era um coreógrafo cubano exigente e foi quem impôs a disciplina que faltava ao jovem oriundo do hip-hop. Em “Um Lobo entre os Cisnes”, ele é interpretado pelo argentino Dario Grandinetti, que trabalhou em “Fale com Ela”, de Pedro Almodóvar. “Foi um encontro muito especial, porque foi regado a emoção, um momento de refletir sobre o Dino e de me abrir ali”, salienta Soares.

“Eu nunca pensei que a minha vida pudesse virar um filme. Fiquei muito emocionado por dois motivos. Primeiro, porque entrei nessa vida de viver de dança por caminhos muito diferentes. Não importa de onde você vem, sua classe social ou seus parâmetros familiares, é possível sonhar e encontrar a sua verdadeira voz artística”, destaca o bailarino, que foi coreógrafo da comissão de frente da Imperatriz Leopoldinense no Carnaval de 2022.

“Segundo, porque chamou muita atenção do Marcos esse recorte com o Dino. Eu acredito que sou o produto de muitas mãos, muitas pessoas me ajudaram e me incentivaram em momentos cruciais, mas essa mensagem sobre esse período específico com o Dino foi realmente extraordinário e emocionante, porque teve este peso de um jovem descobrir o que é um amor incondicional fora de sua própria casa”, comenta.