Em meados de julho, Andy Byron, então CEO da Astronomer, Kristin Cabot, à época diretora de RH da mesma empresa, foram flagrados abraçadinhos pela “câmera do beijo” em um show do Coldplay em Boston, nos Estados Unidos. Eles ficaram constrangidos e tentaram se esconder e até Chris Martin, vocalista da banda, percebeu o que estava rolando ali. “Estão tendo um caso ou são muito tímidos”, brincou, sem saber que a primeira opção era a correta – ambos eram casados.
As imagens rodaram o mundo, viralizaram nas redes sociais e a dupla foi demitida da empresa. Esse episódio, conhecido por milhões e milhões de pessoas, já não é mais manchete nos portais de notícias, mas teve um desdobramento inusitado: o Pornhub, popular site de conteúdo adulto, sentiu os efeitos do viral.
Segundo o New York Post, os termos “Coldplay” e “vídeos quentes” foram parar no topo das buscas, com destaque para “infidelidade”. De acordo com o Pornhub, nas 24 horas seguintes à chegada do vídeo à internet, as buscas por “caso no escritório” cresceram 18%; “sexo no escritório” teve alta de 21%; “pego traindo” subiu 22%; “marido infiel” avançou 29%; e “casal infiel” registrou um salto de 31%.
O episódio, aparentemente, evidenciou algo comum a muita gente: a associação entre traição, sexo e ambiente de trabalho. Em paralelo a isso, uma pesquisa divulgada em junho pela plataforma EduBirdie e realizada com 2.000 integrantes da geração Z – pessoas nascidas de meados dos anos 1990 a 2010 – mostrou que 38% gostariam que o ambiente de trabalho tivesse um espaço privado para relações sexuais – seja com colegas, seja sozinhos, o chamado sexo solitário.
O psicólogo e sexólogo Rodrigo Torres observa que a curiosidade em torno do sexo no ambiente de trabalho, bem como sua presença no imaginário coletivo, pode estar relacionada a noções de poder, autoridade ou à transgressão de regras, mas vai além. O especialista afirma que há outras questões associadas.
“O ambiente de trabalho é um lugar em que a gente passa a maior parte do nosso tempo acordado e a sexualidade não escolhe hora. O desejo sexual pode surgir nesses ambientes e nesses momentos. Eu acho que associar isso a um fetiche é delicado”, pondera Torres.
Segundo o terapeuta sexual, a cultura pop e principalmente a pornografia influenciam e reforçam a ideia do ambiente de trabalho como local em que tensões sexuais, desejo e tesão estão à flor da pele: “Desde a década de 1980, a pornografia tem funcionado como uma espécie de educação sexual, moldada principalmente pelos roteiros criados por homens. A ideia de escritório, transgressão e traição, muito presente nesses filmes fabricados com roteirinhos bobos, acabou sendo popularizada e hoje funciona mais como clickbait do que como representação realista.”
Sexo no trabalho: sim ou não?
O tema não é consenso. Para o auxiliar de tecnologia da informação, André Teixeira, de 25 anos, o envolvimento sexual com colegas de trabalho é algo que pode acontecer naturalmente. “O trabalho como um ambiente social já abre esse espaço, as pessoas passam várias horas do dia ali e pode acabar acontecendo”, avalia.
Outro entevistado pelo Interessa, o videomaker Domminic Arcanjo, de 20 anos, diz que é preciso separar as coisas e nem todo mundo consegue: “Trazer um relacionamento para o ambiente de trabalho pode ser muito ruim se as pessoas não tiverem maturidade suficiente para dividir o que é trabalho e o que é o relacionamento”.
Sobre empresas reservarem um espaço exclusivo para relações sexuais, o radialista Leandro Alves, de 45 anos, comenta que “se fosse solteiro e tivesse esse ambiente o trabalho seria uma coisa a se pensar, mas como as empresas ainda não fizeram isso, acho errado, antiético e antiprofissional transar no local de trabalho”.
De acordo com a psicóloga e educadora sexual Cida Lopes, o desejo de que empresas adotem salas para práticas sexuais mostra uma tendência a erotizar o ambiente de trabalho, algo que pode entrar em choque com certos códigos do mundo corporativo.
“Para mim, na prática, seria um campo minado ético e jurídico entre o consentimento, o assédio, a produtividade e a reputação. Provavelmente funcionaria apenas em nichos muito específicos, em empresas ultralibertárias ou experimentais, mas dificilmente, eu acredito, em ambientes cooperativos tradicionais, comenta a sexóloga.
A estudante Yasmin Carneiro, de 20 anos, conta que já viveu um breve relacionamento com um colega de trabalho, mas tudo aconteceu da porta do ambiente profissional para fora. Sobre a tal “sala do amor”, ela diz que teria vergonha de usar o espaço. Pertencente à geração Z, Yasmin acredita que seus contemporâneos tratam o sexo com menos amarras e constrangimentos: “É algo normal, do cotidiano, não precisa desse tabu”.
Riscos e impactos negativos
Riscos éticos, eventuais assédios, exposições desnecessárias, vazamento de informações pessoais, dificuldade em separar vida pessoal e profissional e prejuízo à reputação das pessoas envolvidas.
Segundo a psicóloga e sexóloga Cida Lopes, o envolvimento afetivo e sexual com um colega de trabalho pode ocorrer de forma natural e ser vivido como uma aventura sem causar prejuízos, mas também pode gerar impactos altamente negativos.
“Nas relações de trabalho pode envolver assimetria de poder de chefe e subordinado, por exemplo. Mesmo quando há consentimento, pode haver dúvidas sobre pressão, coerção ou favorecimento. Muitas empresas têm políticas explícitas contra relações íntimas no ambiente de trabalho e violar essas regras pode gerar advertência e até mesmo demissão”, ressalta a especialista. (Com Rayllan Oliveira)