Peça fundamental da poesia clássica indiana, “Canto para Govinda” narra em um ritmo intenso de dança a história de amor entre os pastores Govinda e Rādhā, oscilando entre a dimensão do terreno e a do místico. Esse clássico, composto no século XII por Jayadeva, recebe nova tradução do sânscrito, introdução e notas feitas por João Carlos B. Gonçalves, linguista, tradutor, professor de língua sânscrita e literatura filosófica da Índia Antiga no Ashram Urbano. 

“O livro privilegia a sonoridade musical e contextualiza termos pouco conhecidos da tradição indiana, que inspirou artistas de diversas áreas ao longo dos séculos, tornando-se central na música e na dança indiana, além de fonte mitológica riquíssima para estudantes da filosofia da ioga. A história de amor entre os pastores Govinda e Rādhā desfila por diversos estágios, da separação à união carnal, habitando ao mesmo tempo a dimensão erótica e a mística”, comenta o professor. 
“Canto para Govinda” é um poema do século XII, composto em sânscrito, em algum lugar na região onde hoje estão os Estados de Bengala e Orissa, na Índia. “Trata-se de uma obra de pouco menos de 300 estrofes, divididas em 12 capítulos, que, por sua vez, contêm 24 canções. Pela história da representação desse poema, sabemos que suas canções eram cantadas – são até hoje – e que já no século XIV sua performance era realizada em templo hinduísta”, diz Gonçalves. 

O título original da obra, “Canto para Govinda”, é a soma das palavras “gīta” e “Govinda”. “Gīta” significa “cantado” e “canto”, no sentido de “ato de cantar”. “Govinda” é um nome próprio que possivelmente traz em sua etimologia uma relação com o sentido de “pastor” ou “chefe dos pastores”. 

“Ele é um entre muitos nomes atribuídos à figura divina que se popularizou muito além da Índia sob o nome de Kṛṣṇa, deus que tem fundamentalmente três tipos de representação: um bebê ou uma criança meiga e ao mesmo tempo incontrolável; um príncipe guerreiro de sabedoria infinita; e um pastor jovem de encantos infinitos. No poema, o pastor é a figura evocada. Gītagovinda significa ‘Govinda cantado’ ou ‘Govinda (retratado) em canto’. Ou também ‘Govinda em poesia cantada’”, ensina o professor. 

Segundo ele, “o poema narra a história de amor entre o pastor Govinda e a pastora Rādhā, historicamente interpretado em planos de leitura que vão do amor carnal ao amor místico e devocional. A estrutura do poema traz duas dimensões de vozes principais: as estrofes narrativas e a maior parte das 24 canções, que expressam as vozes dos personagens. Nessas canções, que são falas entremeadas pelos versos narrativos, o poema traz um repertório exemplar dos sentimentos amorosos pelos quais o casal passa ao longo do poema, que começa com uma separação”. 

O poema tem como cenário os bosques de Vṛndā. “A personalidade de Govinda é prevalentemente caracterizada como a do amante, mas também como príncipe guerreiro e menino traquinas. Dessas narrativas surgem referências aos feitos míticos da dimensão divina do personagem, a começar pela primeira canção, que o identifica com Viṣṇu, quando evoca dez outras encarnações desse deus”, comenta o professor. 

Lançamento

“Canto para Govinda”, Jayadeva, tradução, notas e introdução de João Carlos B. Gonçalves, editora: Penguin-Companhia, 160 páginas, R$ 44,90 (capa comum) e R$ 27,90 (e-book). 

Divindade e humanidade 

 A narrativa do épico indiano “relata os altos e baixos do casal Govinda e Rādhā, no ambiente primaveril rodeado da presença invisível e avassaladora de Kāmadeva, ‘deus do amor’, que fará os amantes experimentarem as emoções próprias às relações amorosas: ciúme, dor da separação, mágoa entre os amantes, arrependimento, anseio pela reconciliação e desejo sexual”, comenta o professor João Carlos B. Gonçalves. 

Segundo ele, o Gītagovinda “não é nem uma alegoria religiosa, nem um poema puramente secular. O poeta justapôs descrições convencionais do jogo amoroso carnal com expressões tradicionais de devoção, criando uma relação ambígua entre as dimensões sagradas e profanas do amor. É nesse sentido que encontramos a graça da linguagem poética, que tem o poder de sugerir além do que está dito”. 

E finaliza: “Antes de tentar resolver o dilema da relação entre divindade e humanidade, o ‘Canto para Govinda’ parte da complexidade dessas experiências; não as trata como um problema a ser resolvido, mas como algo da dimensão humana a ser retratado por meio linguagem verbal e em seu uso mais complexo: a poesia”. (AED) 

Lançamentos  

 “Encontrei um Pai”, Junior Rostirola, editora Vida, 224 páginas, R$ 69,90. 

O livro aborda o amor ao próximo, a misericórdia, a graça, a fé e a transformação. O autor diz que é possível se libertar da orfandade e encontrar o Pai. Para isso, é necessário identificar o problema, enfrentar o medo e mudar a maneira de pensar a dor. 

“O Cabelo de Joyce e o Espírito Santo”, Esau McCaulley, editora Quitanda, 32 páginas, R$ 58,90. 

O autor traz assuntos profundos em uma linguagem simples – destinada, principalmente, às crianças negras de origem cristã. Para o escritor, a diversidade é a imagem e semelhança de Deus. 

“Pequenos Traumas: Superando as barreiras emocionais que afetam a nossa saúde mental”, Meg Arroll, editora Vestígio, 288 páginas, R$ 67,90. 

Muitas vezes, não percebemos que as pequenas feridas emocionais vão se acumulando até transbordarem em uma enxurrada de estresse, ansiedade e depressão. O livro mostra como identificar os pequenos traumas que afetam a saúde física e mental.