Idade

Geração com mais de 50 anos revoluciona a velhice

‘Gerontolescência’ descreve pessoas nessa faixa etária que revivem comportamento jovem, mas especialista teme ‘infantilização’


Publicado em 09 de julho de 2017 | 03:00
 
 
 
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Eles têm mais de 50, 60 anos, mas não se consideram idosos. Pelo contrário. É nessa fase que eles muitas vezes estão redescobrindo o prazer de viver. Os “gerontolescentes”, como passaram a ser conhecidas essas pessoas – por apresentarem esse espírito jovem semelhante ao da adolescência, porém na terceira idade –, estão tirando do papel vários projetos que estavam engavetados e descobrindo novos caminhos sobre como se vive e se percebe a velhice.

No Brasil, o crescimento da população idosa ocorre de forma progressiva. Hoje são 24 milhões de pessoas com mais de 61 anos (17% da população), e a estimativa para 2050 poderá exceder 66,5 milhões, chegando a representar quase 30% do total da população brasileira.

O próprio conceito etário baseado exclusivamente na idade cronológica está modificando-se ao longo do tempo. A idade considerada idosa pela Organização Mundial da Saúde (OMS) nos países em desenvolvimento é acima de 60 anos e, nos países desenvolvidos, 65 anos. Porém, a OMS já criou a terminologia “muito idoso” para designar o indivíduo que chega aos 80 anos.

Já o termo “gerontolescência” está no “Glossário do Envelhecimento Ativo”, uma publicação divulgada em 2015 pelo Centro Internacional de Longevidade Brasil (ILC-Brasil), instituição presidida por Alexandre Kalache, um dos mais reconhecidos especialistas em envelhecimento no país.

De acordo com o documento, a geração dos baby boomers, que nasceu no pós-guerra (1945-1964), lutou contra o racismo, a homofobia, o autoritarismo político, entre outras bandeiras, e incorpora características distintas. “Tem melhor nível de escolaridade do que qualquer outra que a precedeu, e há um espírito rebelde e ativista em seu cerne”, diz o texto.

O operador de máquinas Luiz Gonzaga da Silva Neto, 55, é um exemplo de quem tenta manter esse temperamento jovem de um jeito bem radical. Todo mês ele se dá de presente um salto de paraquedas. A primeira experiência foi aos 50 anos, mas, para ele, a idade não significa nada. “O que manda é o espírito mental. Conheço jovem com espírito de idoso e idoso com espírito de jovem. Após os saltos, me sinto mais disposto. Quando abandono a aeronave, todo estresse e cansaço ficam lá em cima. Não existe melhor tratamento para as preocupações do dia a dia”, diz.

Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – Regional Minas Gerais (SBGG), Rodrigo Ribeiro dos Santos, o termo “gerontolescência” ainda não é oficialmente reconhecido. “Existe o envelhecimento bem-sucedido, que é a pessoa que atinge grandes idades e continua independente para as suas atividades, e o envelhecimento patológico, quando é acrescido de doenças e condições clínicas”, afirma.

Um erro bastante comum, segundo Santos, é acreditar que o modo como as pessoas vão envelhecer depende mais dos aspectos genéticos do que ambientais. “Até os 75 anos, a forma como se envelhece é praticamente determinada pelas questões ambientais”, diz. Com o maior acesso a saúde e informação, o número de octogenários e centenários tem crescido. Mais do que nunca, as pessoas devem ter certeza de que vão viver muito. “Os anos vividos como idoso estão sendo mais longos do que qualquer outro ciclo da vida. Dos 60 aos 90 anos, são 30 anos”, explica.

Infantilização. Assistente social e membro da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, Naira Dutra Lemos também não concorda com a nomenclatura recém-criada, pois, segundo ela, tende a infantilizar ainda mais o idoso.

“Nessa fase eles não voltam a ser adolescentes, mas passam a viver uma nova fase, com maior liberdade para fazer novas coisas e projetos de vida, que são bem distantes dos de um adolescente. Coisas que talvez só esteja fazendo agora porque antes não tiveram tempo, seja estudar ou viajar o mundo, e isso é absolutamente comum e saudável”, analisa.

FOTO: Leo Fontes
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A costureira Vânia da Conceição, 59, se sente mais jovem do que a sua idade cronológica

Para os novos velhos, a vida renasce aos 60

Há 50 anos, o velho aposentado era visto como aquela pessoa de pijama, sentado na poltrona e sem fazer qualquer esforço, muitas vezes até sob recomendação médica. Esse paradigma foi totalmente rechaçado pela medicina e por quem planeja se aposentar, como a costureira Vânia da Conceição Santos, 59.

Cheia de planos, ela conta que nunca esperou tanto que o mês de agosto chegasse para completar seus 60 anos e se aposentar. Além de costurar, Vânia viaja, faz pilates, participa do projeto Universidade Aberta, da Faculdade Una em Contagem, onde estuda direito, finanças e informática, e planeja participar como voluntária de alguma ONG e conhecer o Sul do país.

Apesar da ter a genética a seu favor, uma vez que tem a mãe viva, com 82 anos, a costureira quer fazer diferente. “Minha mãe ficou viúva aos 38 anos e entregou a vida. Como tenho esse mau exemplo, não quero ser assim, pois ela parou no tempo. Eu, às vezes, me assusto com a minha idade, mas me vejo com uns 35, 40 anos. Acho que a terceira idade é o período para se realizarem os planos pelos quais se batalhou na vida”, afirma.

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