“Ter uma casa ou um apartamento, seja alugado, seja comprado, seja financiado, não garante que você tenha um lar. Um imóvel é construído com tijolos, concreto e pode ser adquirido de acordo com o poder de compra de cada um, mas um lar é diferente. Um lar não pode ser comprado, ele precisa ser construído com muita compreensão, com uma relação saudável com as outras pessoas”, afirma o pensador, estatístico e futurologista do morar Marcus Araújo. É a partir dessa premissa que ele se une ao escritor e psiquiatra Augusto Cury na obra “Mentes Saudáveis, Lares Felizes”, livro que traz uma relação entre saúde mental, moradia e felicidade das famílias. 
 
Como uma espécie de guia, a obra mergulha nas mudanças ocorridas ao longo dos últimos anos, explicando como as várias transformações – não só tecnológicas, mas também comportamentais – tiveram impacto no relacionamento entre as pessoas e, consequentemente, na relação com o próprio lar. “Estamos observando um fenômeno de redução do tamanho das famílias. Para se ter uma ideia, segundo o IBGE, temos hoje aproximadamente 8.000 nascimentos por dia. Isso pode parecer muito, mas é o nosso menor número em cem anos. Em 1920, nosso crescimento populacional foi de 75% e, agora, tudo indica que, no novo Censo, ele deve ficar abaixo dos 10%. Ou seja, estamos ficando com menos gente em casa”, aponta Araújo.  
 
Especialista no setor imobiliário, o estatístico observa que essa diminuição não impacta somente o número de pessoas nas residências, mas os próprios sentimentos em relação à habitação e à própria vida. “São poucas pessoas dentro de casa e, na verdade, elas estão navegando em outro mundo, que não é físico. Os espaços estão sendo menos utilizados. Às vezes a pessoa tem, por exemplo, uma varanda gourmet, mas nas sextas à noite ela não reúne ninguém ali, e fica em um canto utilizando os espaços do mundo virtual”.  
 
Segundo ele, esse apelo forte do universo digital faz com que as pessoas deixem de interagir e dar atenção àqueles que estão próximos delas. “Muitas vezes essas pessoas estão dando mais atenção para as pessoas que estão no ambiente virtual do que para as pessoas que estão no ambiente físico, que são aquelas com quem eles dividem a vida diretamente”, afirma. Araújo pontua que essas transformações acabam criando uma geração de pessoas mais solitárias e estressadas. “Estamos vivendo a era da ansiedade, as famílias modernas estão se tornando quase um grupo de estranhos que dividem a mesma casa”. 
 
Diante desses desafios e impactos, o livro propõe mudanças que incluem o ambiente em que residimos – espaço em que passamos cerca de 57% das nossas vidas, conforme dados apresentados pelo estatístico. “A proposta do livro é criar um novo olhar, para que a gente volte a valorizar o contato pessoal e o respeito”, explica o estatístico. “Quando falo de respeito, ele não é só o respeito entre pais e filhos, filhos e pais, cônjuges, é um respeito pela convivência. Na hora da alimentação, por exemplo, todos podem repousar os smartphones na mesa e fazer um elogio a quem está fazendo a refeição com você, dar um sorriso caloroso. O livro dá essa importância para um momento, que é de valorizar essas relações com as pessoas que estão convivendo com a gente”, completa.  
 
 

Vivendo só

Os ensinamentos não se restringem apenas àquelas que vivem em família. Marcus Araújo também dá dicas que podem transformar as residências daqueles que vivem sozinhos em lares felizes. “A dica número 1, muito valiosa, é amar a si mesmo em primeiro lugar para depois amar o outro. Não podemos somente nos entregar”, destaca. O especialista pontua ainda que, assim como as pessoas que vivem com outras no mesmo ambiente, quem opta por morar sem mais ninguém também deve buscar construir relações que ultrapassem o ambiente virtual.  
 
A criação de memórias afetivas no ambiente da casa também é mais uma orientação dada por Araújo e válida para todas as pessoas, independentemente do número de moradores na casa. “Até para ser feliz, precisamos dedicar nosso tempo. A felicidade não cai no nosso colo, ela precisa ser buscada e construída. É preciso investir para que haja momentos felizes em nossos lares. E que momentos são esses? Convidar alguém para uma refeição, assistir a uma série ou um filme juntos, por exemplo. Todas essas atitudes nos geram memórias afetivas positivas, que o doutor Augusto Cury chama de ‘janelas light’, que são essas janelas da memória que registram os momentos que dificilmente serão esquecidos”.