Antônio de Lisboa, ou Antônio de Pádua, considerado o “santo dos milagres”, foi o primeiro escritor português cuja obra teve um forte impacto no mundo todo. “Embora partilhem das limitações da Idade média, seus textos propõem uma vivência direta da sabedoria espiritual e não perdem força com a passagem do tempo”, comenta Carlos Cardoso Aveline, teosofista e editor do site www.filosofiaesoterica.com, em que reconstrói a trajetória de Antônio. 

No próximo dia 13 comemora-se o seu dia, na verdade, data de sua morte, em 1231. Nascido em Portugal em torno de 1190 ou 1195, ele foi contemporâneo de Francisco de Assis e o principal pensador dos primeiros anos da ordem franciscana. Muitas de suas ideias continuam atuais. 

Aveline destaca que “a imagem popular do santo emerge da imaginação criadora dos cristãos e tem vida própria. As lendas sobre os milagres feitos por ele chamam atenção pela falta de realismo. O santo Antônio da opinião pública é intensamente independente da verdade histórica. Não há fonte religiosa, histórica ou filosófica descrevendo Antônio como arranjador de casamentos ou ‘santo das coisas que não encontramos’”. 

Aveline comenta que os escritos do santo possuem vários pontos em comum com a teosofia de Helena Blavatsky, “como o ensino de uma vida pura, baseada na simplicidade voluntária; as denúncias, sem meias-palavras, da corrupção do alto clero e dos prelados; a consciência de que o caminho espiritual consiste em avançar pela escada mística que liga céu e terra; e a necessidade da independência individual de cada aprendiz. A autorresponsabilidade é fundamental: não basta acreditar mecanicamente em alguma coisa”. 

O “santo dos milagres” foi  criado depois da sua morte. “As coleções de relatos dos seus feitos extraordinários começaram a circular séculos depois de ele viver, e isso por obra e graça dos jesuítas bolandistas – peritos em propaganda –, e não dos franciscanos. Só mais tarde foram incorporadas pela ordem franciscana, como um enxerto”, comenta o teosofista. 

O mesmo ocorre, diz ele, com a maior parte dos santos. “O  conceito de biografia documentada é coisa recente, especialmente no campo religioso. As lendas biográficas são quase sempre parábolas a interpretar, ensinamentos em um código poético, e não registros literais da vida de alguém”. 

Sendo assim, “as histórias de milagres de santo Antônio devem ser lidas pelo seu valor em si, e não como documentos históricos. São obras que pertencem à tradição oral dos povos. Muitas delas podem ser vistas como poemas que encerram lições. Outras têm escasso valor. Não vale a pena cair no excesso de ingenuidade. Algumas das histórias exemplificam o uso das potencialidades sutis da alma humana”, ressalta o teosofista. 

Cristianismo incorpora aspectos centrais da filosofia estoica

 Os “milagres” foram todos atribuídos a santo Antônio após sua morte: é o que reza a “Legenda Prima”, o mais importante documento sobre sua vida. 

É o caso da conversa que Antônio teve, logo depois de morrer, com um dos seus melhores amigos. “No dia em que faleceu, diz a lenda, Antônio apareceu diante do abade de Vercelli, seu amigo, que estava sozinho em sua cela meditando. Depois de se cumprimentarem, Antônio disse que ‘havia deixado em Pádua o seu burrinho’ e que estava em viagem para ‘a sua pátria’”, comenta Carlos Aveline. 

O abade pensou que Antônio iria para Portugal. “Mas ‘deixar o burrinho’ significava ‘abandonar o corpo físico’. Antônio estava a caminho da sua verdadeira pátria, o mundo celeste”, explica o tesosofista. 

No Novo Testamento, diz Aveline, Jesus afirma que cada um deve carregar a sua cruz, ao longo do caminho. “A cruz é o carma. O cristianismo incorpora aspectos centrais da filosofia estoica. O carma de um indivíduo contém as lições que ele precisa aprender. Nenhuma igreja, nenhum mestre ou santo podem – por meio do perdão – cancelar o carma de alguém, ou seja, anular o resultado de seus erros e de seus acertos”. (AED) 

 Simbolismo do Menino Jesus no colo 

Qual a origem da lenda sobre a imagem de santo Antônio com Jesus nos braços? “Certa vez, ele foi a uma cidade pregar, e o fidalgo local deu-lhe um quarto retirado para que tivesse sossego. Curioso, o fidalgo resolveu espiar por uma fresta e ver o que o santo estava fazendo”, relata Carlos Aveline. 

Ele, então, viu Antônio com o Menino Jesus, alegre e contente, nos braços. “O fidalgo contou ao santo o que vira, e Antônio pediu que ele jurasse nada contar a ninguém enquanto ele vivesse. Na filosofia esotérica, Jesus representa Buddhi, a alma espiritual e imortal de cada ser humano. Antônio tinha Jesus nos braços, isto é, estava em pleno contato com sua própria alma imortal”, explica o teosofista.  (AED)