Com 20 anos de carreira no ensino da rede municipal de Belo Horizonte e experiência em escolas particulares, a pedagoga Márcia Libânio, pós-graduada em neurociência aplicada à educação, conta que, quando a prefeitura suspendeu as aulas presenciais, percebeu que algo grave acontecia. Era março de 2020.
“Fomos mandados para casa e ficamos aguardando como seria nosso trabalho a partir dali. Deu angústia, medo. Achávamos que seria algo para alguns meses. A direção da escola nos apoiou e nos ouviu muito e começou a formular planos de trabalho a partir das diretrizes da Secretaria Municipal de Educação (Smed-PBH). Começamos a produzir atividades de acordo com a idade dos nossos alunos – no meu caso, alfabetização do segundo e do terceiro ano. A preocupação era que nosso material fosse acessível para que as crianças pudessem fazer as atividades propostas e os familiares pudessem ajudar”, conta a professora da Escola Municipal Imaco.
Como para muitos alunos o acesso à internet e ao computador não era uma realidade, inicialmente as atividades foram repassadas para o celular dos pais. “Alguns problemas foram detectados nesse tipo de solução, porque muitas famílias têm um celular apenas. Fizemos reuniões virtuais com os pais para entender as questões e buscar alternativas. Foram muitas as dificuldades com a alfabetização, pois é fundamental trabalharmos a consciência fonológica: elas precisam ouvir o que estamos falando para poder escrever e esse momentos não tivemos”, lembra.
Márcia se angustiou em vários momentos, principalmente com o retorno presencial em 2021, quando a maioria das pessoas não tinha a segunda dose da vacina. “Eram muitas as incertezas impostas pela pandemia e com o futuro. Perdemos colegas para a Covid, o processo foi difícil, recebi alunos com níveis muito diferentes de alfabetização e não pude dar a atenção individualizada comum nessa etapa da aprendizagem, pois tinha de manter 1m de distância. Foi muito difícil”, relata.
No ano passado, com a volta da educação presencial, surgiram novos desafios. Segundo Márcia Libânio, a escola os preparou muito bem para o retorno, com uma série de protocolos. Mas as crianças chegaram com demandas de socialização e, muitas, com questões de desenvolvimento pedagógico.
“A realidade de crianças e jovens em risco social é muito complexa, pois eles têm questões sérias de vida que as impedem de ter um aprendizado melhor. Nós, educadores, fazemos o melhor e o que nos é possível. Demos continuidade aos processos em sala de aula, para que recebessem todo o conteúdo de forma adequada, mas essas perdas durante o isolamento, não sabemos como repará-las. Continuamos tentando entender tudo o que vivenciamos e ainda mantemos cuidados na escola, como a máscara. Eu ainda estranho tudo, tenho medo da transmissão, as relações são sem contato físico. Ficaram sim, esses resquícios, esse medo”, avalia.
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