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Desafio dos cem dias de sexo é benéfico para a vida sexual?

Prática foi defendida pela atriz Heloísa Périssé durante entrevista a podcast

Por Alex Bessas
Publicado em 19 de abril de 2024 | 06:30
 
 

Em entrevista a Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso no podcast Surubaum, a atriz Heloísa Périssé revelou seu segredo para o casamento não cair na rotina. Casada há 22 anos com o diretor Mauro Farias, a humorista contou ter feito sexo com seu marido durante cem dias consecutivos. “O sexo é uma prática, e você coloca isso na sua vida como um hábito, como uma ginástica, como escovar os dentes. E uma vez a gente leu uma reportagem que propunha cem dias seguidos de transa”, refletiu. 

Embora o relato tenha causado estranhamento entre os convidados – a apresentadora Gio Ewbank reagiu com um sonoro “Deus que me livre!” –, Heloísa garantiu que colocar a ideia em prática resultou em benefícios para o seu relacionamento. “Foi sensacional. Você deita, olha seu parceiro, é como se seu corpo ligasse. Um simples toque aciona coisas em você”, garantiu. 

O depoimento, claro, também repercutiu nas redes sociais, dividindo opiniões e causando desconfiança se o “desafio” pode, de fato, favorecer a vida sexual. A resposta, na avaliação do sexólogo Rodrigo Torres, é um convicto “depende”. Para ele, essa visão do sexo defendida pela atriz, entendendo-o como uma prática diária, pode, sim, ser benéfica – mas isso vai variar muito de pessoa para pessoa.  

“Acredito que, quando é uma coisa natural, quando o casal tem desejo suficiente para isso, eu acho que tudo bem, não tem o menor problema”, considera, lembrando que o período escolhido para a experiência não precisa ser de cem dias. “Podem ser 30 dias, talvez 21”, diz. 

Preconceito 

Curiosamente, nas redes, algumas pessoas até se mostraram inclinadas a encarar o “desafio”, mas sobretudo as mulheres apontaram um empecilho para tal: a menstruação. “Trata-se de um pensamento que denota uma visão muito higienista do sexo, que compreende esse sangue – e outros fluidos corporais – como sujo. Por isso, esse período é encarado como se fosse de recolhimento, como se a mulher não pudesse fazer sexo estando menstruada, quando, na verdade, muitas relatam até mais prazer nesse momento”, observa Rodrigo Torres. 

“A grande questão, de fato, é que nem todo mundo vai ter esse desejo de maneira constante”, sinaliza, lembrando que, diferentemente do que sugere o senso comum, a libido (expressão da psicanálise para designar um instinto de viver, usado popularmente para falar sobre o desejo sexual) não é linear. “Portanto, a resposta é que essa ideia pode, sim, ser benéfica para algumas pessoas, mas, para outras, não será”, diz. 

Efeito colateral 

Rodrigo Torres alerta que, sem dúvida, encarar o sexo como uma obrigação ou como meta pode ter o efeito inverso, esfriando a relação. “No caso (do relato de Heloísa Périssé), o casal parece não encarar o sexo como uma obrigação, mas sim como um acordo, um combinado que ambos estão dispostos ou predispostos a cumprir”, contemporiza o especialista, que acrescenta: “Mas é complicado, porque, como expliquei, o nosso desejo não é linear. Então, se pensamos que temos que fazer algo que é para sentir prazer só porque foi o combinado, mesmo sem sentir vontade, há o risco de minar o seu desejo para a próxima vez, porque você acaba não tendo o mecanismo de recompensa ativado. Na verdade, nessa experiência, o que teríamos seria um alívio em cumprir a obrigação”. 

Didaticamente, o especialista compara a situação à obrigação de comer, todos os dias, a comida de que mais gostamos. “É provável que você deixe de gostar dessa comida e deixe de gostar de quem está te obrigando a fazer isso também”, reflete. 

Visão equivocada 

⁠Por fim, ao falar do tema usando expressões como “maratona de sexo”, como a prática sugerida por Heloísa Périssé foi classificada nas redes sociais, Rodrigo Torres salienta que não existe nada que comprove benefícios ou malefícios desse tipo de comportamento. “Não é necessariamente o uso de algumas expressões ou palavras que vão gerar o problema, mas a maneira como o casal interpreta essas expressões”, analisa. 

Feita a ponderação, contudo, o sexólogo reconhece que toda palavra esconde um significado e, de fato, quando dizemos “maratona”, podemos associar com as ideias de esporte, desgaste físico e competição, sugerindo também uma noção pouco saudável de se propor a ir até o limite, se exigindo excessivamente para alcançar uma “alta performance”. “O problema, nesse caso, é comunicar e estimular comparações, é fomentar a busca de um padrão idealizado, que, no fundo, não é real”, reforça. 

“Temos que lembrar que a sexualidade é uma expressão humana biopsicossociocultural e também espiritual, que leva em consideração uma infinidade de fatores. Nossa biologia muda ao longo do tempo, nosso emocional responde aos estímulos que a vivemos. Então, os efeitos que essa prática pode ter não serão sempre positivos, como também não serão, pela prática em si, negativos, uma vez que precisamos considerar diversos outros aspectos e contextos”, complementa.