Mudança de regras

Risco de morte é único critério para classificar agrotóxicos

Anvisa aprovou mudança que reduz número de produtos tidos como “extremamente tóxicos"; entidades fazem ressalvas ao novo marco legal

Qua, 24/07/19 - 06h00
Agrotóxico é usado em plantações para evitar pragas e desperdício | Foto: PHILIPPE HUGUEN/STF/AFP

Um dia depois de autorizar o registro de mais 51 agrotóxicos, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou ontem um novo marco legal para avaliação e classificação de pesticidas. Com a mudança, produtos hoje classificados como “extremamente tóxicos” podem passar a ser incluídos em categorias mais baixas, como moderadamente tóxicos, pouco tóxicos ou com dano agudo improvável à saúde. 

Diante da nova resolução, a própria Anvisa admite que cerca de 500 agroquímicos devem ser reclassificados. Isso porque a agência vai adotar novos critérios e usar apenas estudos de mortalidade para definir a classificação. Assim, só serão considerados na faixa de maior perigo os produtos que apresentarem risco de morte ou outros danos graves à saúde em casos de inalação, ingestão ou contato com a pele.

Em uma primeira avaliação, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) vê com cautela e faz ressalvas às alterações apresentadas. Ocorre que, se anteriormente eram levados em conta estudos de mortalidade em diferentes tipos de exposição para determinar o grau de toxicidade, agora, “os novos critérios estão atentos apenas ao risco agudo de intoxicação, e não levam em conta a exposição crônica e outros tipos de exposição cumulativa a diferentes tipos de agrotóxicos”, critica Rafael Arantes, nutricionista da entidade.

Para técnicos da Anvisa, o modelo que vinha sendo adotado desde 1992 levava a uma classificação equivocada. “Da forma que saía a nossa classificação, ninguém sabia qual era a toxicidade correta”, afirma o gerente geral de toxicologia, Carlos Gomes.

Em outra modificação, se antes testes de irritação dos olhos e da pele levavam a classificações mais restritivas, agora os dados de tais estudos passam a ser considerados apenas para adoção de medidas de alerta nos rótulos e bulas dos produtos. Segundo o gerente de avaliação de segurança toxicológica, Caio Almeida, a inclusão dos estudos de irritação dos olhos e da pele nos critérios acaba fazendo com que a maioria dos agrotóxicos no Brasil seja registrado hoje como “extremamente tóxico”.

A Anvisa argumenta que busca se adequar ao padrão internacional de avaliação e classificação de agrotóxicos, que é indicado pela ONU e adotado por 53 países.

Para Arantes, no entanto, a pretendida pactuação deveria atentar também para outros fatores, como uma mudança da política em relação aos agroquímicos na comunidade internacional e os relatórios da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer ou Cancro (IARC, na sigla inglesa).

Novo modelo pode facilitar registro

À luz da acelerada autorização de agrotóxicos no Brasil em 2019, com média recorde de 1,3 por dia, o nutricionista Rafael Arantes, do Idec, expressa preocupação acerca de uma política que estimule uso mais intensificado de agrotóxicos. “Já temos um cenário preocupante: em termos absolutos, somos os maiores consumidores desses produtos”, alerta.

“A Anvisa deve continuar a ser uma agência que atua visando a proteger a saúde da população brasileira. Não pode se diminuir no seu papel e passar a ser apenas uma agência para homologar, sob justificativas econômicas, maior número de agrotóxicos”, assevera o profissional.

Os técnicos da Anvisa, por outro lado, defendem que o novo modelo será mais restritivo que o atual – apesar da redução no número de produtos tidos como extremamente tóxicos. Isso porque há uma regra que impede o registro de agrotóxicos considerados mais tóxicos do que outros similares e existentes no mercado.

Não há informações, porém, de como ficaria a análise de novos produtos. Em outro ponto, a ideia é que a avaliação dos riscos, etapa que precede o registro, seja facilitada com a mudança.

(Com agências) 

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