O sargento Luís Marcos dos Reis, que é suspeito de pagar as contas da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) com dinheiro vivo repassado por uma empresa de material de construção que tinha contratos com o governo de Jair Bolsonaro (PL), afirmou nesta quinta-feira (24), em depoimento à CPMI do 8 de janeiro, que transferiu R$ 70 mil para o tenente-coronel Mauro Cid dois dias antes dos ataques às sedes dos Três Poderes por ter vendido um carro do ex-ajudante de ordens da Presidência da República.
Marcos dos Reis, que também era assessor de Jair Bolsonaro, está na mira da CPMI por ter subido a rampa do Congresso Nacional em 8 de janeiro em meio aos bolsonaristas que pediam uma intervenção militar, a queda do recém-empossado presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a destituição de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Também há a suspeita do envolvimento dele na incitação aos ataques, inclusive com participação no planejamento e financiamento.
A relatora da CPMI, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), lembrou que Luís Marcos dos Reis recebia, em média, R$ 13 mil por mês, mas o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) enviou um documento à comissão apontando R$ 3 milhões em movimentações atípicas na conta do militar em um ano e meio. Na sessão desta quinta, Eliziane afirmou que, desse valor, constam R$ 70 mil transferidos a Mauro Cid, em 6 de janeiro.
Questionado pela relatora, Luís Marcos dos Reis respondeu que, a pedido de Mauro Cid, anunciou na internet um carro do tenente-coronel, no valor de R$ 72 mil. E que, após ter vendido o veículo, transferiu R$ 70 mil para Cid. “Ele [Mauro Cid] me falou: 'Passa R$ 70 mil, fica para você o restante pelo seu trabalho'”, declarou Luís Marcos dos Reis. Ele negou aos parlamentares ter financiado, organizado ou coordenado os atos de 8 de janeiro.
Questionado sobre as movimentações atípicas apontadas pelo Coaf, o sargento afirmou que as transações em sua conta no ano passado têm relação com aposentadoria da carreira militar, empréstimos pedidos a familiares e a amigos e um consórcio com outros militares. Questionado se alguém da Ajudância de Ordens da Presidência o emprestou dinheiro no ano passado, ele respondeu que sim. Perguntado, então, sobre quem seria a pessoa, disse que não iria responder para não “expor” a pessoa que, segundo ele, não é investigada pela CPI.
Militar não explica dinheiro de empresa de materiais de construção
Partiu da Cedro do Líbano, que tinha contratos com o governo Bolsonaro, o dinheiro usado por Luís Marcos dos Reis para supostamente pagar contas de Michelle Bolsonaro. Ao menos R$ 18 mil foram transferidos da conta da empresa de materiais de construção para o militar, segundo investigação da Polícia Federal.
No depoimento à CPMI, o sargento alegou ter pedido os repasses ao dono da empresa, mas não soube justificar o motivo de as transferências não terem sido feitas por meio da conta bancária do empresário. “Existe muita confusão nesse emaranhado de transações financeiras, que nesta CPMI nós precisamos saber que irrigou o 8 de janeiro”, disse Eliziane Gama.
Sargento diz que subiu no Congresso em 8 de janeiro em 'ato impensado'
Já em relação ao fato de ter subido o Congresso no 8 de janeiro, o sargento disse que foi ao prédio público por mera curiosidade e apenas tirou fotos e depois voltou para a casa, sem nada quebrar.
"Eu estive aqui [no Congresso] no 8 de janeiro. [Primeiro] acompanhei pela minha casa. [...] Assistimos, acompanhando pela televisão. Minha esposa chamou para ir, eu disse: 'Vamos lá, vamos por curiosidade'", afirmou Luís Marcos dos Reis.
Ele alegou a participação nos atos um "ato impensado" e que não havia "ninguém" dizendo que não era permitido subir no Congresso - a atitude é proibida e, há anos, há placas no entorno do prédio a respeito.
"Eu vejo o meu erro. [...] Estava eu de bermuda, saí da minha casa, cheguei por volta de 17h na Esplanada, subi a rampa, tirei foto, cruzei pela [via] N1 o Eixo Monumental e subi em direção à minha casa andando. Este foi um ato impensado. Tirei foto. Subi. [...] Realmente, foi um momento impensado. Se a senhora me perguntar se eu me arrependi, eu me arrependi. Mas não tinha ninguém ali embaixo falando 'não pode subir'", disse o militar à relatora da CPMI.
Reis está preso desde maio acusado de participação no esquema de fraudes nas carteiras de vacinação de Bolsonaro, que também levou Mauro Cid à prisão.
Antes do início do depoimento de Reis, a CPMI aprovou a quebra de sigilos bancário e fiscal da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e do hacker da Vaza Jato Walter Delgatti Netto. Mauro Cid foi reconvocado pelo colegiado. Os requerimentos foram aprovados em bloco. (Com Estadão Conteúdo)