O ex-governador de São Paulo João Doria anunciou a desistência da pré-candidatura a presidente da República. Ele havia vencido as prévias do PSDB para a disputar as urnas nas eleições de outubro deste ano. O anúncio foi feito no início da tarde desta segunda-feira (23).

"Hoje, neste 23 de maio, serenamente, entendo que não sou a escolha da cúpula do PSDB.  Aceito esta realidade com a cabeça erguida. Sou um homem que respeita o bom senso, o diálogo e o equilíbrio. Sempre busquei e seguirei buscando o consenso, mesmo que ele seja contrário à minha vontade pessoal. O PSDB saberá tomar a melhor decisão no seu posicionamento para as eleições deste ano", declarou Doria em pronunciamento.

"Me retiro da disputa com o coração ferido, mas com a alma leve", acrescentou Doria em discurso que lembrou sua trajetória política e a vitória nas prévias do PSDB para escolha do presidenciável do partido. Sem citar nomes, o paulista ainda disparou contra a polarização entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) indicada nas pesquisas de intenção de voto.

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"O Brasil precisa de uma alternativa para oferecer aos eleitores que não querem os extremos. Que não querem aquele que foi envolvido em escândalos de corrupção. E nem aquele que não deu conta de salvar vidas, não deu conta de salvar a economia e que envergonha nosso país em todo o mundo", destacou

O tucano fez o anúncio cercado por dirigentes do PSDB e ao lado da esposa, Bia Doria, em São Paulo. Estava presente também o presidente nacional do partido, Bruno Araújo, que trabalhava para convencer Doria a desistir do plano eleitoral. Veja o vídeo abaixo (e leia a íntegra do discurso ao final do texto):

O ex-governador de São Paulo João Doria (PSDB) afirmou, em coletiva concedida nesta segunda-feira (23), que está deixando a disputa para a presidência da República. Doria havia sido o nome que venceu a disputa das prévias do partido em dezembro. pic.twitter.com/V5xRI2fVkI

— O Tempo (@otempo) May 23, 2022

Doria passava por conflitos para tentar manter sua pré-candidatura que, mesmo com a vitória nas prévias, corria riscos pelas negociações da terceira via. O PSDB não abriu mão de conversar com o MDB e o Cidadania para firmar uma candidatura única do grupo para enfrentar Lula e Bolsonaro.

Doria não contava com o apoio nem de Araújo, que chegou a coordenar a equipe de pré-campanha do ex-governador paulista, mas foi destituído da função após atritos. Depois, Araújo foi escolhido para representar o PSDB nas conversas da chapa única com discurso pela inviabilidade eleitoral de Doria na disputa pela Presidência da República.

Nos últimos dias, o grupo anunciou a estratégia de fazer uma pesquisa prévia para identificar o nome com menor rejeição e oficializar o pré-candidato oficial. O resultado foi lançado internamente, mas a sinalização é de que a pré-candidata do MDB, Simone Tebet, foi a escolhida com base na alta rejeição de Doria. A expectativa é que anúncio oficial da decisão seja feito nesta terça-feira (24), depois de já sofrer adiamento.

Doria e Araújo tinham uma conversa marcada para o final da tarde desta segunda. No encontro, o presidente tucano pretendia consolidar a Doria o indicativo de que as três legendas que buscam uma candidatura única para a terceira via preferem Tebet na cabeça de chapa.

Doria chegou a considerar levar a questão para a Justiça para garantir o resultado das prévias. Na eleição interna em novembro de 2021, que custou R$ 12,2 milhões, ele recebeu 53,99% dos votos dos filiados tucanos. Os adversários eram o ex-governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Liete, que obteve 44,66% dos votos, e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio Neto, com 1,35%.

O ex-governador paulista dividiu apoio dentro do PSDB. Enquanto uma ala minoritária defende a pré-candidatura dele afirmando que Doria tem um legado a mostrar que inclui a vacina contra a Covid-19, outra parte tucana, majoritária, quer Tebet. Há ainda quem peça por uma candidatura própria do PSDB fora do grupo da terceira via e sem Doria.

Com a falta de apoio, o paulista ameaçou desistir da disputa presidencial. Em 31 de março, ele chegou a afirmar a aliados que não renunciaria ao governo de São Paulo, ação necessária para entrar nas urnas como candidato a presidente. No mesmo dia, porém, voltou atrás e formalizou a renúncia. Horas depois, ele admitiu que usou um “comportamento estratégico” para ter apoio.

Outro partido que negociava a candidatura única da terceira via era o União Brasil, mas a legenda se descolou e anunciou que terá “chapa pura” encabeçada pelo presidente, Luciano Bivar. Há, no entanto, pressão de grupos que defendem a substituição de Bivar pelo ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro, que se filiou ao União depois de deixar o Podemos, onde era pré-candidato a presidente.

Leia a íntegra do discurso feito por Doria ao desistir da disputa a presidente:

Boa tarde a todos.

Hoje é um dia de respostas, mas também um dia de perguntas.

As pessoas sempre me perguntam por que deixei uma vida de conforto à frente das minhas empresas bem sucedidas, para entrar na política? 

Sou filho de um político cassado pelo golpe militar de 64. Meu pai, tal como eu, começou a vida pobre, mas lutou, trabalhou e alcançou uma vida confortável, dono de uma das maiores agências de publicidade do Brasil. Até o dia que decidiu, inspirado por Franco Montoro, a lutar por um Brasil melhor. 

Nele, era premente e urgente a necessidade de servir ao povo brasileiro, de combater a desigualdade e a injustiça social.

João Doria foi eleito deputado federal e, em abril de 64, foi cassado pelo golpe militar. Perdeu seus direitos políticos, todos os seus bens e foi obrigado a viver no exílio.

Inspirado pelos ideais e pela coragem de meu pai, e coincidentemente também motivado por Franco Montoro, colaborei desde cedo com a vida pública. Com Mário Covas fui Presidente da Paulistur e Secretário de Turismo, em São Paulo. Por conta de uma gestão bem sucedida, fui convidado a presidir a Embratur, emblematicamente criada por um projeto de lei de autoria de meu pai.  Como militante e ativista, organizei, a pedido de Franco Montoro, o histórico comício das Diretas Já, na praça da Sé, em 25 janeiro de 1984, aqui em São Paulo.

Com perseverança, dedicação e trabalho, construí  uma carreira sólida na  iniciativa privada e coloquei de pé um grupo empresarial de sucesso. 

2015 marcava o auge de uma recessão brutal que dizimou milhões de empregos, guilhotinou a renda, levou a inflação às alturas e destruiu sonhos. Nada muito diferente do que enfrentamos hoje. Inconformado, acompanhava as medidas econômicas equivocadas de um governo incompetente e o desvio de dinheiro público.  

2016 seguindo os passos de meu pai, decidi disputar uma eleição.

Começa aí minha saga, no meu partido.

No PSDB disputei 3 prévias: para prefeito, para governador e para presidente.  As 3 únicas prévias na história do partido. Venci as prévias em 2016. E logo depois, venci as eleições para a prefeitura da maior cidade do país, no primeiro turno.  Fato inédito na história política de São Paulo.

Guardo as melhores lembranças da prefeitura. E do meu amigo Bruno Covas.

Tenho orgulho de ter zerado a fila de exames nos postos de saúde, com o inédito Corujão da Saúde. Atendemos a população em situação de rua com os Centros de Acolhimento, recuperamos praças, avenidas e ruas. Promovemos a maior inclusão de crianças desassistidas no redimensionamento das creches e escolas municipais. Lançamos os programas de concessão do Parque do Ibirapuera, do Pacaembu e do Anhembi, entre outras conquistas importantes para a cidade.

Em 2018, novamente disputei e fui vitorioso nas prévias do PSDB para a eleição a governador do Estado de São Paulo. Mais uma vez, venci as prévias e venci as eleições, sendo eleito governador de São Paulo.

Tenho orgulho de ter feito uma gestão transformadora no estado, reconhecida até mesmo por adversários.  Diante do desafio histórico da pandemia, me empenhei pessoalmente para trazer ao Brasil 124 milhões de doses da vacina contra a covid 19.  Procurei fazer o certo. Salvamos vidas e a economia. Na pandemia, São Paulo cresceu 5 vezes mais do que o Brasil, gerando um terço de todos os novos empregos do país.  Por todo o território nacional, a vacina foi sinal de esperança, salvando milhões de brasileiros. Vencemos com a ciência, os discursos do ódio, das fake news e o negacionismo. 

Assim como, na saída da prefeitura, quando deixei o comando da cidade nas mãos do saudoso Bruno Covas, desta vez também, deixei o governo de São Paulo em boas mãos.  Rodrigo Garcia está levando em frente um trabalho que começou com uma equipe de craques, e que certamente lhe renderá a vitória nas eleições deste ano. Rodrigo será, com muita justiça, reeleito governador de São Paulo.

Em dezembro do ano passado, mais uma vez disputei as prévias do partido para ser candidato a presidente da república. E mais uma vez, as venci.

Fica aqui minha gratidão aos brasileiros da cidade de São Paulo que me deram mais de 3 milhões de votos na prefeitura, aos quase 11 milhões de votos ao governo de São Paulo. E aos mais de 17 mil militantes do PSDB, que me escolheram como candidato a presidente do Brasil.

Agradeço também aos mais de seis milhões de brasileiros que, nas pesquisas de opinião pública, já manifestaram a intenção de votar no meu nome para presidente, antes mesmo do começo da campanha eleitoral.

O Brasil precisa de uma alternativa para oferecer aos eleitores que não querem os extremos.  Que não querem aquele que foi envolvido em escândalos de corrupção. E nem aquele que não deu conta de salvar vidas, não deu conta de salvar a economia e que envergonha nosso país em todo o mundo.

Para esta missão, coloquei meu nome à disposição do partido.

Hoje, neste 23 de maio, serenamente, entendo que não sou a escolha da cúpula do PSDB.  Aceito esta realidade com a cabeça erguida. Sou um homem que respeita o bom senso, o diálogo e o equilíbrio. Sempre busquei e seguirei buscando o consenso, mesmo que ele seja contrário à minha vontade pessoal. O PSDB saberá tomar a melhor decisão no seu posicionamento para as eleições deste ano. 

Me retiro da disputa com o coração ferido, mas com a alma leve. Com a sensação inequívoca do dever cumprido e missão bem realizada. Com boa gestão e sem corrupção.

Saio com o sentimento de gratidão e a certeza de que tudo o que fiz foi em benefício de um ideal coletivo, em favor dos paulistanos, dos paulistas e dos brasileiros. 

Saio como entrei na política: repleto de ideais, com a alma cheia de esperança e o coração pulsante, confiante na força do povo brasileiro que têm fé na vida e em Deus.

Peço desculpas pelos meus erros. Se me excedi, foi por vontade de acertar. Se exagerei, foi pela pressa em fazer com perfeição. Se acelerei foi pela urgência que as ações públicas exigem.   

Os acertos foram fruto do trabalho em equipe, da ousadia e da coragem, do propósito que sempre persegui. De sempre fazer bem feito o que tem que ser feito. 

Respeito e Trabalho. Fazer do possível o impossível. Esse é meu mantra. Levo por onde eu for.

Agradeço a minha equipe aguerrida, aos membros do partido que sempre me defenderam, aos que lutaram ao meu lado, aos que foram leais e que defenderam a democracia interna do partido. E defendem, como eu, a liberdade e a igualdade no Brasil.

Agradeço aos colaboradores, que estiveram comigo na prefeitura e no Governo do Estado, que se empenharam para os resultados históricos que alcançamos.

Agradeço aos militantes do PSDB, extraordinários guerreiros que nunca me abandonaram.

Agradeço a Deus pela disposição que sempre me deu, pela capacidade de trabalho, senso de justiça e paz no coração.

Agradeço igualmente à minha família, à Bia, aos meus queridos filhos, Johnny, Felipe e Carol, ao meu querido irmão Raul e sua linda família. Agradeço também a todos os verdadeiros amigos que sempre me apoiaram, em todas as minhas decisões. 

Por fim, relembro aqui o belo poema atribuído a Cora Coralina: “Tem mais chão nos meus olhos do que o cansaço das minhas pernas, mais esperança nos meus passos, do que tristeza nos meus ombros. Mais estrada no meu coração do que medo na minha cabeça".

Seguirei como observador sereno do meu País. Sempre à disposição de lutar a guerra para a qual eu for chamado. Na vida pública ou na vida privada.

Que Deus proteja o Brasil.

Muito obrigado e até breve.

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