O assassinato de quatro importantes chargistas do semanário Charlie Hebdo, em atentado terrorista em Paris, na França, traz temor a quem vive do traço e, principalmente, da sátira. Entre os mortos, há chargistas importantes como Stephane Charbonnier, o Charb, diretor da publicação, e Georgers Wolinski, experiente profissional e que influenciou grandes nomes no Brasil.

Eles, mais Jean Cabut e Bernard Verlhac, o Tignous, tiveram os nomes gritados pelos terroristas assim que invadiram a sede do semanário satírico. O Charlie Hebdo sempre manteve a sua vocação para o traço jocoso, não poupando Maomé, líderes islâmicos, Jesus Cristo, o presidente da França ou qualquer outra figura pública que confrontasse a sua visão esquerda do mundo.

Os terroristas, supostamente de origem argelina e muçulmana, traziam, além de fuzis e lança foguetes, a raiva contra a publicação. Tanto que, encapuzados, eles gritavam "vingamos o profeta" e "Alá é o maior". Era uma clara revanche às mentes pensantes de Charlie Hebdo. Tanto ódio faz com nomes importantes das charges e do quadrinho brasileira reflitam sobre com a sátira é recebida.

Desde que ficou sabendo do ocorrido, por exemplo, o criador da tirinha "Malvados", André Dahmer, tem se manifestado pelo twitter. À reportagem de O TEMPO, ele contou que o ataque parece mesmo ser uma prévia do fim dos tempos. "A gente ainda não sabe os culpados e também não vou apontar o dedo pra ninguém, mas me parece o final dos tempos. É um mundo inseguro para quem faz humor", destacou Dahmer.

Ele destacou, principalmente, a importância de Wolinski para os desenhistas brasileiros: "O Wolinski, por exemplo, influenciou três gerações de desenhistas, é o homem que inspirou Ziraldo, Jaguar, Angeli, Nani, Laerte. Um senhor de 80 anos morrer dessa forma violenta, um cara que disseminou alegria, que fez com que as pessoas pudessem rir e pensar ao mesmo, sem falar dos outros três proeminentes chargistas franceses que também foram mortos. É inacreditável".

O responsável pela Zarabatana, editora brasileira especializada em quadrinhos, Cláudio Martini, também se pronunciou sobre o atentado e se lembrou de quando conheceu Wolinski, durante uma exposição retrospectiva de seu trabalho no Festival International de la Bande Dessinée, em Angoulême, na França. "É difícil se deparar com uma situação dessas, acho que agora as pessoas vão pensar duas vezes antes de abordar um assunto, o que é muito prejudicial para o humor", disse.

O chargista Duke, de O TEMPO, também lamentou o ocorrido e se disse sem palavras para conseguir descrever o quanto a morte das vítimas o abalou. "Eu não sei nem o que dizer direito, eu realmente estou muito abalado, até mesmo pelo fato de haver essa empatia profissional que aumenta o nosso envolvimento. É uma coisa tão absurda esse grau de intolerância, eu não sei nem dizer se é a religião em si", destacou.

"Eu diria que são seres humanos muito ruins, pessoas más mesmo, que são capazes de tirar a vida de outras pessoas por diferenças de concepções e valores a respeito da existência. Ainda mais quando se leva em conta questões que procuram valorizar o humor, que é justamente o contrário disso tudo. O contrário da violência, do ódio, é o humor e o amor. O que aconteceu é algo que deixa a gente extremamente triste e preocupado", reforçou o chargista.

"Aí você pensa que esses caras, o Wolinski, por exemplo, que era um dos chargistas mais importantes do mundo, que influenciou uma geração de brasileiros, perderam a vida por causa das charges. Você desenhou, expressou o que acha de uma cultura diferente de você, e por isso, merece ser morto? Você não pertence a essa cultura e tem que viver sobre a ótica deles? É um negócio tão assustador. Eu, particularmente hoje, estou profundamente abalado", completou.

O maior ataque desde a 2º Grande Guerra

Este foi o ataque mais violento registrado na França nos últimos 40 anos, segundo o próprio presidente do país, mas não foi o único direcionado ao semanário. Em 2011, por exemplo, a sede da Charlie Hebdo foi destruída em um incêndio de origem criminosa depois da publicação de um número especial sobre a vitória do partido islâmico Ennahda na Tunísia, no qual o profeta Maomé era o "redator principal". Além disso, jornalistas, editores e chargistas eram vítimas constantes de ameaças.