Os Estados Unidos realizam nesta terça-feira (8) suas eleições de meio de mandato, as chamadas midterms, nas quais o povo renova toda Câmara dos Representantes e 35 dos 100 senadores. Se os resultados demoram dias para sair pela lentidão do processo eleitoral dos EUA, já há uma tendência de vitória republicana, o que comprometeria a governabilidade do presidente Joe Biden na segunda metade do seu mandato iniciado em 2021. Mas, diante de tanta incerteza, há algum impacto para a relação entre a potência norte-americana e o Brasil? De que maneira o pleito desta terça pode criar desafios para a política externa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que assume o Planalto em janeiro? 

Para responder a essas perguntas, a reportagem de O TEMPO conversou com o professor de economia internacional da Fundação Dom Cabral (FDC), Carlos Primo Braga. Para o especialista, uma eventual confirmação do favoritismo republicano no Congresso a partir desta terça pode ser o início da pavimentação para um retorno dos mais conservadores à Casa Branca em 2024. Neste cenário, uma figura pode voltar à tona: o extremista à direita Donald Trump, que governou os EUA entre 2017 e 2020.

“A eventual volta de Donald Trump em 2024 é uma questão em aberto. Ele vai encontrar resistência dentro do próprio partido republicano. Por exemplo, o governador da Flórida (Ron DeSantis) é um candidato potencial forte também. Mas certamente, se Donald Trump for eleito novamente em 2024, as relações com o Brasil, e particularmente com a administração Lula, vão exigir um grau de diplomacia muito grande. Como é sabido, o ex-presidente Trump apoiou de forma aberta a reeleição do presidente Bolsonaro (PL). Então, o potencial conflito existe certamente”, afirma Carlos Primo Braga.

Apesar disso, o docente da Fundação Dom Cabral lembra que ainda é difícil assegurar a vitória republicana nas eleições legislativas, quanto dirá confirmar qualquer panorama para 2024. “A realidade é a seguinte: tipicamente o presidente do partido que está no poder perde assentos tanto na Câmara de Deputados quanto no Senado. Agora, isso é a história, então há exceções. Por exemplo, em dois casos, o partido do presidente ganhou em ambas as casas. Isso (o resultado) tem muito a ver com a popularidade do presidente. Hoje, o presidente Biden está com a popularidade relativamente baixa, o nível de aprovação é da ordem de 44%. Isso sugere que realmente vamos observar os republicanos ganhando o controle do Congresso”, diz.

Após Lula vencer a eleição presidencial no último dia 30, a aproximação entre o petista e Joe Biden ficou clara. Os dois, inclusive, devem se encontrar na conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) em prol do desenvolvimento sustentável (COP27) no Egito ainda neste mês. Para Carlos Primo Braga, o democrata e o presidente do Brasil a partir de 2023 devem convergir, principalmente, no que diz respeito à gestão ambiental. 

“Isso (a aproximação entre Biden e Lula) realmente sugere que, particularmente, com relação à questão do meio ambiente, há novamente um espaço para cooperação entre o Brasil e o resto do mundo, em particular os Estados Unidos. Essa aproximação é boa para ambos os países. Particularmente, por causa da questão do meio ambiente, em que a administração do Bolsonaro (PL) colocou o Brasil numa situação muito isolada em relação ao resto do mundo”, afirma. Contudo, qualquer avanço nas tratativas seria colocado em xeque caso Trump ou outro republicano mais resistente às mudanças climáticas assuma em 2024.

Economia

Outro ponto fundamental da discussão acerca dos reflexos das eleições legislativas dos Estados Unidos no Brasil se dá na economia. Caso Biden perca a maioria no Congresso, a tendência é que o democrata tenha muita dificuldade para aprovar medidas defendidas pelo seu plano de governo. Vale lembrar que os EUA, assim como boa parte dos países, enfrenta uma grave crise financeira, com inflação recorde e consequentes aumentos na taxa de juros, o que interfere nas relações comerciais ao redor do mundo.

“A agenda política, particularmente na área fiscal do presidente Biden, coloca um perigo para o valor do dólar, o valor do ouro e, eventualmente, até mesmo uma queda no grau de confiança dos títulos do governo norte-americano. Isso seria muito ruim para a economia mundial”, afirma Carlos Primo Braga, professor de economia internacional da Fundação Dom Cabral.